Capítulo 4

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Amitiel estava perdido, confuso e cansado. Rosane apenas contribuíra para aumentar sua aflição. Tinha decidido ir visitá-la, mesmo depois do que tinha feito à ela. Rosane era a profetisa de um anjo mais antigo que ele, morto em batalha. Mas ele sabia que os sonhos de Rosane eram muito importantes para serem perdidos. Havia transformado ela em uma bruxa, para que não corresse riscos, mas nada havia saído como planejado. A Alta Cúpula aparentemente não estava interessada nas visões daquela profetisa, e Miguel havia decidido eliminá-la pessoalmente, antes que qualquer anjo soubesse de alguma coisa. Quando Miguel desceu para cumprir seus planos, ele havia matado também toda a família de Rosane. Quando tentou matá-la, acabou descobrindo a artimanha de Amitiel para que ela não morresse. Largou-a de forma lamentável, com ferimentos que levariam anos para se curarem, quando pediu a Ritiel que desfizesse o feitiço e descobrisse o anjo que o havia proferido. O anjo deveria morrer para que Rosane perdesse seus poderes. Quando Ritiel foi investigar o nome do anjo responsável pela bruxa, Anriel apareceu e matou Ritiel. Claro que Miguel ainda poderia descobrir ele mesmo o nome do anjo que havia feito o feitiço, então Amitiel não teve muito tempo para decidir o que fazer.

Gostava do irmão Anriel. Sempre o protegera, e era um dos mais fiéis e poderosos guerreiros de Gabriel. E ele havia sido banido. Banido por medo. Medo dos arcanjos que constituíam a Alta Cúpula, medo de perderem seu domínio sobre o céu, medo da nova criatura que nasceria da profecia. Mas, porquê? Amitiel tentara buscar a resposta com todos os profetas conhecidos que haviam sobre a terra, mas nenhum lhe disse ao menos uma palavra. O que será essa criatura? Qual o propósito da profecia? Afinal, ele era o anjo da verdade, mas a maior verdade da história havia lhe sido ocultada.

Amitiel estava perdido em pensamentos. Era agora um desertor, e para manter-se vivo como tal, teria de abdicar do uso de seus poderes, e misturar-se à população comum para não ser facilmente detectado pelos irmãos a serviço de Miguel. Seria caçado! Mas algo estava errado, e Rosane era a única em quem podia confiar. Sabia que os anos que havia passado como bruxa e profetisa haviam lhe ensinado muitas coisas. Não tinha para onde correr.

Amitiel parou no alto de uma colina, com os raios de sol banhando a extensa floresta abaixo. O ar era frio, mas revigorante. A mente de Amitiel insistia em saber a verdade, e cada vez que procurava por ela, mais mentiras vinham até ele. Precisava ajudar seu irmão, precisava ajudar Rosane, ajudar aos homens. A criatura que nasceria dessa profecia poderia acabar com a humanidade? Com os demônios? Com os anjos? As perguntas eram muitas, e as respostas eram ainda em maior número. E todas mentiras. Exceto Rosane. Ela sim lhe dissera a verdade, sempre dissera. E ele não podia protegê-la de seu irmão Miguel.

Pensando em Rosane, Amitiel lembrou-se do conselho que ela lhe dera, de achar os outros desertores. Haveriam mais anjos como ele, desconfiados da Cúpula, que haviam preferido desertar a obedecer as ordens? Não podia ser. Em séculos, se houve duas ou três deserções era um número bastante alto, e os anjos eram sempre encontrados e destruídos, com exceção da lenda de Azriel, o anjo comandante da Cúpula, que havia feito inúmeras mudanças nas ordens que vinham do céu, e que havia simplesmente desaparecido pela terra. O que mais Amitiel precisava descobrir? Quantas verdades mais ele não teve conhecimento enquanto estava no céu?

Amitiel começou a descer a estrada que levava ao centro da cidade. Teria que pegar um ônibus, comprar roupas mais limpas, e esconder sua espada. Não poderia aparecer na rua daquela maneira. Precisava estar misturado, camuflado entre os homens, para que seu plano para que seu plano pudesse transcorrer sem a intromissão de seus irmãos, e agora, seus caçadores e carrascos de sua existência celestial. Precisaria de forças e de meios para encontrar o que buscava. E ele sabia exatamente de quem ele necessitava naquele momento. Se ele teria de se juntar aos desertores, então que começasse se juntando ao melhor deles, que se juntasse ao seu aprendiz e amigo, ao seu protetor, a um antigo guerreiro, servo e leal ao próprio Gabriel. Ele precisava encontrar Anriel.


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