Capítulo 21

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Montenvers-Mer de Glace. Chamonix, França. Dezembro de 2007.

Stella enfiou as mãos no bolso de seu casaco térmico enquanto acompanhava um nobre serelepe sem qualquer apreço pela própria segurança pela estação central de trem. O frio era um parceiro constante, um perseguidor que lhe fazia se arrepiar toda vez que a bota militar tocava o chão. Ao menos as leggings, feitas especialmente para frio, não deixavam suas pernas congelarem

Convenceu Adrian e Yuri, o chefe de Lior, a disponibilizarem três guardas para aquela pequena viagem. O trio, membros de vários serviços secretos, eram seus novos mestres e amigos.

Uma das coisas que aprendeu desde o início de sua jornada era a incapacidade de desligar o cérebro e curtir um encontro sem avaliar os riscos, sem perscrutar todo o ambiente atrás possíveis ameaças que poderiam definir a vida e a morte de alguém. Mesmo sentada à espera do trem partir, ela não conseguia evitar.

Viu os três agentes à paisana em pontos estratégicos, também observou os pontos eletrônicos. Tocou algumas vezes no seu próprio ponto na orelha, enviando um código Morse que foi recebido com um meneio de cabeça dos dois, confirmando que ouviram.

Lior, absorto, agitou os tíquetes em sua direção.

— Terra para Stella! — Ele voltou a anuir em seu enorme casaco felpudo. — Não fique tão séria.

— Caso você tenha esquecido, eu vou lhe lembrar. — Tentou ser comedida e evitar o sarcasmo, mas não conseguiu. Ainda não tinha falado com Adrian sobre Protagonista. — Quem quis vir pegar um trem para evitar um familiar estranho e obrigou quatro pessoas a fazem um passeio que não queriam?

Lior levou a mão ao coração, como se tivesse recebido um tiro. O cinismo era aberrante.

— Você vai gostar do passeio, vai ver.

— Claro que irei gostar. — Ela sorriu falsamente. — Se eu viesse amanhã e não tivesse meio morta. Só quero uma cama, Li.

— Quer cama melhor que a natureza gelada dos Alpes?

— É sério que está me perguntando uma coisa dessas? — Stella revirou os olhos.

— Ok, ok. — Ele relaxou suas feições. — Também quero lhe pedir uma coisa.

— O quê?

— Quando a gente se formar, no colégio, vou assinar uma carta de recomendação para você. — Ele a fitou com aqueles olhos azuis-turquesas enfeitiçadores. — Não sei o que quer ser, mas não quero que fique presa a sua cultura para sempre. Quero que viva a sua vida como você sonha.

— Quer se livrar de mim, é?

— Claro que não! — Lior retesou, chocado pela sua resposta. — Quero fazer algo legal aqui. Por você.

— Primeiro, estou fazendo o que faço porque eu quero, já disse isso quando nos encontramos. — Ela abriu um sorriso debochado. — Sabe que eu tive a opção de voltar para a Índia após o semestre, né?

— Não.

— Agora já sabe por que não fui...

— Stella...

— Se alguém acha que vai tirar você de mim, essa pessoa tá muito enganada. — Ela fechou a cara. — Eu ficaria preocupada demais pensando que se acontecesse algo, eu não estaria ao seu lado para ajudar. Ainda mais depois do que me contou sobre o seu passado.

Ele ficou em um silêncio sem conseguir imaginar que Stella mentia. Por trás das palavras de lealdade, do confronto à família e das amarras de um país socialmente estratificado, havia uma assassina que faria de tudo para se manter ao lado dele.

O ChacalOnde histórias criam vida. Descubra agora