Capítulo 3

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No dia seguinte o doutor Rodolffo chegou à clínica e quis logo saber como se tinha portado Juliette sem a medicação anterior.

- Dormiu toda a noite.  Acordou um pouco confusa, sem saber onde estava e depois do café ficou admirando o jardim através da janela.

- Não saiu do quarto?

- Não quis.  Fazia uns gestos com as mãos que não entendemos.

- Vieram alguns documentos da casa de repouso onde ela estava?

- Sim chegou uma pasta com alguns documentos e o consentimento da transferência dela para cá.

- Depois quero ver essa pasta.  Agora vamos ver os doentes internados e depois começamos as consultas.

No quarto de Juliette.

Rodolffo entrou com a assistente.  Juliette estava sentada junto à janela  com o olhar perdido no jardim.

- Bom dia, Juliette.   Dormiste bem?

- Ela não respondeu.  Apenas sorriu.

Rodolffo sentou-se perto dela e fazia anotações.

- Porque não quiseste ir ao jardim?  Não precisas de estar sempre no quarto.

- Não pode sair. - Juliette cruzava os braços fazendo um X.

- O que significa isso?

- Juliette presa na cama.  Não pode sair.  Apanhar muito.

- Batiam-te e prendiam-te?

Juliette assentiu com a cabeça e baixou o olhar.

- Aqui ninguém te vai prender e bater.  Podes ir ao jardim com a enfermeira um pouco de manhã.

Ela sorria.  Não sabíamos se ela entendia o que lhe dizíamos.  Por vezes parecia flutuar.

- Vamos continuar apenas com o sonifero à noite e um antidepressivo de manhã.   Só para a acalmar.  Ela alimenta-se bem?

- Come muito pouco, mas não rejeita nada.
Junto com a pasta, veio uma mala com alguns pertences dela.
Um dos pertences é um urso de pelúcia.  Assim que o viu, começou a chorar e escondeu-o no fundo da gaveta.

- Traga-o.

A enfermeira trouxe o urso e entregou-o  Rodolffo.
Juliette estendeu os braços para ele e os olhos encheram-se de lágrimas.
Rodolffo entregou-lho e ficou a ver ela abraçá-lo e niná-lo.

- Simboliza o filho.  Há uma ligação entre ela, o urso e o bébé.  Só não entendi porque o esconde.  Apesar das lágrimas ela está feliz com o urso nas mãos.

Rodolffo tentou retirá-lo.  Juliette apertou-o mais e olhou para ele em tom de súplica abanando a cabeça.

- Queres ficar com ele?

- Sim. - disse mostrando um sorriso.

- Podes ficar.  Não precisas de o esconder, entendes?

Ela apenas acenou com a cabeça e deu um beijo no urso.

Rodolffo deixou o quarto e regressou ao seu gabinete com a enfermeira.
Pegou na pasta de Juliette e começou a ler alguns apontamentos.

" escondemos o urso quando ela não colabora. Para evitar que se magoe temos que a imobilizar frequentemente.  A primeira vez que a deixámos sair para o jardim, subiu a uma àrvore e saltou.  Por sorte não partiu nada."

Havia estes e outros registos nada favoráveis à recuperação de Juliette.

Rodolffo guardou a pasta e mandou entrar o primeiro paciente.

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