Capítulo 10

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Miguel permanecia sentado, distraído, quando Gabriel jogou uma enorme quantia de papéis e pergaminhos na mesa em frente. Miguel somente ergueu a cabeça, e apoiando o queixo sobre as costas da mão, esperou o irmão falar.

Gabriel tinha uma chama no olhar, tornando-os mais azuis. Possuíam um brilho diferente, e era isso que deixava Miguel altamente desconfortável.

_Não quero ninguém.

_Perdão? – O olhar de Miguel demonstrava claramente sua instabilidade de humor, estando agora visivelmente nervoso. – Como assim, ninguém?

_Não vou levar ninguém comigo para a missão que me incumbiu. Anjos demais já estão na terra, apesar de que eu acredito que a chegada de alguns arcanjos não vai passar desapercebida até mesmo pelos confusos. Os anjos desertores são grandes guerreiros em sua maioria, e sempre levam até o fim aquilo que planejam fazer. Se eu chegar do céu com uma horda de anjos comigo, eles vão fugir. É arriscado, mais insisto em ir sozinho.

Miguel levantou-se devagar da mesa. Apoiou as mão fechadas no vidro do tampo e olhou fixamente para seu irmão Gabriel. Todos os outros já haviam partido para suas missões na terra, exceto ele. Havia permanecido fechado por dias, pedindo mais e mais documentos. Alguns dos arquivos, outros pergaminhos de história, alguns sobre magias. E agora a pilha toda de papéis estava na frente de Miguel. E era isso que o havia inquietado por tanto tempo. Sabia que de todos os irmãos, Gabriel era o mais inteligente, e mais rápido em chegar a conclusões. Tantas pesquisas certamente iam dar ao irmão uma vantagem quando descesse a terra.

_Pois bem, Gabriel, faça como quiser.

_Farei. Mas antes, quero pedir um favor, irmão. – Os olhos de Gabriel novamente brilharam. – Quero permissão para procurar dois desaparecidos antes dos nossos irmãos. Na verdade, quero que os passe para a minha lista, e que ninguém mais procure por eles além de mim.

Miguel perdeu a base. Se o que Gabriel pedia, incluísse nomes dos doze anjos que ele tentava esconder, seu plano estaria arruinado. Seria a pior briga da história do céu, e ele não podia simplesmente negar o pedido do irmão sem uma justificativa.

_Quer dar como desertores, dois irmãos desaparecidos? Por qual razão?

_Um deles era do meu exército. E o outro tem um cargo realmente alto demais para ser considerado simplesmente desaparecido. Ninguém o capturaria com facilidade, muito menos ficaria perdido pela terra.

_Pois bem, quais são? – Miguel sentou-se novamente em seu lugar, e fingia colocar em ordem os papéis que Gabriel havia trazido, para tentar esconder seu nervosismo em relação aos nomes. Não podiam ser um dos doze, simplesmente não podiam.

_Quero transferir para minha lista os nomes do meu general Anriel, e do líder de tropas Amitiel. Alguma objeção, irmão?

Miguel estava gélido, Mil e uma opções passavam pela sua cabeça naquele momento. Como ele não havia pensado nisso? Anriel era um desertor declarado, e apesar disso ele não o tinha incluído na lista extensa de Gabriel, e ele era seu melhor general. Em vez de simples nomes, Gabriel havia escolhido dois dos anjos que Miguel tentava com tanto cuidado esconder.

_Amitiel era um bravo soldado, irmão. Verifique suas pesquisas, o dele estará na de baixas. Além disso, alguém que possui força suficiente para dizimar seus anjos, poderia muito bem ser capaz de capturá-lo. – Miguel pegou vários pergaminhos, abraçando-os com demasiada força. – Quanto a Anriel, está morto há algum tempo, como o verme imundo que era. Se estivesse vivo, não estaríamos aqui tendo esta conversa. Mas pode procurá-los, se quiser.

_Amitiel e Anriel não estão nem mesmo na lista de baixas, verifiquei isso em minha pesquisa. Como esse é o caso, os colocarei na minha lista, já que um deles é de minha proteção e o outro, um anjo honrado e com alta patente. Pode até ser que Amitiel esteja nas mãos do inimigo, mas o fato de não haver nenhuma mobilização para procurar pelos que sobraram, sendo que oitenta apenas foram mortos, se eu encontrá-lo, além de trazer mais de um anjo de volta, ainda terei informações úteis para a Cúpula. Mais alguma objeção, irmão?

Gabriel vencera. Miguel via em seu sorriso discreto, e em seu olhar penetrante. Ele havia vencido! E havia vindo debochar dele, pedindo sua autorização para procurá-los! Assim, se desviasse sua atenção à eles, ninguém poderia impedir, nem mesmo Miguel. Era demais para ele. Tinha que agir com calma e cuidado, e acelerar seus planos antes que Gabriel acabasse com eles. Falou calmo com Gabriel, apesar de estar gritando em sua mente.

_Nenhuma, irmão. Vá com a benção do pai, e que obtenha sucesso em sua missão.

Sem agradecer, Gabriel levantou vôo.

Miguel correu até seus aposentos, e mandou um dos anjos servos da Cúpula, lhe trazer todos os pergaminhos que Gabriel havia solicitado. O anjo trouxe-lhe mais de dez dúzias deles. O nervosismo e a raiva estavam estampados em seu semblante. Pensava que a necessidade havia levado o irmão a pedir aqueles pergaminhos, mas eles eram totalmente sem coerência. Havia pergaminhos sobre a criação, sobre os sentimentos humanos, e magias conjuradas na terra por bruxas medievais. Aquilo faria com que fosse impossível saber quais pergaminhos ele realmente pesquisou. Ele tinha necessidade de saber imediatamente o que o irmão havia descoberto, e caso não conseguisse a tempo, teria de tomar uma decisão drástica. Se Gabriel não desistisse de seu plano, ele teria que matar Gabriel, para que seu plano pudesse ser concluído. Precisava agora agir de maneira organizada, com cautela, até que tudo estiver pronto. Mas para isso, teria que ser mais esperto que Gabriel.

E pôs-se a revirar os pergaminhos.


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