XXII

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Enquanto esperava pelo jantar tive tempo de estudar minha situação com Benjamin. Eu era a testemunha ocular, também fui vítima. Segundo as leis eu tinha o direito de permanecer em segurança, dada às provas os culpados seriam presos. Isso porque eu tenho a lista com todos os nomes e endereços, bem como contas e outras coisas.

-Sim, mas para tudo isso você precisa de uma testemunha, e nada melhor do que o James. Se não quiser falar com ele....

-Não quero! -Respondi.

-Que seja. Eu posso falar, pelo menos com a Helen. -De novo aquele nome. -O quanto antes, melhor.

Meu pai chegou acompanhado da mulher, o que me deu um misto de raiva com ciúmes, ela não era feia, mas também não tinha nada de especial. Era morena e gordinha, não muito alta, mas era simpática até de mais. Meu pai sentou e ela sentou ao lado dele.

-Crianças a Helena vai sentar e jantar conosco essa noite. -Ele sorriu para ela. Quase tive um ataque de nojo.

-Espero que estejam se sentindo bem aqui. Sei que não é um dos melhores lugares, mas a intenção vale. -Senti que ela me olhava com carinho e acabei sorrindo.

-Estamos bem estalados aqui, eu gosto da calmaria desse lugar. -Peguei na mão dela.

Jantamos rapidamente, enquanto ela tentava sem sucesso se comunicar com Benjamin, todos rimos  quando ele tentou dizer umas palavras em português, e concordamos para o bem de todos que seria melhor se um de nós traduzisse a conversa.
Logo após pedi permissão para meu pai e subi para me trocar. Dessa vez definitivamente não iria chamar a atenção.

*********
-Chegamos, -Desci do carro e puxei Benjamin comigo.

-Tem certeza que é aqui? Nossa pequena é maravilhoso.-Benjamin demonstrava toda a admiração de um turista.

-Vai ficar aí? A fila está grande. -Peguei na mão dele.

Realmente a fila estava grande e lenta, e enquanto a gente esperava para entrar na boate aproveitamos para fazer nossa  melhor brincadeira.

-Aquela ali. - Ele apontava para uma morena alta.

- Ela deve se chamar Thays, tem trinta anos e pelo porte é professora. -A mulher me olhou e tive que disfarçar. -Vai Ben, aquele homem ali. - Apontei.

-É Brasileiro? - Ele riu. - Agora é sério. -Ele deve ter um nome que comece com F, é comprometido, e trabalha em algum, escritório, e aquele é o amigo de trabalho.

A bem da verdade eu já não tinha tanta imaginação para adivinhar a vida dos outros, quando a minha estava uma bagunça terrível. Falando em bagunça, James já deveria ter voltado ou estava curtindo o clima festeiro do Rio com aquela mulher.
A fila andou rápido, passamos pelo segurança e seguimos para o interior escuro e entupido de gente.

- Vamos beber alguma coisa? - Ben gritou para mim.

Aceitei o convite e fomos para o bar da boate, deixei Ben pedir as bebidas enquanto observava a dançaria alheia.
Mais cedo enquanto me arrumava tinha me sentido meio vulgar por estar usando um vestido azul muito curto. Agora porém com tantas mulheres semi nuas, me senti uma senhora de idade, Brasil é Brasil, havia me esquecido dos corpos maravilhosos daqui.

- Vem dançar um pouco pequena. - Benjamin era todo sorrisos.

-Não sei não Ben. - Ele me puxou para o meio da multidão.

Dancei com ele as músicas que se seguiram, até sentir uma mão me puxando. Ben já tinha parado e me olhava com uma expressão estranha, e alterava o olhar entre mim e o estranho.

-Olá. Será que podemos conversar? -Helen estava levemente rosada, e sorria muito.

Abrimos espaços entre os corpos dançantes e subimos a escada de ferro até o segundo andar  onde a música não era tão alta e havia casais conversando.

- Marjorie. Precisamos tomar providência logo. -Helen se curvou na mesa. - Recebi ligações anônimas.

