''Você ainda escorre dos meus olhos'' - Perina
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De todas as sensações que alguém pode vivenciar, perder alguém é uma das piores. Mas o que causa um corte ainda mais profundo na alma é perder alguém, mesmo ainda podendo vê-lo, mas ser incapaz de tocar, conversar, de segurar a mão, de sentir o perfume, de manter por perto.
Eu me sinto tão perdido de mim mesmo. É como se tudo o que minha mente dissesse fosse mentira e dessa forma não consigo acreditar em mim mesmo, porque sou um mentiroso. Eu digo que estou bem quando não estou, tento me convencer de que tudo bem estar sozinho, quando na verdade tudo o que preciso é sentir o calor humano para me manter vivo.
Eu me odeio por ter dito aquelas coisas para o Yeonjun, mas odeio mais ainda o homem que me obriga todos os dias a me tornar um espelho do monstro repugnante que ele é.
Eu sinto muito que as coisas tenham que ser assim.
Há duas semanas passei a ir para a escola com um motorista, mas é ridículo que ele tenha que se certificar de que eu estou realmente entrando na escola e saindo sozinho, como se eu fosse um criminoso que precisa ser vigiado. Eu não fiz nada de errado, então por que as coisas precisam ser assim?
As horas se arrastam, transformando até mesmo as aulas mais interessantes em pesos insuportáveis de se aguentar. É horrível me sentir tão sozinho durante o tempo todo depois de me acostumar com a agitação que yeonjun trazia aos meus dias. Aproveitei a aula de música para fazer algo que não faço há muito tempo: tocar violão. Eu sempre gostei da sensação que a música desperta em mim, mas depois da morte de Soojin isso se tornou raro, me traz muitas memórias boas, mas que ainda doem.
O professor nos liberou para treinarmos qualquer instrumento, então torci para que uma das salas de músicas estivesse vazia para tocar sem ninguém por perto e por sorte encontrei. Quero me sentir em paz por pelo menos alguns minutos no dia.
Sentei-me em uma cadeira e com o violão em mãos toco corda por corda, afinando o instrumento antes de tentar uma melodia. Pensei em ''it's U'', a nossa música, mas meu peito aperta apenas por lembrar da melodia, sinto como se soojin estivesse ao meu lado e apesar de querer senti-la por perto, a única imagem que me vem à cabeça é de seu corpo em meus braços e isso me põe em grande agonia.
''You don't realize how much i need you
love you all the time and don't leave you
Please come on back to me''
Cantei, no ritmo animado demais para as palavras que carregam tanta tristeza. ''I need you'' é uma das minhas músicas preferidas dos Beatles e nunca pareceu se encaixar tanto a um momento quanto agora. Eu queria ser mais forte, queria ser mais corajoso. Sinto meu rosto molhado ao passo que o peito aperta a cada frase cantada. Eu não passo de uma bagunça de sentimentos, deixando a alma definhar aos poucos, voltando a ser aquilo que era originalmente: apenas pó.
''Please remember how I feel about you
I could never really live without you
So come on back and see
Just what you mean to me
I need you''
Precisei de alguns minutos para respirar fundo e cessar o choro depois do final da música. Sinto uma tristeza tão vazia, tão cheia de nadas. Me sinto repleto de incertezas e desejos que talvez nunca se realizem. Eu me pergunto porque a maldita esperança preenche meu peito todas as vezes que via Soojin e porque acontece o mesmo quando vejo Yeonjun. Por que seus olhares parecem doces o suficiente para me fazer querer tentar mais um pouco?
Ponho o violão apoiado na cadeira ao meu lado, passando a mão pelo rosto. Me assusto quando, ao olhar para frente, encontro Yeonjun parado na porta, me encarando com olhos brilhantes em silêncio.
—Só vim pegar isso — sinalizou para uma estante de partitura no canto da sala. Me mantive em silêncio, raciocinando lento. Faz duas semanas desde a última vez que ouvi ele dizer algo para mim, não conversamos desde aquele dia no parquinho e é estranho pensar que realmente acabou. Ele não demorou muito, pegou o que precisava e se dirigiu a porta sem dizer mais nada, evitando me olhar a qualquer custo.
