Thoughts

292 21 0
                                    

Ele sai batendo a porta. Me encaro no espelho , como se não fosse eu no reflexo.

Meus olhos fixam no meu ventre. Será possível? Eu sou tão má e perversa, isso é algo inacreditável.

Não dormi. Minha mente não para com os pensamentos. Vejo o sol nascer e as primeiras frestas de luz aparecem no quarto.

Corro para o banheiro e coloco para fora o que eu não tinha no estômago. O enjôo é forte me deixando fraca e sensível a cheiros mínimos.

Banho e deito na cama. Liguei para o Dr.Peregrini e logo estará aqui. Camélia não veio me ver e muito menos o Kenny. Benjamin também não apareceu.

- Olá.

Kenny abre a porta para o meu psicólogo. O cheiro do seu charuto é tão... Enjôo ! Torno a vomitar. Me sinto fraca e morrendo de fome.

- Esta tudo bem ?- Kenny pergunta. - Trouxe isso para você .

Uma bandeja com frutas , suco e panquecas. Eu comi tudo e me senti muito melhor.Dr.Peregrini me observa e anota sem parar. Deito na minha cama e espero começar.

- O que está frustrando seus pensamentos?

- Muita coisa. Na verdade, uma só.

- Quando você quiser começar a falar.

Eu respiro uma, duas , três vezes. Ele espera paciente e o cheiro da fumaça me incomoda.

- Esta incomoda com algo ?- Pergunta.

- Pare de fumar. Esse cheiro não é agradável. - Falo rapidamente.
- Desde quando isso se tornou um incômodo?

- Eu acho que estou grávida. - Confesso.

Ele me analisa e tenta achar algum indício de mentira. Então apaga o charuto e o guarda em uma caixinha.

- Então é isso que está tirando seu sono ?

- Eu não quero prosseguir com essa gravidez... É errado.

- Errado ? Não há nada de errado em gerar uma vida.

- É errado quando sou eu quem gera. Eu não sou boa , não mereço nenhum tipo de afeto e isso... - Eu toco na minha barriga. - É tão errado para mim.

- Minha mãe era muito religiosa e sempre me falava de Cristo. Ela sempre me dizia que os planos de Deus são confusos para o homem. Você sempre fala que não acredita no paraíso , talvez essa gravidez seja uma mensagem do Criador para lhe mostrar que há sim um paraíso e que não é só um lugar onde pessoas salvas irão após a morte , mas sim uma pessoa que irá ensinar um tipo de amor que vai além da capacidade humana.

- Eu não sou merecedora de nada.

- É isso que pensa ? Talvez não agora , mas quando sentir que gera algo bom dentro de si verá que muitas coisas farão sentido e que o amor não é um bicho de sete cabeças.

- Está me aconselhando a ter esse bebê ?

- Não , estou te aconselhando a dar-se uma nova chance e uma nova perspectiva de vida.

Conversamos um pouco mais e ele teve que ir. Suas palavras são como um CD arranhado na minha cabeça. Eu não me sinto digna de nada.

Se existe um paraíso provavelmente eu não sou bem-vinda. Pego meu celular e disco o número do médico. Minhas mãos soam.

- Senhora Haverlly! O que devo a honra?

- Eu preciso de uma consulta...

Sem que eu perceba o celular é arrancado das minhas mãos. Benjamin o joga na parede com raiva. Seus olhos estão vermelhos e com a cara de quem teve uma noite de cão.

- VOCÊ NÃO VAI ABORTAR, ESTÁ ME ENTENDENDO! NÃO VAI!

Eu me assusto com sua ira repentina. Ele está desesperado. Seu cheiro de álcool e bar... Enjôo! Porra! Coloco tudo pra fora. Fico sem ar por não conseguir para de vomitar.

Benjamin me ajuda a recuperar o ar e aos poucos o alívio chega. Me sento no vaso para não cair. Algumas dores me incomodam, mas não falo nada.

- Você está bem ? Me perdoa por gritar com você...

Eu o afasto, seu cheiro está me deixando tonta.

- Não chega perto de mim. Você está me dando náuseas.

- Meu cheiro ? Ah!

- Fique longe de mim.

- Não !

Eu saio do quarto e respiro com segurança. Kenny me olha estranho.

- Não deixe que ele chegue perto de mim a menos que esteja limpo.

- Tudo bem. Vamos .

Entro no quarto dele e me deito. O sono me abraça forte e minhas pálpebras pesam. Kenny deita ao meu lado e suspira.

- Kenny.

- Sim.

- Estou grávida.

Sei que ele está sorrindo , mas estou com preguiça de olhar para ele.

- Se for menina, não coloque seu nome na pobre criança.

Eu queria rir, mas não consigo.

- Pode pôr Mackenzy. Gosto do som da pronúncia.

Gostei do nome.

- Se for menino, coloque Alexsander. Defensor da humanidade e corajoso. Não vê graça em uma vida sem aventuras.

Com certeza é corajoso. Veio parar logo na melhor pessoa do mundo e pode ter certeza que sua vida não será sem graça.

- Alexsander...- Falo baixo o nome. - Me soa bem.

- Então tem preferência no sexo do bebê ? Bom saber disso .

- Kenny.

- Fala.

- Eu não sei se quero esse bebê. Então não crie expectativas.

Ele fica calado por um tempo. Seus braços me aquecem e seu cheiro é tão bom. Me aninho contra seu corpo.

- Estarei do seu lado em qualquer decisão. Sejam elas suicidas ou não.

Me entrego ao sono. Acordo com dores no abdômen. Benjamim está me olhando e quase morro de susto.

- Por favor.- Pede.

- Minha decisão está tomada.

- Eu te imploro, não faça isso.

Eu me sento na cama. Não estou muito boa hoje e minha cabeça começa a doer.

- Eu te amo e nunca vou te deixar.

Me ama ? Eu não mereço ele muito menos um filho dele. Isso é demais pra mim. Não saberia viver com um filho que teria vergonha da própria mãe. Eu teria vergonha de mim.

Como ele poderia olhar para mim ? Ele sentiria orgulho da mãe perversa e cheia pecados ? Ele me amaria ?

Eu sei as respostas e não é agradáveis. Nem mãe eu tenho. Se a que me gerou estiver viva sentiria repulsa da filha,negaria a mim eternamente e eu não a culparia.

Não tenho sentimentos, sou má ,derramo sangue , destruo sonhos e futuros.

Como poderia dar um futuro a ele ?

- Sinto muito,mas não suportaria a idéia de ter um filho.

Lillith ( RETIRADA DA PLATAFORMA 10/12)Onde histórias criam vida. Descubra agora