Capítulo 3

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Eliana se sentia exausta. Havia uma semana que não conseguia dormir. Tudo começou com uma dor de cabeça repentina, na saída do serviço. Tomou uma aspirina antes de dormir, o que melhorou a dor, mas lhe trouxe um sonho estranho. Hoje, ela havia chegado do trabalho, jogado a bolsa no sofá, e ido direto para a cozinha. Tomou três aspirinas e um copo de café. A água quente do banho caía agora sobre seus cabelos e Eliana mantinha os olhos fechados, esperando o efeito dos remédios. Era uma advogada recém formada, em uma cidade pequena, onde mal havia casos para a quantidade de profissionais. Não podia ter seu rendimento caindo agora. Desligou o chuveiro, se secou e deitou na cama ainda enrolada na toalha. Seus pensamentos estavam perdidos entre os casos no trabalho, o casamento da irmã em outro estado, e o sonho. O sonho estranho. Nunca havia parado para prestar muita atenção nele. Era confuso, sem sons distintos, e lugares escuros e úmidos. Ela só conseguia lembrar do olhar. Um olhar de azul profundo, fitando-a como se pudesse salvá-la do caos de seu sonho. Aqueles olhos estavam em todos os seus sonhos, todas as noites, e era a primeira coisa da qual se lembrava na manhã seguinte. Mas nunca se importou com eles.

Ligou a TV do quarto em um canal qualquer, e foi até a cozinha pegar uma caneca com leite quente. Aquele tempo horrível de chuva deixava o ar frio, mesmo nas noites de verão. Mas ultimamente estava frio demais. Nada de sol durante o dia, garoa o tempo todo, interrompida por chuvas torrenciais que caíam de hora em hora. Sentou-se na cama.

Eliana morava sozinha naquela casa havia seis meses. Queria sua independência, sua casa, seus móveis. Coisas que não conseguia enquanto morava com a mãe e mais três irmãs. Ela era a mais nova, e sempre saía perdendo nas discussões de família. Eliana colocou seus fones, e mesmo com a TV ligada, recostou no travesseiro e fechou os olhos, esperando a dor melhorar. De olhos fechados, as imagens começaram a vir lentamente.

Primeiro se viu em uma rua escura, de terra batida, onde podia ver ao longe a silhueta de uma velha fábrica. Viu um homem que parecia mais um mendigo passando ao seu lado sem notá-la. Ele olhou para todos os lados e entrou em um terreno baldio que ficava em frente à parte mais escura da fábrica. Ela seguiu-o sem que ele notasse. Ele estava entrando em uma fenda que parecia realmente muito perigosa, em uma espécie de torre da velha fábrica. Quando ele olhou para fora antes de erguer um pesado bloco de concreto que servia parcialmente de porta, Eliana pode ver aqueles olhos azuis de seus sonhos. Tentou chamá-lo, mas antes de pronunciar qualquer palavra, se viu em um lugar diferente. Um confortável quarto sem janelas, iluminado por velas que estavam por todo o quarto. Os móveis eram antigos, de madeira cor de mogno, e a cama era cercada por uma enorme cortina de seda vermelha. Ela começou a andar pelo quarto, procurando entender onde estava. A única entrada e saída do quarto era uma porta enorme, da mesma madeira dos móveis, que ficava parcialmente oculta por uma cortina semelhante a que rodeava a cama. Eliana começou a passar a mão pelos móveis, quando se sobressaltou. Sentiu um arrepio vindo da coluna, que a fez virar em direção à cama, instintivamente. Havia alguém na cama, e parecia estar acordando.

Eliana, embora assustada, aproximou-se da cortina, e a abriu devagar. Viu uma mulher nua, sentada na cama, com os longos cabelos negros lisos que chegavam até sua cintura. A mulher virou-se para Eliana, encarando-a com um olhar penetrante, apesar de não demonstrar hostilidade. Quando Eliana tentou afastar-se, a mulher já estava em pé atrás dela, passando suavemente a mão pelos seus cabelos, colocando os definidos cachos de Eliana para a lateral de seu ombro. A mulher começou a beijar o pescoço de Eliana, passando a mão pelos seus seios. Ela não conseguia se mover, nem sequer lhe passou pela cabeça tentar se livrar dali. A estranha mulher colocou um pesado colar no pescoço de Eliana, um objeto todo trabalhado em metal azulado, com marcas avermelhadas. Ainda atrás de Eliana, a mulher despiu a toalha que ela vestia, deixando-a também nua. Colocou a mão na cabeça de Eliana que fechou os olhos como se estivesse sendo controlada pela estranha criatura.

Eliana foi facilmente conduzida até a cama acortinada, deitou-se e deixou que as mãos da mulher passeassem livremente pelo seu corpo. Um arrepio tomou conta de seu corpo, quando a mulher tocou seu ponto mais íntimo. Sentiu um metal frio passar pela sua barriga, subindo até chegar entre seus seios. Eliana começou a assustar-se. Foi tomada violentamente pela vontade de abrir os olhos e acordar daquele sonho. Mas não podia. Seu corpo parecia tão envolvido com a estranha de cabelos negros, que desobedecia às ordens de seu cérebro. Sentiu o metal passar por cima do colar, chegando próximo a sua garganta. A mulher abaixou até próximo dos ouvidos de Eliana, dizendo quase como um sussurro.

_Chegará a hora em que você estará pronta, escolhida. Irei ao seu encontro e você se entregará a mim.

Eliana abriu finalmente os olhos. A mulher levantou devagar, assumindo uma posição que a impedia de mover-se. Eliana pode ver os olhos negros da mulher tornarem-se de um vermelho profundo, no momento em que ela ergueu o objeto de metal frio que estava encostado em sua garganta. Era uma espada, antiga, de um metal claro e luminescente, com uma delicada pedra azul em seu cabo. A mulher ergueu a arma, abaixando-a em seguida em uma velocidade inimaginável.

Eliana acordou assustada e suada. Tinha os cabelos emaranhados e a toalha aberta. A TV ainda estava ligada. Eliana procurou se acalmar. Aqueles sonhos iam deixá-la doente. Nunca tinha tido um tão nítido e vívido assim. Levantou-se arrumando a toalha, e foi até o banheiro para lavar o rosto com água fria. A cabeça doía insistentemente. Levou as mãos cheias de água fria até o rosto várias vezes. Cansada, encarou-se no espelho por alguns segundos, apoiando as mãos bordas da pia de louça. Foi quando reparou que a toalha estava demasiado baixa, mostrando um decote generoso, por onde um fino filete de sangue escorria. Eliana franziu a testa, e com a dor aumentando consideravelmente, foi abrindo lentamente a toalha. E lá estava o motivo do sangue. Um fino arranhão, entre seus seios.


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