—Yeonjun — parou quando ouviu seu nome. Queria poder dizer mais, mas as palavras não saíram de minha boca de modo algum. Ficaram todas presas, me sufocando mais um pouco. Ele se manteve de costas para mim, esperando ouvir algo mais, mas não obteve.
—Tô atrasado, preciso ir — abriu a porta — Aquela música... — me olhou — Ela é bonita — fechou a porta no mesmo instante, sumindo de minha vista em um milésimo.
Ela é pra você Yeonjun. Ela é para nós.
Eu só quero ter você de volta.
[...]
''Eu faço, mas minhas mãos continuam limpas''
O sorriso em seu rosto ficou cada vez maior antes de sumir por completo, me deixando sozinho. Encontro minhas mãos cobertas por algo lilás, enjoando-me pelo cheiro de ferro, assemelhando-se a sangue fresco. Meu corpo fica cada vez mais gelado pela temperatura amena do local, tremendo por completo. Ao olhar para frente vejo muitas flores, mas ao passo que me aproximo percebo que estão todas mortas e não muito longe avisto alguém sentado em uma cadeira, coberto por mais flores roxas e brancas.
O ar para de entrar em meus pulmões no mesmo instante que percebo que é Yeonjun quem está lá. Atravesso poças de um líquido colorido, correndo o mais rápido que posso para alcançá-lo, mas quanto mais corro, mais longe ele fica e apesar de gritar seu nome o mais alto que posso, não consigo uma resposta. Sacudo seus ombros com toda minha força assim que o alcanço, enchendo o pulmão com o ar escasso para chamá-lo, mas ele não acorda de forma alguma.
—Não! não, não, não — Segurei seu rosto, notando um corte em seu pescoço — Yeon, por favor! — o chamei inúmeras vezes, em uma tentativa falha de negar o que está diante de meus olhos — Yeonjun...— sinto as pernas bambas, prontas para ir de encontro ao chão — Yeonjun por favor —o puxei para perto, segurando-o em meus braços com toda força — De novo não, isso de novo não, por favor — a voz embarga em minha garganta pelo choro desesperado. No chão, encolho-me colando-o em meu peito, segurando-o pelos braços, tentando conter meus próprios espasmos enquanto o aqueço. Seu corpo fica cada vez mais frio, ao passo que sinto o meu calor se esvair — Por favor, Yeonjun...eu não posso perder você assim — supliquei uma última vez antes de começar a sentir-me sufocando. Minha garganta aperta, como se houvesse uma corda em meu pescoço. Aos poucos minha visão embaça e antes que me desse conta, tudo desaparece.
Acordo com a vista embaçada, incapaz de enxergar corretamente. Meu coração palpita tão forte que pode rasgar o peito a qualquer momento, da mesma forma, sinto minha garganta rasgar ao passo que algo sobe queimando a faringe antes de sair pela boca. Não tive tempo de correr ao banheiro, vomitando tudo no chão do quarto. Lágrimas tomam conta de mim, seguido de soluços altos, mal conseguindo respirar. Estou assustado demais para pensar, não faço ideia do que está acontecendo e sinceramente não sei se posso diferir a realidade do sonho. Tudo pareceu tão real. Não consigo evitar o choro barulhento, negando o que acabei de ver em pânico, quase gritando, apesar de sentir não ter ar nem para isso.
A mesma cena se repetiu.
—Foi um sonho — digo a mim mesmo, tentando me recompor — Foi só um sonho — seco as lágrima do queixo — Tá tudo bem — aperto os dedos no travesseiro, tentando conter o tremor das mãos —Não é real...— tento me convencer, temendo que se torne realidade.
Isso não vai acontecer de verdade.
Yeonjun está seguro, eu fiz o que deveria fazer pra isso.
Vai ficar tudo bem..
Eu espero muito que fique.
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Não ia postar nada hj, mas a pedido de uma leitora muito querida eu trouxe esse! Espero que gostem <3
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Ghost (Yeongyu)
FanfictionBeomgyu perdeu a pessoa mais importante para si de uma forma muito repentina. Uma promessa foi quebrada, Sojin não estaria mais lá como disse que estaria. Sua vida parecia estar acabada, os problemas com seu pai ficavam cada dia piores. Não parecia...