Viginti Quinque

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PETRUS

Sentei-me na escuridão do meu quarto, com a luz fraca da lua a penetrar pelas frestas da janela. As memórias do dia da audiência de Cate continuavam a assombrar-me, intensas e vívidas, como se o calor dos lábios dela ainda estivesse presente nos meus.

Eu tinha-a beijado... O que é que me deu para fazer aquilo? A Cate não era apenas alguém. Ela era... tudo o que prometi a mim mesmo que protegeria e, simultaneamente, a pessoa que me foi designada para odiar e combater.

O beijo não fora planeado, não era uma estratégia, nem um gesto calculado para manter as aparências. Foi algo impulsivo, uma necessidade instintiva de lhe mostrar que, apesar de todas as mentiras que nos rodeavam, havia algo verdadeiro entre nós. Mas porquê? Porque é que o impulso de a proteger, de a fazer entender que ela não estava sozinha, era tão forte?

Suspirei, com a mão a passar pelos cabelos numa tentativa de dissipar a confusão que me atormentava. A minha lealdade aos dissidentes, o compromisso que assumira de lutar contra os Magni Stellaris... tudo isso estava em jogo. Mas o que estou a sentir por Cate vai muito além de uma simples missão ou aliança. Havia algo mais profundo, algo que eu não conseguia controlar.

Lembrei-me do amuleto que ela usava. Aquele amuleto... Desde o momento em que o vi, algo me pareceu estranho. E agora, depois de todos estes momentos com Cate, comecei a suspeitar de que o amuleto não era apenas um objeto inofensivo. Talvez, de alguma forma, estivesse a intensificar a ligação entre nós. E se aquele pedaço de metal não fosse apenas uma lembrança, mas uma prisão disfarçada, um laço forçado que me obrigava a sentir por ela algo que deveria ser proibido?

A ideia fez-me estremecer. Se fosse verdade... Se o amuleto realmente influenciasse a forma como eu a via, isso significava que estava a ser manipulado. Mas, ao mesmo tempo, as emoções eram tão reais, tão intensas, que eu não sabia o que acreditar.

Levantei-me, decidido. Não podia continuar assim. Precisava de ver Cate, precisava de lhe explicar o que realmente estava a fazer ali, o que estava a planear. Com passos silenciosos, saí do quarto, já com um plano em mente para evitar os guardas.

O plano formou-se na minha mente enquanto descia pelos corredores escuros em direção às masmorras. Levei comigo uma poção de sono, algo leve mas eficaz, que preparei anteriormente para uma situação como esta. Sabia que não podia arriscar muito tempo, mas precisava de falar com Cate. Precisava que ela soubesse a verdade.

Aproximava-me das masmorras, os passos firmes e o frasco de poção na mão. Precisava de ser cuidadoso — a poção era poderosa, mas o modo de administrá-la teria de ser subtil o suficiente para que os guardas não desconfiassem.

Parei a alguns metros deles, longe o suficiente para não perceberem a minha presença, baixei-me e com um gesto suave depositei o frasco no chão frio. Concentrei-me, deixando que a minha magia elementar da terra se infiltrasse pelo chão e começasse a mover o frasco em direção a eles, em silêncio, como se fosse apenas mais uma corrente de poeira.

Assim que o frasco estava posicionado perto deles, invoquei um leve tremor no chão partindo o mesmo e libertando a poção, e foi o suficiente para os alertar. Um deles levantou a cabeça, alarmado, e fez sinal ao colega para inspecionarem. Aproximaram-se cautelosamente, observando o frasco partido sem notarem nada de especial, mas já era tarde. Em poucos instantes, o aroma subtil começou a fazer efeito. Trocaram um olhar confuso, as pálpebras a tornarem-se pesadas, até que, com movimentos lentos, se recostaram na parede e fecharam os olhos, caindo num sono profundo.

Apercebi-me de que o caminho estava livre e que a poção já não seria um problema para mim e, sem perder tempo, aproximei-me da cela de Cate, onde ela se encontrava sentada no chão. Rapidamente se apercebeu da aproximação de alguém, e olhou na minha direção, observando-me com uma expressão que misturava desconfiança e surpresa.

O Despertar das SombrasOnde histórias criam vida. Descubra agora