Capítulo 24

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No dia seguinte, acordei, tomei café brevemente e depois de me arrumar, dirigi até a Rua das Flores. Tinha decidido ficar naquele apartamento até descobrir algo relevante e só sairia com algo importante nas mãos. Então levei comida e água, sentei no chão da maneira mais confortável e comecei a ler as cartas.

Depois de uma hora ter passado e de ter lido dez cartas, parei um pouco, apertei minhas têmporas, bebi um pouco de água e olhei pela janela. O dia estava lindo, imaginei como estaria na minha cidade, se Kara estaria na praia, sentindo aquele sol sobre a pele, se Meg estaria fazendo compras com Sarah, se Tyler e Mark estariam na piscina ouvindo músicas e fazendo piadas. Eu não conseguia me desligar daquela cidade ultimamente, desde ontem, o que era fácil – não pensar nela ou naquelas pessoas – se tornou inevitável. Às vezes me permitia pensar neles, mas, todas as vezes que aquele par de olhos esverdeados aparecia na minha mente, eu me obrigava a voltar para a realidade.

Bebi mais um gole de água e peguei outra carta enquanto mordia uma maçã.

"Rosa,

Tem sido difícil não pensar em você. E quando penso, algo me atinge, acho que esse algo é culpa. Minha mulher me abraça, eu penso em você, ela desabafa, eu desejo estar com você. Não posso mais continuar assim! Não posso mais fazer isso com ela. Mesmo com todo esse sentimento que é apenas nosso, há uma aliança em meu dedo, há uma casa me esperando e há uma promessa a ser cumprida. Eu sempre achei que estaria disposto a sacrificar tudo por você. Você e seu perfume de menina, você e sua risada tímida encarando o chão, você e sua forma intensa de sentir as coisas, você e seu vício por The Beatles, você e seu amor por Charles Chaplin, você e sua mania de ler o mesmo poema antes de dormir, você e sua vontade de assistir E o Vento Levou todo fim de semana."

Parei na metade da carta com o coração quase na mão e os olhos arregalados voltados para ela.

- Ah não... Por favor, que eu esteja errada...

Larguei a maçã e continuei a ler.

"Você e sua dificuldade em piscar, você e sua maturidade, você e seu amor por amoras, você e sua risada escandalosa quando está à vontade, você e sua fúria quando alguém a contradiz, você e seu amor pela TV. Você e o sinal que tanto odeia no ombro. E eu... Que sempre te conheci e nunca te amei. Eu que sempre te cuidei, e nunca te vi. Eu, que agora te vejo, amo e desejo, mas não posso ter. Eu, que sou tão parte da sua vida visível, tanto daquela que escondemos."

- AH MEU DEUS – gritei, antes mesmo de terminar a carta, sem dúvida alguma do que descobrira.

Nervosa o suficiente para ter um ataque, surpresa o suficiente para gritar por horas, me forcei a continuar.

"Ah, Rosa, é por te amar que te deixo. É por te querer que não te quero. Perdoe-me, tente me perdoar. Tente entender. Jamais vou olhar do mesmo jeito para você, e jamais me olharei no espelho da mesma forma. Todas as quartas feiras serei só eu, e você, apenas você. Matarei meu jardineiro, por favor, adormeça a Rosa. Mas deixe que ela volte quando seu Jack chegar, e você será livre para ser Rose. Que ironia. Serás Rose, mas eu, já não serei Jardineiro.

Com amor, Eu."

Minhas mãos tremiam. Dobrei a carta e coloquei no bolso. Ela não era a última, sobraram umas oito, mas eu não podia lê-las. E duvidava que alguma outra tivesse a informação que estava nessa.

Ainda com as mãos tremendo – mais do que antes – peguei meu celular e digitei para Scott: "Me encontre no hotel. Sei quem é a Rosa".

Respirei fundo diversas vezes e saí do apartamento, estática, sem enxergar as coisas ao meu redor.

- Olá, Kaya – a garotinha do apartamento à frente me chamou – Encontrou o que procurava?

- Eu... – então eu a olhei – Quantos anos você tem?

- Nove – ela sorriu.

- Então continue com nove, a vida adulta é uma merda – falei e saí correndo para o carro.

Não me lembro de ter dirigido, não me lembro do percurso até o hotel. De repente eu estava no elevador, respirando com dificuldade, sem saber exatamente o que estava sentindo. Scott me esperava no corredor, de frente para o meu quarto.

Quase não consegui abrir a porta, Scott tomou a chave de minhas mãos e abriu, me fez sentar no sofá e sentou-se à minha frente na cadeira.

- Fale. – pediu

- Há algum tempo encontrei um endereço na pasta Pluvia, fui até lá e descobri algumas coisas antigas de Carlos, entre elas uma caixa de cartas que eles trocavam. Parece que ele deixava uma carta lá, ela pegava, e deixava uma. Era uma dinâmica.

- Ok...

- A maioria das cartas eram declarações ou divagações sobre o amor e blá blá blá, Esta carta – peguei a carta em meu bolso – é diferente. Carlos quer terminar com ela, e começa a descrevê-la. Começa a falar de coisas sobre a Rosa que só ele sabia, bem, ele e... Eu.

- Você era próxima dela?

- Eu sou. – respirei fundo antes de falar, pisquei algumas vezes e soltei as palavras com dor - Scott, Carlos estava tendo um caso com Kara.





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