Capítulo 31

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Hotel Serrafiore, Monte Carlo, Principado de Mônaco. Dias atuais

Para muitos homens, ver duas mulheres se engalfinhando em um combate visceral era o suprassumo do prazer. Lestrade discordava veementemente disso, afinal quando duas especialistas em várias artes marciais conhecidas pela humanidade se enfrentavam, a morte era o único resultado possível.

O olhar do hacker na penumbra foi para as pistolas deslizando pelo chão de linóleo, em um processo praticamente incompreensível aos olhos de meros mortais como ele. Elas brincaram de desarmar uma à outra ao melhor estilo John Wick e só depois disso, elas partiram para a luta mano-a-mano.

Tendo um pouco mais de força e músculo, Juneau lançou um soco poderoso bem de encontro ao rosto de Noor. Ela a bloqueou com ambos os braços, mas a força da ação fez com que a assassina tropeçasse para trás antes de recuperar o equilíbrio. A agente da Interpol tentou pressionar o ataque antes que ela pudesse se recuperar, chutando sua barriga.

No entanto, a indiana lhe surpreendeu. Noor abaixou e girou, dando uma belíssima e precisa rasteira. Lestrade arqueou as costas, sentindo a dor do impacto delas ao invés de Juneau. A agente, que havia se desfeito dos saltos, se levantou rapidamente sem grandes esforços.

Mais alta, Noor passou a usar e esbanjar das pernas. As sombras dos movimentos, dançantes e incríveis, marcavam o caos frenético da intensa troca de golpes. Juneau acertava mais, porém os chutes de Noor eram devastadores. A ponta dos saltos, perversas, criavam hematomas e lançavam filetes do sangue da policial para o chão frio.

Para quem Lestrade deveria torcer? Sua primeira salvadora, a mulher que o ajudou a escapar das amarras da escuridão em Londres após um vil atentado? Ou a agente pela qual ele tomou um tiro? A mão direita, já que a esquerda envolveu uma das pistolas, foi em direção ao ombro, a pequeníssima cicatriz causada pelo disparo de um rifle.

Segundo Helena, seu ombro deveria estar inutilizado, destruído, acabado. Juneau usara algo capaz de mudar para sempre as regras do jogo, decerto tal sacrifício único exigia uma retribuição.

Juneau usou magia, não tenho dúvidas disso.

Mas Lestrade reparou nos sutis movimentos de Noor, o deslizar em cima dos saltos, naquela elasticidade digna das melhores bailarinas do Bolshoi. Os poucos feixes de luz, brilhantes e intensos, recordavam-no de tempos bons, de histórias da St. Trevelyan e do gosto de Stella Kapoor pelo teatro, dança e música.

Ela havia até tentado ensinar a Lior algumas músicas indianas. Não tinha como Noor não ser Stella. O nariz era um pouco diferente, os olhos repletos de maquiagem, alongados e sedutores, de sereia. A boca mais fina, mas os movimentos e vitalidade por trás do castanho aquele olhar eram únicos.

Lestrade engoliu em seco, apertou ainda mais o cabo da arma, e tomou sua decisão.

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Davina havia tensionado todos seus músculos no momento em que as luzes do Serrafiore caíram. A respiração estava cada vez mais complicada, o vestido molhado grudava na pele causando mais peso aos movimentos e as finas camadas do tecido nada impediam o sangue de escorrer por suas arestas.

O tempo estava contra ela.

Ao menos tivera a sorte de estar do lado de fora do elevador. Demétrius, à frente, já havia portado sua arma e a empunhado de forma precisa, treinada. Seguindo-o, ela limpou os pensamentos nefastos da mente, focada única e exclusivamente em Lestrade.

Não precisou de muito para ouvir as primeiras cacofonias de tiros. Os dedos nervosos dos guardas decoraram os vidros, candelabros, quadros e portas do penúltimo andar. Davina, para evitar virar paçoca nas mãos das sentinelas, girou contra a parede, puxando e jogando Demétrius com ela para o nicho raso de uma coluna. Bem a tempo, afinal uma bala atingiu a parede e outra passou zunindo, atingindo a porta do elevador.

O ChacalOnde histórias criam vida. Descubra agora