Lúgubre

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A escola estava em luto novamente, no momento em que a adentrei alguém tocou o meu ombro e disse algumas palavras fúnebres, de imediato eu não o entendi.

- Meus pêsames. – disse uma garota, ela me olhou e então percebeu. – Você não sabe? Eu sinto muito... Monalisa Ulric. – e em seguida a garota caminhou em passos largos e despareceu no corredor de armários cinzentos.

O armário de Monalisa estava repleto de flores, velas e fotos. Nada daquilo fazia sentido. Por que todos choravam?

Meus olhos encontraram Cameron em seu armário.

- Ei! – ele então voltou seus olhos para mim. – O que aconteceu com Monalisa? – questionei.

Cameron guardou alguns livros no armário que parecia o engolir a qualquer momento, e então suspirou.

- Eu não sei como te dizer isso... – ele se aproximou um pouco. – Aconteceu novamente.

- Não! – eu neguei.

- Monalisa está morta.

Suas palavras me atingiram como um trem. Monalisa não poderia estar morta. Esperei que ela saísse de dentro de alguma sala e dissesse que tudo não passava de uma brincadeira de mau gosto. Mas não aconteceu. Lagrimas escorreram dos meus olhos e então Cameron me envolveu em seus braços.

- Como aconteceu? – minha voz tremulava, eu não conseguia acreditar.

- Foi como a morte de Alicia Foster.

- Pessoas não são facilmente atacadas por espadas.

Lexia e Tom Foster não apareceram. Mais uma vez uma atmosfera melancólica me abraçou e dessa vez ainda mais forte. Cameron parecia distante. A cada hora que se passava mais flores e velas eram depositadas sobre o armário de Monalisa.

- Se você precisar de ajuda, temos uma Conselheira. – todos diziam.

Meus olhos ardiam com a luz que atravessava a janela e as vozes da aula de economia parecia ser ditas em outra língua. Agarrei os livros sobre a mesa e sai pela porta sem olhar para trás.

Caminhei sobre o corredor silencioso e alguém tentou me impedir de sair pela porta.

- Victoria Miller, você não pode... – a porta se fechou atrás de mim e a sua voz não foi mais ouvida.

Caminhei para casa sozinha no inicio de tarde desejando que uma chuva caísse sobre mim, à chuva não veio e eu ainda negava a morte de Monalisa.

Senti o cheiro de torradas sendo queimadas, não era novidade papai sempre as queimava enquanto observava algo através da janela. Seus olhos me observaram por alguns instantes até o cheiro tomarem suas narinas.

- Merda! – ele correu em direção à torradeira.

- Você irá cuidar do caso de Monalisa Ulric, como cuidou do caso de Alicia Foster?

Leonardo cheirou as torradas e em seguida lançou-as na lixeira. Com tranquilidade, colocou novas na torradeira e tomou a xicara de seu café. Sentou-se sobre a mesa e apontou com a mão direita para a cadeira a sua frente. Sobre a mesa havia uma pasta de amendoim e alguns papéis. Sentei-me a sua frente e por alguns segundos eu pude ver um homem pedindo ajuda em seus olhos.

A torradeira avisou que as torradas estavam prontas. Leonardo empurrou um prato em minha direção, passou uma camada generosa de pasta de amendoim sobre a sua torrada.

- Sim. – ele se levantou, e eu soube que ele não diria mais nada.

Quando a noite chegou eu imaginei Tom sozinho no quarto, apenas um feixe de luz iluminava seu rosto, ele chorava, chorava como se lhe arrancassem o coração. Alicia Foster estava morta e agora Monalisa. Devastado, ele se isolou do mundo por dias.

...

Uma leve neblina cobria o cemitério no final de tarde de domingo, deixando-o tenebroso. Caminhávamos entre os túmulos em silencio. Lexia disse que cemitérios lhe davam calafrios. Avistamos ao longe, alguém, sentado à frente do tumulo. Cameron disse sem sombra de duvidas que era Tom Foster.

-... Ninguém disse que seria fácil; é uma pena nos separarmos; mas também não disseram que seria tão difícil... - Tom ficou em silêncio - Ela amava Coldplay. O que vocês fazem aqui?

A voz de Tom estava calma, parecia triste, entorpecida, como se ele estivesse dopado.

- Trouxemos algumas lembranças. - respondeu Lexia.

- Certo, também tenho algumas coisas. - disse ele se levantando.

Lexia deixou um baú envelhecido e sujo de terra - que foi enterrado por elas há dez anos - em cima do tumulo de Monalisa.

Pintamos a lápide toda de cor de rosa e logo em seguida, Tom nos pediu para dizer algo. Entregou uma folha em branco para cada um, e disse que aquela folha de papel eram as nossas cartas fúnebres para ela. E que ela não merecia aquele outro funeral fajuto.

- Estamos aqui para homenagear e honrar Monalisa Ulric. - falou Tom em alto e bom som.

Cameron pediu para começar.

- Meu nome é Cameron Lafaiete. A Monalisa Ulric foi uma garota insuportável, mas ela tinha um bom coração, e no fundo eu gostava dela, podia não parecer, mas nem tudo deve ser demonstrado... Vou deixar a você, Monalisa, um batom rosa choque para combinar com o tumulo e com sua alma, que também devia ser rosa! E se não fosse? Nós a pintaríamos. E uma foto sua e de Lexia do ensino fundamental, que roubei hoje mais cedo do sistema da escola. – ele se retirou cabisbaixo.

- Meu nome é Lexia Raeda. O que a Monalisa foi para mim? Bom, ela foi uma boa amiga, mas também, tivemos nossos altos e baixos. Estudamos juntas desde sempre, mas as suas escolhas nos afastaram. Nossos momentos nunca serão esquecidos, você nunca será esquecida! - lagrimas brotam dos olhos de Lexia. - Falar sobre Monalisa não é uma coisa fácil. - a voz dela falhou. - Desculpa Mona, espero que não esteja ouvindo isso. Mas saiba que eu... Nós nunca te esqueceremos.

Cameron abraçou Lexia.

- Eu sou a Victória Miller. Não conhecia a Monalisa há muito tempo, mas a luz que irradiava dela era contagiante, ela era insana, insensata, desequilibrada e quase insuportável, mas eu gostava dela. Gostaria de ter mais tempo para decifra-la, entende-la. Mas isso não vai acontecer, e a imagem que guardarei de ela é de alguém que era muito feliz e não se importava com a opinião alheia. Iremos sentir a sua falta e das suas crises Monalisa Ulric.

- Palavras fortes. - falou tom. – Bom, irei começar.

- Meu nome é Tom Foster. Monalisa Ulric foi para mim uma grande amiga, um grande amor.

"Querida,

Não houve promessas, mentiras e nem planos, mas houve nós.

Você era os olhos que me faltavam, você era minha guia, meu colírio, meu grau. A perda de um grande amor é avassaladora e dilacerante, daqueles que acabam com você aos poucos. Meu eu externo pode parecer bem, mas meu eu interno esta de luto, um luto que nunca acabará.

Minha querida, nunca nos prendemos um ao outro, nunca te coloquei amarras, alianças ou gaiola, você não gostava disso e, eu também não. Sempre tentei deixa-la livre, deixa-la voar, mas você sempre voltou para me acalmar, dos pesadelos, da vida. Você voou, alçou voo alto de mais, nunca mais voltou. Agora você é livre para sempre. Entregamos-te aos ares, Monalisa Ulric. Seu livro está fechado."


Seres das Sombras - O ValeOnde histórias criam vida. Descubra agora