Vermelho

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Na manhã seguinte, retornei a biblioteca. A senhora de olhos negros não estava no balcão e os computadores não estavam sendo disputados. Apenas o silêncio e o mofo permaneciam.

- Ei, Victoria. – uma voz interrompeu o silêncio.

Procurei pela voz, nada.

- Aqui em cima. – falou novamente.

No alto da escada, estava Kaya Portman. Nunca havíamos trocado uma palavra em nossas aulas de Francês. Kaya passava boa parte de seu tempo na biblioteca da escola e agora eu descobriria que ela trabalha meio período na biblioteca da cidade. Acenei em sua direção. Ela desceu cautelosamente cada degrau da escada segurando seus óculos redondos. Kaya prendeu em um coque seu longo cabelo preto e se aproximou.

- Como posso ajuda-la?

- Preciso de alguns livros sobre a cidade para a aula de História Americana.

- Isso será um problema. – ela começa a andar. – Ontem, os três livros mais antigo sobre a cidade desapareceram.

Kaya sobe a escada e caminha em direção as ultimas prateleira, onde o garoto de Sobretudo estava na noite anterior.

- Os livros ficavam aqui. – Kaya encosta na prateira vazia. – Eram grandes e pesados, quem roubaria isso?

Algo em mim acusava o garoto de Sobretudo preto sobre o roubo. Mas por que ele roubaria livros sobre a cidade?

- Algum suspeito? – indaguei.

- Nenhum! E isso me deixa frustrada. – ela levou as mãos à cabeça. – Sobraram apenas esses. – ela aponta para a prateleira seguinte. – Não é grande coisa, mas irá ajuda-la.

Eram quatro livros, pesavam pouco e eram fácil de carrega-los. Passei às três horas seguintes em uma cafeteria lendo sobre a cidade. O cansaço me tomava, eu estava cansada de ler o sobrenome Agostini em todas as partes. Com um gole de café retomei a leitura.

Montanha Agost:

John Agostini foi a primeira pessoa a escalar a Montanha mais alta de Sirius Falls, que mais tarde se chamará Agost. John Agostini, irmão mais novo de Benjamin Agostini, serviu a América na Primeira Guerra Mundial e nos trouxe glória.

Hoje Sirius Falls completa 113 anos desde sua fundação. O dia é comemorado com um baile onde todos vestem roupas antigas e se comportam como se estivesse no ano de 1900 e com isso a cafeteria está vazia.

O lugar a minha frente rangeu tirando a minha atenção do livro. Meus olhos pousaram em Adam que estranhamente combinava o boné vermelho com o moletom.

- História Americana? – ele profere.

Era desconfortante ter Adam me observando. Ele poderia sentar em qualquer mesa da cafeteria.

- Sinto muito por incomoda-la. – Adam se levanta.

- Você não está incomodando. Eu estava apenas... – seus olhos estão atentos em mim. – Por favor, sente-se.

Adam se sentou e apoiou uma perna sobre a outra. Seus olhos ainda me observavam.

- Sim, é História Americana! – levanto um livro em sua direção.

- Sra. Grogan? – ele perguntou e eu assenti. – O trabalho é sobre a cidade?

Sirius Falls havia sido fundada por um Agostini e nada era melhor que ter um Agostini para me ajudar 113 anos depois. Adam passou a tarde tagarelando sobre a cidade, me ajudando com o trabalho da Sra. Grogan.

Ele sorria por baixo do boné.

- Você está perdendo o baile de fundadores. – falei, tomando um gole do meu café que já estava gelado.

- Não é algo relevante 113 anos depois! – ele respondeu, observando algumas pessoas vestidas como antigamente. – A Cada ano que se passa, essa cidade fica mais decaída. – ele voltou seus olhos a mim. – Eu gosto da ideia obsoleta do baile, mas com o tempo eles fizeram disso apenas uma doação de seus malditos dinheiros, onde fingem serem pessoas boas.

Fiquei o observando por algum tempo. Adam parecia diferente, algo parecia ter mudado. Já era tarde, o céu estarás em tons escuros e algumas poucas estrelas se mostravam. Eu precisava ir embora, mas era como se Adam me prendesse a ele. Seus olhos negros intimidadores ainda me obervavam.

- Eu preciso ir! – finalmente falei e me levantei.

- Eu também. – ele disse também se levantando.

Não Adam, eu precisava ir sozinha para casa, precisava fugir de seus olhares. Precisava fugir de você.

- Claro! – foi apenas o que eu respondi.

Caminhamos pelas ruas iluminadas e silenciosas de Sirius Falls. Adam remexeu os bolsos de seu jeans escuro e retirou um cigarro.

- Se importa? – ele perguntou com o cigarro nos lábios e com o isqueiro na mão.

Respondi que não e observei as chamas do isqueiro dourado iluminar parte de seu rosto e em seguida, a fumaça se dissipar. A fumaça do cigarro de Adam é deixada por cada rua que passamos. E como se cada lugar que passássemos, Adam deixasse um pedaço de si.

- Há quanto tempo você fuma? – perguntei com certa curiosidade.

- Acho que faz quatro anos. – responde, após tragar o cigarro. – Está em segurança! – ele falou observando a única luz que se encontrava acesa em casa.

- Obrigada, pela ajuda!

- Era o mínimo que eu podia fazer sendo um Agostini. – ele sorriu e apertou minha mão por alguns segundos olhando-me nos olhos. – Até logo, Victoria Miller!

- Até logo, Adam Agostini!


Seres das Sombras - O ValeOnde histórias criam vida. Descubra agora