30. Lar doloroso lar

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Kyoto, Japão.

2 anos depois.

Assim que cheguei fui até minha casa. Mesmo depois daquela fatídica missão em Tokyo eu não ousei ir na minha casa nem uma vez sequer, principalmente depois daquele ocorrido. Assim que abri a porta engoli em seco, o cheiro de poeira e as memórias que fiz aqui estavam começando a surgir como uma tempestade em alto mar. Entrei com muito receio, deixei a mala no meio da sala e olhei tudo com certa aflição. Os móveis estavam cobertos de poeira, o chão ficava com pegadas de tão sujo que estava e o cheiro de mofo estava começando a me incomodar. Abri as janelas e deixei que entrasse um ar, preciso fazer uma faxina aqui urgente!

Com vassoura e pano em mãos, comecei limpando algumas coisas da sala, mas antes de dar continuidade fui até o meu quarto ver se tinha alguma roupa ainda ou se tinha deixado todas no quarto da escola. Havia algumas, mas por ficarem tanto tempo guardadas não estavam propícias para uso. Quando saí de lá, encarei aquela porta branca com um peso no coração. Me recusei entrar lá, mas quando dei por mim já estava com a mão no trinco rodando ele para abrir. O barulho das dobradiças velhas soou pesarosamente por meus tímpanos, acendi a luz do quarto e entrei em choque ao olhar cada canto daquele espaço. A cama permanecia arrumada do mesmo jeito de quando saí daqui para Tokyo, a escrivania possuía alguns papéis espalhados e outros grudados com fita no espelho, certamente anotações sobre maldições e livros. Por falar em livros, olhei para a pequena estante e lá estavam todos os seus livros e gibis enfileirados seguindo uma ordem estranha na qual eu não saberia decifrar no momento. Abri seu guarda-roupa e cada peça estava bem guardada do jeitinho que ela deixou. Então, me sentei na cama e peguei o retrato que havia em sua cabeceira. Killa sorria com muita alegria na foto de anos atrás, quando fui com ela à praia pela primeira vez.

Senti meu coração pesar, as lágrimas vieram à medida que a saudade dela aumentava e não demorou para que tudo o que tentei esquecer nesses dois anos viessem à tona com ainda mais força do que antes. Chorei abraçando aquela foto, agora sei o porquê nunca quis retornar a essa casa. Tudo aqui era muito familiar e me lembrava dela em todos os sentidos, cada canto da casa, cada anotação dela espalhada pelas paredes, cada foto, tudo e qualquer coisa ali me fazia sentir sua presença como se nunca tivesse partido, como se eu nunca tivesse feito a estupidez que fiz. Com as mãos tremendo da mesma forma do dia em que a segurei pela última vez em meus braços, saí com pressa daquele local, arrastando a mala e deixando a porta fechada sem trancar. Não passaria nenhum minuto a mais ali, era mais forte que eu. Aquelas memórias, apesar de boas, não me deixavam calma.

Chamei um táxi e enquanto não vinha tentei me acalmar, enxuguei as lágrimas na manga da camisa e respirei fundo diversas vezes. Infelizmente não pude fazer nada com as minhas mãos, as mesmas que derramaram o sangue da pessoa que mais amei em toda a minha vida. Quanto a faxina, depois contrataria alguém para limpar, eu não iria conseguir com tanta coisa indo e vindo pela minha mente, dos momentos que vivi aqui com ela.

[...]

De frente a escola, olhei aquele lugar com nostalgia no peito. Retornar aqui depois de dois anos é uma sensação inexplicável. Passei pelo xamã que guardava a entrada sem nem lhe dar explicações, provavelmente não me reconheceu e eu nem sequer fiz questão de responder suas perguntas, apenas segui subindo as escadas até entrar na escola.

Passar por aqueles corredores me faz lembrar dos tempos em que estudei aqui, balancei a cabeça para afastar esses pensamentos pois sei aonde isso me levaria a pensar. Assim que passei por um xamã conhecido, o parei e perguntei por Noeri.

— Senhorita, no momento ele se encontra em reunião com a senhora Watanabe e os chefes dos três clãs.

— Sabe o motivo da reunião?

Um amor (im)possível (Satoru Gojou)Onde histórias criam vida. Descubra agora