8-2. Lily

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Assim fica bem mais fácil. Pego o primeiro diário e o folheio até encontrar algo que me parece curto e não tão humilhante.

-Lembra da noite em que te procurei chorando porque meus pais estavam brigando?

-Lembro-confirma. Ele se acomoda no travesseiro e coloca um braço atrás da cabeça.

Reviro os olhos.

-Isso, pode ficar mais confortável aí enquanto eu fico me constrangendo - resmungo.

-Sou eu, Lily. Somos nós dois. Não precisa ter vergonha de nada.

A voz dele ainda tem o mesmo efeito calmante de sempre. Sento-me de pernas cruzadas e seguro o celular com uma das mãos e o diário com a outra, e começo a ler.

Alguns segundos depois, a porta dos fundos se abriu e ele olhou para além de mim, depois para minha esquerda e para minha direita. Só quando ele me olhou no rosto percebeu que eu estava chorando.

-Você está bem? Perguntou, saindo para a varanda.

Usei minha blusa para enxugar as lágrimas, e percebi que ele tinha saído da casa em vez de me convidar para entrar. Eu me sentei no degrau da varanda, e ele se acomodou a meu lado.

-Estou bem - respondi. - Só estou zangada. As vezes choro quando fico zangada.

Ele estendeu o braço e colocou meu cabelo atrás da orelha. Gostei disso, e de repente minha raiva diminuiu. Então, ele pôs o braço ao meu redor e me puxou para perto, deixando minha cabeça apoiada em seu ombro. Não sei como ele me acalmou sem dizer nada, mas foi o que aconteceu. A simples presença de algumas pessoas acalma, e com ele é assim. É o completo oposto de meu pai.

Ficamos sentados assim por um tempo, até que vi a luz de meu quarto se acender.

-É melhor você ir - sussurrou ele.

Nós dois vimos minha mãe parada no quarto, me procurando. Só naquele instante percebi a vista perfeita que ele tinha do quarto.

Enquanto voltava para casa, tentei pensar em todo o tempo que Atlas passara naquela casa. Tentei lembrar se eu tinha andado alguma vez com a luz acesa durante a noite, porque normalmente, quando estou no quarto à noite, fico só de camiseta.

E, olha só a maluquice, Ellen: eu torcia para ter feito isso, sim.

Lily

Atlas não está sorrindo quando termino de ler. Está me encarando com muita intensidade, e o peso em seu olhar me faz sentir um aperto no peito.

-A gente era tão jovem. comenta. Há um pouco de sofrimento em sua voz.

-Pois é. Jovens demais para lidar com aquelas coisas. Especialmente você.

Atlas não está mais olhando para o celular, mas assente. O clima mudou, e percebo que ele está pensando em algo completamente diferente. Lembro que ele tentou fazer pouco-caso de alguma coisa ao dizer que era apenas uma semana daquelas.

-O que está te incomodando?

Ele volta a olhar para o celular. Parece que vai mudar de assunto novamente, mas depois apenas suspira e sobe um pouco para se recostar na cabeceira.

-Alguém vandalizou os restaurantes.
-Os dois?
-Ele assente.
-Sim. Começou uns dias atrás.
-Acha que é algum conhecido seu?

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