E então estávamos só nós dois mais uma vez no carro. Spence dirigia concentrado enquanto eu o analisava. Eu sabia cada um de seus traços a um nível que, se precisasse, desenharia seu rosto perfeitamente sem precisar recorrer a nada além de minha memória. Cada curva, cada marca, eu sabia exatamente onde ficava e ainda assim não cansava de olhá-lo.
Ele estacionou o carro em frente ao meu prédio, mas eu não me movi.
- O que está olhando? - Spence indagou com um sorriso envergonhado.
- Nada. Quer dizer, tudo. Você. - desviei o olhar para minha bolsa, procurando a chave - Você vai ficar? - mordi o lábio, esperando ansiosamente pela resposta positiva.
- Eu tenho outro plano em mente, na verdade. Poderíamos pegar algumas coisas aqui e ir para o meu apartamento, se você quiser.
- Sim, claro! - eu nem hesitei - Espere aqui que eu volto em dois minutos.
Dei um beijo rápido em Spence e saí apressa do carro. Em pouco tempo eu estava de volta com uma mochila e tudo que eu pudesse precisar, o que, de fato, não era muita coisa. Algumas roupas, maquiagem básica, escovas de dentes e de cabelo (mas nada de secador, eu o abomino).
Spence parecia feliz e eu estava tão entusiasmada para conhecer o lugar no qual ele morava que deixei de lado o cansaço pelo dia estressante. Paramos na garagem de um prédio antigo porém bem cuidado, com três andares e poucos apartamentos. Ao entrarmos, subimos dois lances de escadas e chegamos a um corredor com duas portas brancas, no último andar. Spence pegou a chave e abriu uma das portas.
Minha primeira visão foi de uma enorme estante coberta de livros com alguns sofás ao redor e mais alguns livros empilhados pelo cômodo. A iluminação do sol estava fraca pelo dia já estar chegando ao fim. Dei alguns passos e o cheiro de livros antigos tomou conta de tudo, me lembrando de uma loja de livros usados que eu costumava visitar quando saía mais cedo das provas da escola.
Spence foi ligando as luzes e me mostrando o local. Uma cozinha pequena, aparentemente pouco usada, e um banheiro de azulejos antigos decorados foram as primeiras partes. Depois veio o quarto dele, cujos únicos adornos eram uma cama de solteiro e algumas cômodas clássicas, além de mais livros espalhados. A última porta se abriu com uma surpresa: um cômodo praticamente vazio, contando apenas com uma enorme cama.
- É nova. Ainda não tive tempo de colocá-la no meu quarto. - Spence apertou os lábios e fitou o chão.
- O que houve? Você não gosta da cama? - fui até ele e acariciei seu rosto.
- Não é da cama, eu não gosto desse quarto. É aqui que eu sempre fico quando algo está errado. Fiquei muito tempo fechado aqui depois da morte da Meave... - Spence me encarou, procurando algum sinal de mágoa pela menção a Maeve.
- Não há nada de errado agora, ok? Vamos sair daqui. - falei em um tom amoroso e ainda acariciando seu rosto.
Desci minha mão pelo braço dele, entrelacei nossos dedos e o trouxe lentamente para fora do quarto, fechando a porta atrás de mim. Continuei o puxando até chegarmos ao sofá.
- Foi um dia difícil. Quer falar sobre? - ele disse quando sentamos.
- Ah, sim... Sabe, eu não consegui evitar de pensar em quando meu pai faleceu. - apoiei minha cabeça no ombro de Spence e deixei que ele me envolvesse com seus braços. - É claro que fiquei muito triste, mas não foi tão duro para mim quanto foi para Will. Meu irmão tem que carregar pelo resto da vida o nome do nosso pai e, junto disso, todo o legado dele. Ele não queria que Will tivesse de carregar esse fardo e esse é um dos motivos pelos quais ele chamava meu irmão de Bill ou Billy, mas nunca de William. Quando ele morreu, foi como se o "Billy" tivesse partido junto. Eu já estava longe, na faculdade de medicina, voltei para New Orleans apenas para o enterro. Mas Will assumiu a investigação em que nosso pai trabalhava, assumiu total responsabilidade pelo trabalho. Foi difícil para ele.
- Eu lembro disso. O primeiro caso em que trabalhamos juntos, a garota que queria matar todos os que acobertaram seu estupro. Ela só se dirigia ao Detetive LaMontagne e Will não descansou até concluir a investigação.
- E só hoje me dei conta de que admiro muito no meu irmão essa capacidade que ele tem em seguir em frente. Estava tudo desmoronando ao redor dele, mas ainda assim ele achou JJ e conseguiu ver nela uma nova luz para guiá-lo. Eu tenho que confessar: no início eu não gostava dela. Todas as vezes que Will me ligada sempre tinha alguma coisa magnífica para contar sobre JJ, o quão linda e espera ela era. - Spence riu. - E tem mais, ela o fez sofrer por quase um ano antes de assumir seus sentimentos e o compromisso com ele. Mas agora eu vejo que ela o salvou naquela época e continua salvando até hoje. Sou grata por ela ter cuidado do meu irmão e também por ela ter trazido você para a minha vida.
- Você tem sido a minha luz, Maggie. Você tem me guiado, me ensinado a seguir em frente. - Spence beijou a minha testa.
- Por que eu, Spence? Quer dizer, você é um gênio com memória fotográfica, QI altíssimo, vários PhDs entre tantas outras coisas... e eu sou só a garota que cuida dos cadáveres.
- Quimicamente falando, paixão pode ser explicada como uma alteração nos hormonal normalmente causada por um agente externo. Substâncias como endorfina, adrenalina, noradrenalina e dopamina aumentam enquanto a serotonina diminui. Essas mesmas mudanças ocorrem de forma semelhante quando há o uso de drogas ou o desenvolvimento de um Transtorno Obsessivo Compulsivo, e deve ser por isso que o meu TOC está tão controlado desde que eu fui baleado na...
- Spence, eu sei disso... - interrompi seu turbilhão de palavras. Ele tinha mesmo acabado de dizer que estava apaixonado desde o dia no hospital?
- Você não é só uma garota. - ele suspirou - Você é... fascinante. E me deixa sem palavras, o que é raro. Eu não sei explicar.
- O que você disse no telefone? - levantei a cabeça e olhei para ele.
- Ah, sobre a gravidez... JJ me fez jurar que não contaria até o momento certo...
- Não isso...
- Ah... - Spence encarou o chão - Acho que foi precipitado, desculpe...
Levei minha mão até seu queixo e o ergui, fazendo com que ele olhasse para mim.
- Diga...
- Eu te amo, Maggie.
Por alguns instantes me perdi naqueles olhos castanho-esverdeados, as pupilas negras parecendo labirintos que me engoliam. Permaneci imóvel, sem saber o que fazer ou o que falar. Eu nunca sei quando dizer, sempre tenho medo de me expor, mas ele merecia ouvir, ele merecia saber como eu me sentia. Meu coração estava acelerado, batia forte como se quisesse saltar do meu peito. E talvez quisesse mesmo sair dali e voar direto para as mãos de seu novo dono. Um sussurro saiu pelos meus lábios entreabertos:
- Eu te amo também, Spence.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Um amor inesperado (Criminal Minds)
FanfictionMaggie tem uma vida boa. É jovem, formada em medicina e possui um cobiçado emprego no Federal Bureau of Investigation (FBI), onde atua como legista. Seu sonho é trabalhar com a Behavioral Analysis Unit (BAU) e ajudar o time a traçar perfis de serial...