Nos dois dias que se seguiram ao incidente do porão nada de muito estonteante aconteceu.
Para começar, logo no dia posterior, dei início a algumas aulas oferecidas por lady Aurélia. Ela foi muito amável comigo, apesar de tudo, e se dispôs a me ensinar as minúcias do cargo que ocuparei.
Receio ter esquecido todos os protocolos que me foram mencionados.
Mais tarde, naquele mesmo dia, Valliéry passou horas correndo atrás de mim com um pergaminho e uma pena, exigindo que redigisse meus votos de casamento.
Ainda não tenho cabeça para isso.
Só consegui despistá-la ao me esconder no sótão do palacete. Não que ela não tenha visto que adentrei tal lugar, porém, a poeira do recinto afugentou sua vontade de me seguir.
Senti-me incomodada por tanta insistência, mas ela sempre me lembrava de que uma das nossas missões ao vir para o Norte era justamente concluir preparativos do matrimônio.
Ainda que estejamos confinados, temos de dar prosseguimento às obrigações. Não posso voltar a Versalhes sem ter a posse de certas coisas.
Aliado a isso, ontem mesmo, Dulce me apresentou duas versões do vestido que encomendei. Foram desenhados com tanto esmero que fiquei bastante em dúvida sobre qual escolher.
Quando me decidi pelo modelo mais simples, logo fui com ela até a sala de costura e para seu horror, bem como para o horror de Valliéry, escolhi um tecido de cor branca.
— Não pode se casar de branco — repreendeu minha aia. — Rainhas se casam de vermelho, dourado ou azul. Cores reais. Branco está fora de cogitação.
— Vou me casar de branco — insisti irredutível. — Quero o tecido mais alvo que encontrar. Mais alvo do que a neve.
Não gastarei brilho algum com aquele príncipe de meia tigela. Nada de fru-frus.
Ainda nem sei se o cafajeste que me atacou é aquele com quem devo me casar, mas pelo sim e pelo não, prefiro não agradá-lo tanto.
Nossa discussão se prolongou por horas a fio, mas, no fim das contas, ambas as damas acataram meu desejo.
Meu vestido será elegante, ainda que simples, e belo, ainda que insosso. E isso é o máximo que poderei oferecer aquele homem.
Fiquei muito tempo chateada com Aramis, por ter dito o indizível ao lorde Ferdinando, e também porque deixou Leonor a ver navios, recusando-se a passear com ela.
Quando o confrontei sobre o último quesito, sentiu-se pressionado e confessou recear-se de que sua calvície causasse repulsa na jovem.
Ao saber disso, minha frustração foi tanta que o deixei falando sozinho.
Não duvido que haja ladys que se incomodem com a grandeza de sua testa, mas ele não pode tirar conclusões precipitadas. Tem de dar a Leonor a chance de demonstrar se compartilha desta opinião tão tola, ou não.
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À Espera da Coroa - LIVRO 4 - CIR.
Ficción históricaO casamento real se aproxima e a corte toda está em polvorosa! Exceto por uma pessoa... O que seria um fato isolado, e até irrelevante, se essa pessoa não fosse justamente a noiva. Panny Delyon recebeu a notícia que mais temia, ou que aprendera a te...