Capítulo 1

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Dragon's Breath Pub. Cidade de Londres, Inglaterra. Outubro de 2018.

Lestrade não queria estar nos fundos de um pub mequetrefe, encolhendo-se atrás de uma porta lacrada a sete chaves. Muito menos tremer de medo por cada barulho ou conversa elevada dos andares inferiores. Não custava nada ficar em uma suíte adorável, com cobertores de seda e travesseiros de algodão.

Se não tivesse sido marcado para morrer.

Maldito dia em que foi buscar uma maquiagem em um estacionamento em Milão. Ao agradar sua ex-noiva, uma modelo e cantora, viu algo além de sua compreensão.

Tivera pesadelos desde então. Boa parte deles bem reais.

Correu que nem um condenado e imergiu no submundo para se proteger. Por isso estava no pub mais nefasto da capital inglesa, onde os bandidos se reuniam para planejar atos cruéis. Bastou uma transação por meio das criptomoedas e ele se cercou de homens e mulheres capazes de degolar qualquer um que viesse em sua direção.

Não confiava na polícia por diversos motivos, mas o principal era a corrupção. Não esquecera da cicatriz em um canto do pescoço para enaltecer as causas para a fuga, muito menos dos lençóis de seda, outrora imaculados, sujos com o sangue da última pessoa que o ajudou.

A Londres Abaixo, por mais criminosa que fosse, tinha um senso de lealdade maior que a civilização acima.

Contudo, a consequência de sua escolha reverberava dentro dele. Os remédios estavam espalhados pelo quarto, precisava deles para conter a ansiedade e o pânico. Sem contar os laços rompidos com os amigos de internato. O que Lior, Ignácio e Stella falariam sobre seu sumiço repentino?

O que Angie diria?

Ao lembrar do sorriso de covinhas e do que nunca mais teria, o coração apertou. Ele o tirou tudo, inclusive uma chance ao amor.

Mexeu nas persianas, abrindo-as um pouco e fazendo o vento gostoso e frio da noite londrina acalmar a mente sempre em polvorosa. Os olhos cerrados esconderam as lágrimas de quase seis anos vivendo entre a escória da humanidade e o quanto isso afetava a mente frágil.

Batidas à porta lhe tiraram de seu devaneio. Duas fracas e uma forte. Era o sinal do dono daquela espelunca.

— Les! — A voz era rouca e um pouco grave, típica de fumantes. — Venha nos ajudar aqui, por favor.

— Não é para isso que pago vocês, Rudolf. — Lestrade passou a mão em seus cabelos curtos, tingidos de loiro platinado. — Eu pago para ficar quieto em meu canto.

— Se você quiser uma segurança top de linha, você vai tirar o rabo desse quarto e descer até nossa central de segurança.

O tom de Rudolf dizia que ele não tinha escolhas. Malditos bandidos.

— Espere um momento.

Pegou o casaco felpudo e se aconchegou dentro dele. Ameaçou colocar a lente, usada para esconder seus olhos heterocromáticos, mas desistiu. Se demorasse muito, talvez Rudolf mandasse seus brutamontes arrebentarem a porta. Caçou sua pasta, colocou-a debaixo do braço e saiu sem muitas cerimônias.

— Quem morreu?

— Nosso especialista em computação. — Rudolf envolveu os dedos grossos e calejados no braço magro de Lestrade. Se não tivesse com casaco...

Sua pele teria marcas rosadas.

— Você sabe que fiz uma piada, não é mesmo?

— Sim, mas o nosso especialista realmente morreu. — O dono do pub grunhiu ao guiá-lo de forma ríspida ao elevador de serviço. — E precisamos de você para a transação.

O ChacalOnde histórias criam vida. Descubra agora