Quando dei por mim, estávamos todos no carro ; eu, Matheus, Lucas e Nicolas. Minha mãe dirigindo alegre e o dia passando lá fora. No caminho, ouvíamos músicas, conversávamos uns com os outros, jogávamos jogos no celular e por aí ia.
Paramos em um restaurante da autoestrada e sentamos em uma mesa, minha mãe ria e se sentia feliz por estarmos indo a casa da Vó Rita e eu nem sequer sabia se ela tinha saudade da sogra, ou só queria que me divertisse no meu aniversário.
Olhei em volta, o lugar havia mudado muito. Tinha uma fonte de moedas, jogávamos e fazíamos um desejo. Me lembrei de Aif-um, meu pai e eu, quando íamos pra casa da Vó Rita, jogávamos moedas ali desejando que fosse divertido. Agora ela estava desligada e havia mofo em volta, do outro lado, um canto para crianças ficarem.
Me levantei, indo até a fonte desligada. Lá, haviam apenas duas moedas, mesmo com o local estando completamente seco. As duas de um real, acabei então, a colocar a última moeda do meu bolso na fonte, desejando que tudo ocorresse bem.
Minha mãe voltou com comidas prontas e comemos enquanto víamos a televisão do restaurante.
-Mãe, a Vó Rita fica sozinha?
-Seu vô faleceu a tanto tempo, pelo que eu sei o seu pai havia deixado pago por um bom tempo para que alguém cuidasse dela, ela não deixa aquela casa de jeito nenhum mesmo.
-Mas ela tá bem, né Dona Lê?
-Claro, ela gosta de sair e tudo mais. Não perde tempo! Vamos, comam, precisamos chegar lá ainda hoje.
Fomos ao banheiro e voltamos ao carro.
-Cara, onde o Lucas tá?
-Ele estava contigo Nic.
-Eu sei, mas ele sumiu.
-Sumiu? A mãe dele vai me engolir viva! Vocês perderam o amigo de vocês?
Minha mãe ficou assustada e um segundo depois, aliviada. Lucas vinha em nossa direção com sua mochila. Entramos no carro, Lucas e Matheus dormiram e enquanto eu ouvia música, Nicolas me cutucou mostrando a tela do seu celular no bloco de notas:
Você viu na cara do Lucas? Tinha alguma coisa branca. Por acaso ele comeu algum doce escondido?
Fiz que não e escrevi em meu celular:
Não se preocupe, o doce já foi comido. Apenas durma.
Só que veio em minha mente, do nada, que aquilo não se tratava de doces.
Existem obstáculos na vida de todo mundo, creio que alguns sejam mais fáceis e outros mais difíceis. O quê leva as pessoas a se entregarem a esses obstáculos? Medo? Fraqueza? Covardia ou falta de opção? Eu penso que, às vezes pode ser apenas que, seja uma válvula de escape.
Parei de pensar nisso, logo adormeci. Em meus sonhos, apenas via o campo e a imagem de uma linda garota, eu não conseguia reconhecer quem era, mas em meu coração, reconheço como Plutão.
Me senti completamente mal de tê-la deixado e torcia pra que ela estivesse bem. No fim, não importa o quão difícil seja decifrar a mente das garotas, sentia que ela estava triste.
Acordei e já entardecia, tiramos nossas mochilas e fomos recebidas por uma menina que era provavelmente da nossa idade, da qual o Lucas e o Matheus não tiravam os olhos. Entramos em um quarto com uma beliche, uma cama de solteira do outro lado e um colchão solto. Nos dividimos e fomos ser recebidos pela minha vó.
Acho que nunca falei dela, não temos muito contato, mas diferente do Tio Francisco, ela dava um pouco mais de atenção pra mim. Na verdade, ela é bem fofa, mas sempre que íamos lá queria ficar só com meu pai. Não entendo muito bem, sei que ela é mãe dele, mas o apego era tão grande que acabávamos por não ter uma vó presente.
-Vó? Tudo bem com você?
-Oi, oi meu filho, como você está? Estava com tanta saudade, tanto tempo que não te vejo, olha como você tá magro, sua mãe não te alimenta não? Sei que não, ela não sabe cozinhar quase nada, seu pai que sabe.
Sabia Vó, sabia.
- Tô bem vó, minha mãe cozinha sim. Esses são meus amigos, Nicolas, Matheus e Lucas.
Ela abraçou e beijou todos.
-Que garotos lindos, fortes e bonitos, se você não fosse tão macho diria que você é a princesa desses meninos lindos.
Matheus riu e fez um olhar se referindo ao Nicolas, murmurando um ;''princesa''.
Minha vó me encarou sem entender as risadinhas aleatórias e então, chamou Lucas.
-Menino, vem aqui. Você é o mais bonito então vou te dar um conselho, vocês podem ir que a menina vai servir um lanche.
Saímos curiosos, mas logo esquecemos isso com tantos lanches. A ajudante da minha vó, que atendia por menina e por Giovana, disse alguns lugares legais que poderíamos ir. A maioria eu conhecia, mas outros eram lugares novos e que principalmente mudaram, depois de tanto tempo.
Minha mãe conversou com a gente sobre os planos para o dia seguinte e foi conversar com a sogra, quando estávamos comendo, percebi a presença de Lucas, quieto e inquieto ao mesmo tempo. Se é que isso é possível.
-Meninos, vão dormir, vocês estão cansados, já é tarde, amanhã tem coisa pra fazer.
Giovana foi pra casa e minha mãe foi dormir no mesmo quarto que a Vó Rita. Nos deitamos, ficamos um bom tempo conversando e jogando no celular, até que Nicolas subiu no beliche e dormiu.
-Boa noite, estou com sono.
Disse Matheus logo atrás, se deitando no beliche debaixo. Apaguei as luzes e comecei a ouvir música, bem baixo. Notei que na cama solteira, Lucas se mexia bastante e estava acordado.
Tirei o fone, fiquei em silêncio, mesmo no escuro, podia ver seus olhos bem abertos.
-Aif?
-Hm?
-Sabe, eu prefiro dizer pra você porque, bem, você não é idiota.
-E eles são?
-Quê?
-O Matheus e o Nicolas, eles são idiotas e eu não?
-Não é isso, é só que, não sei, é pra você que eu deveria contar. Acho que você notou antes.
-Fala logo, quero dormir.
-Bem, o que sua vó me disse na verdade, me assustou, mas não me fez parar.
- O quê ela disse?
-Os dias são lindos, adoráveis e encantadores, mas dentro deles, existem vícios mais escuros do que a noite e é no escuro que a gente não vê quem nos mata.
...E é no escuro que a gente não vê quem nos mata...
Ele virou e se cobriu, pra tentar dormir ou porque esperou demais por uma resposta. Quando olhei novamente, ele dormia, ou pelo menos, fingia muito bem dormir. Fiquei inquieto, com algum tipo de insônia perturbadora.
Vim escrever isso agora, meu dia teria sido bem melhor se eu tivesse alguma válvula de escape. Mas eu não tenho e minha única opção é a covardia.
Acho que vou ignorar o fato de que meu amigo é um drogado,
Aif.
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Aif
Teen FictionEM HIATUS Eu sou Antônio Ícaro Fernandes, mas me chamam de Aif. Na verdade só me chamam assim porque meu irmão também era Aif. Bem isso que leu, ele era. Você sabia que Plutão voltou a ser um planeta recentemente?