Viginti Tres

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PETRUS

Aguardei nos corredores que levavam à sala de reuniões, mas a minha mente estava longe dali, num lugar mais sombrio e inquietante. As imagens de Cate naquela cela, acorrentada como um animal perigoso, não saíam da minha cabeça. Os olhos castanhos dela, tão determinados, agora cheios de raiva e desconfiança, penetravam-me como lâminas afiadas. E o pior de tudo era que eu era o motivo desse olhar, que eu era uma das razões por trás daquele ódio.

Odiava vê-la assim, amarrada, reduzida a uma sombra do que era. As correntes nos tornozelos dela, o ferro frio a morder-lhe a pele... a indignação fervia-me por dentro. Tive de desviar o olhar quando percebi o desconforto dela, mas por um segundo, ao encarar aquelas correntes, senti a raiva a crescer. Ela não merecia aquilo, nem as algemas que lhe roubavam a liberdade e a força. A ideia de que tinha de ser eu a transmitir-lhe desdém, como se realmente acreditasse nas mentiras dos Magni Stellaris, deixava-me doente.

Cada palavra que tinha dito, cada insulto que fora forçado a lançar, estava gravado em mim como cicatrizes. Recordava a forma como a esperança dela se esvaneceu quando me viu ao lado de Michaelius, e como se recusava a acreditar que eu fosse mais uma peça deste jogo. O pior era saber que, naquele momento, ela acreditava mesmo que a tinha abandonado.

Respirei fundo, a tentar afastar a dor e raiva que ameaçavam transbordar e estragar a minha postura. Sabia que, em breve, estaria diante dos Magni Stellaris, cada um deles atento ao mais pequeno detalhe. O que significava que, por mais que me custasse, precisava de deixar aquela parte de mim aqui, neste corredor, e encarar a reunião como um soldado impenetrável.

Michaelius finalmente apareceu, e enquanto caminhávamos pelo corredor, não pude evitar uma ponta de curiosidade que, embora arriscada, precisava de ser saciada. Sabia que Michaelius detinha uma constelação proibida, mas, até agora, ninguém me dissera exatamente como os Magni Stellaris controlavam esse poder nele. Era algo que me deixava desconfortável, e, mais do que isso, era uma informação que talvez me fosse útil.

Olhei de soslaio para o meu irmão, que caminhava ao meu lado com um ar focado e determinado, e decidi arriscar.

— Michaelius, — comecei, com um tom de voz que sugeria um interesse casual, como se estivéssemos apenas a partilhar uma conversa despreocupada. — Desde que soube do milagre que aconteceu contigo, fiquei com a curiosidade... como é que descobriste a tua constelação? Foi... muito diferente do processo normal?

Ele franziu o sobrolho, claramente desconfortável com a questão. A mão direita dele crispou-se ligeiramente ao lado do corpo, e um breve momento de silêncio caiu entre nós antes de ele responder.

— Não foi algo que eu tivesse escolhido ou sequer compreendido de imediato, — disse ele, num tom de voz mais baixo, quase como se estivesse a murmurar um segredo. — Os Magni Stellaris foram... persuasivos. Fizeram-me entender que, apesar do potencial, o meu poder precisava de ser controlado, para o meu próprio bem. — Ele pausou, lançando-me um olhar rápido e cauteloso. — Nunca questiones a sua decisão, Petrus. Eles sabem o que é necessário para manter a ordem.

Assenti, tentando manter a expressão neutra, embora o desconforto me percorresse. Ele estava a ser vago, e, pelo tom evasivo, percebi que talvez nem ele compreendesse completamente como era manipulado. Deixei o assunto morrer, não querendo levantar suspeitas desnecessárias, mas aquilo deixou-me com um peso adicional.

Finalmente, chegámos à sala de reuniões. As portas foram abertas, revelando uma mesa longa e imponente onde todos os Magni Stellaris já se encontravam sentados. À medida que Michaelius e eu entrávamos, vi os olhares virarem-se para mim. Aquila, sentado na extremidade, manteve a postura rígida e o olhar fixo em mim, como se tentasse captar qualquer fragmento de fraqueza. Ao seu lado, Andromeda e Leo observavam-me com expressões mistas de curiosidade e análise. Era evidente que, para muitos, o meu retorno levantava questões.

O Despertar das SombrasOnde histórias criam vida. Descubra agora