- Eu preciso fazer umas ligações para as pessoas certas Helen, não sei se posso confiar em qualquer um. - Rebati.

-Vocês precisam conversar sabe, deixar as brigas de lado.

-Helen me desculpe, mas ele não foi nada cordial comigo. E além do mais, James sabe o que quer. Você poderia transmitir essa conversa para ele, - Ben concordou comigo.

-Deixa o tempo dizer.  Enquanto isso seja forte e aconteça o que acontecer, não conte para ninguém sobre as provas. -Ela ficou tensa. Logo teremos tudo nas mãos do FBI.

Caímos no silêncio, a conversa havia chegado ao fim, cada um bebericava sua bebida, falando um "é isso aí", ou "Pois é." Uma música nova começou a tocar, Helen sorriu levemente e pegou na mão do Benjamin.

-Adoro essa música. Vamos dançar Ben?

Ben? Quem tinha dado o direito dela chamar ele de Ben. E ainda mais com o sorriso meigo que não fazia jus à toda aquela carranca da primeira vez. Encarei os dois e abri os braços. Benjamin queria ir mas não ia, então dei meu famoso empurrão.

-Vai Ben, eu fico aqui te esperando.

Como sempre ficava. Peguei os caquinhos de esperança que restavam e joguei no lixo. Nunca ia dar certo engatar um romance com Ben, ele era muito galinha. Deus me livre, seria um chifre atrás do outro.

Meu amigo partiu no colorido pulsante da boate, esperei ele desaparecer e fechei os olhos sorvendo o conteúdo do copo dele e sentindo o álcool descer pela minha garganta e aquecer o frio do meu coração. Queria deixar de sentir o beijo do juiz.

- Que merda. - Bati o copo na mesa.- Preciso de mais umas doses.

Me certifiquei de que as minhas pernas ainda me obedeciam e caminhei até o bar, tive que descer a escada apertada e desviar de uns meninos idiotas,

- Tequila por favor, - Bati no balcão. - Ou que for mais forte.

Com o balcão apinhado de gente, tive que esperar ser atendida, mas não me arrependi.  O barman era tão bonito quanto simpático, e me serviu de doses de humor e cantadas.

-Moça vai por mim, chega de beber, - Ele servia os clientes.

- Eu sei, não vou mais. Verdade verdadeira, - Olhei para a plaquinha com o nome dele. - André, eu já estou de saída.

Mas aí comecei a chorar, e dizer que minha vida amorosa era uma merda. E ele acostumado a choro de bêbado sorria .

-Só um momento. -Ele correu para a outra ponta do balcão.

Avistei o Benjamin dançado, ou melhor enroscado na Helen. E lá estava eu outra vez, sentada num barzinho assistindo meu amigo sendo feliz, ou tentando. Na verdade até que  achava legal os dois, faziam um par estranho, mas bonito. Encarei meu amigo e decidi dar o fora.

-Já vai? -André voltou. -Falta dez minutos para eu sair.

-Desculpa. Deixa para a próxima. -Me afastei.

Tive que pedir licença para duas moças e dei de cara com ele. James estava agarrado com a tal, e falava no ouvido dela, senti ânsia na hora. Como se não fosse o pior ele traçou uma linha de Beijos pelo pescoço dela, que parou na boca. Infelizmente fui notada por ele.
Nosso olhar se cruzou. Ele estava confuso e agitado, empurrou ela para longe e levantou minimamente a mão. Engoli tudo e dei meia volta, encostei no balcão e abri a bolsa.

-Pensei que tivesse ido, sem nem dizer o seu nome. -André era moreno bronzeado de olhos verdes.

Tirei um papel da bolsa e rabisquei ali, em seguida entreguei para ele.

- Não.  Não posso deixar uma coisa tão boa passar. -  Pisquei para ele.

A bebida me deixava desinibida.

Não vi mais o juiz, mas sabia que seria questão de tempo até ele me procurar. Deixei a boate antes de me arrepender de ter dado em cima de um estranho,  quando a minha vida estava por um fio.

Meritíssimo Juiz  @PremioshakeOnde histórias criam vida. Descubra agora