Capítulo 24

12 3 34
                                    

Montenvers-Mer de Glace. Chamonix, França. Dezembro de 2007

Ser arremessada para uma porta não era o que Stella queria. Muito menos sentir o sangue de sua têmpora contornar os olhos delineados e cair de seu queixo em direção ao chão. A visão ameaçou ficar turva, mas nada que chacoalhar a cabeça não resolvesse.

Aos poucos os sentidos foram recobrados. Viu as inúteis cotoveladas de Lior no torso musculoso do homem enquanto era arrastado pelo assassino até um teleférico em meio ao desespero dos turistas, dos trabalhadores e dos policiais.

Não tardou para sumirem no imenso horizonte gelado.

Grunhiu enquanto estraçalhou o restante da madeira com as botas. Suas obsidianas furiosas perscrutaram rapidamente o ambiente, tomando nota de tudo. Respirando fundo e deixando a adrenalina tomar conta do corpo, Stella ergueu-se do chão, limpou os lábios carnudos com a manga longa do casaco, retirou o celular do bolso e correu para onde o maldito assassino levou seu namorado.

Sem parar de correr, ela ligou para o primeiro contato da lista de discagem rápida. O celular tocou uma única vez.

— Wright. — Seu professor, mentor e parceiro atendeu profissionalmente.

— Lior... — Engoliu em seco, dando os primeiros passos à escada. — Lior foi sequestrado.

— Características. — A voz de Pardal ficou mais sombria e pesada.

— Um metro e noventa, musculoso, com uma barba rala, olhos azuis e pele clara. Está vestindo um casaco parka branco e grossas calças negras. — Devido à pressa ao subir as escadas, quase tropeçou e deu de cara no chão. Precisou se segurar no corrimão. — Mande tudo o que puder, ele me arremessou para uma porta sem que eu pesasse nada.

— Alguém do mundo além do véu? — Escutou os passos de Wright pela casa e o estalo de alguns dedos.

— Não tenho informações suficientes para isso. — Stella se orgulhou do controle emocional e da voz firme, apesar das dores que irradiavam por todo o corpo. — Mas é possível.

— Eu e o Yuri estamos indo até aí. Faça de tudo para segurá-lo. — O vento frio irrompeu pela linha telefônica. — Se não puder, fuja até as primeiras bases do Monte Branco.

— Qual seu tempo de chegada?

— Vinte a trinta minutos. Alguns irão pegar o helicóptero, o resto irá no comboio. Boa sorte, Kapoor.

Arfou ao encerrar a ligação. Uma dor aguda irradiava por todas as costas, o abdômen e até um lado dos seios. Não obstante, havia o corte no supercílio e a tentativa malsucedida de limpar o ferimento com a manga do casaco lhe deixou sem paciência. Sem contar os fios de cabelos molhados grudando no corte e causando ainda mais desconforto.

Nada a pararia, porém, ainda mais com Lior precisando mais do que nunca dela.

Correu em direção ao teleférico e quase morreu ao ter que esperar mais de trinta minutos. Andando de um lado para o outro, esfregando as mãos e ignorando as dores cada vez maiores. O estômago apertou e não adiantava olhar para o horizonte a cada segundo, esperando a volta do bondinho para levá-la ao outro lado do Mer de Glace.

Não pôde apreciar a paisagem, como a neve e as montanhas transmitiam uma sensação mágica, de estar em mundo fantástico. Não com a sensação de impotência, de que, com todos os treinos da Ordem, não conseguiu prever a aproximação de um assassino.

Quase ajoelhou em agradecimento ao ver o teleférico se aproximar no horizonte. Foi a primeira a entrar e a se posicionar próxima a saída. Sabia que descumpria inúmeros protocolos de segurança ao não prestar atenção nos arredores, verificar ameaças, pontos fracos e opções de saída.

O ChacalOnde histórias criam vida. Descubra agora