O Enigma

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Em plena madrugada, Sirius Falls dormia tranquilamente. A chuva caía sobre as ruas e sobre os telhados, e a cidade inteira parecia mais límpida. Pela janela entreaberta o vento noturno entrava, soprando o cabelo escuro da garota que treinava incansavelmente com sua espada. Haviam se passado horas que ela não parava para descansar, horas que o garoto Agostini a observava lutar sozinha. Ele estava preocupado, bom, todos estavam, pois a garota precisaria caçar seu primeiro Ser das Sombras em menos de um mês.

O balançar dos sinos dos ventos despertaram o garoto que pareceu estupefato. Ele caminhou para próximo da janela e procurou por algum monstro ou algo sobrenatural, não encontrando nada, pensou consigo mesmo, que talvez esses sinos não fossem enfeitiçados por Bruxas, para anunciarem a presença das Sombras, talvez fosse apenas historias para as crianças dormirem. Historias ou não, todos os Caçadores se sentiam seguros com esse artefato em suas varandas e durante anos eles ficaram inertes, mesmo com as tempestades que parecem perseguir a cidade.

Adam fechou a janela quando o ar gelado o fez estremecer, e observou o vidro congelar e a sua respiração se transformar em uma nuvem esbranquiçada. Algo estava errado, o inverno havia acabado há semanas. Rapidamente, o garoto se virou em direção a Victoria, que de costas para ele, apenas segurava sua espada e não mais golpeava o ar.

- Victoria? – o garoto sussurrou preocupado.

Victoria Miller parecia em transe quando Adam a tocou no ombro e a virou para si, o garoto pareceu se petrificar ao ver seus olhos inteiramente brancos. Ela estava tendo uma visão novamente e ele não conseguiu entender o porquê, tudo deveria ter acabado no momento da Iniciação.

O garoto gritou pela avó de Victoria e por Laura Allen, que chegaram à Sala de Treinamento como dragões. Adam sentiu a mão gelada como a morte tocarem seu pulso e em seguida um choque invadir seu corpo e a sua visão sincronizar com a da garota:

Um grito de gelar o sangue cortou a noite tranquila e serena do lugar que vislumbravam, e em seguida, observou o brilho de uma fogueira morrer e centenas de Seres das Sombras avançarem e atacarem homens, mulheres e crianças. Os rostos das bestas estavam cobertos por sangue e os olhos eram ávidos e sedentos de caos, atacavam qualquer um que ousasse cruzar seu caminho. Em frações de segundo, Victoria se lembrará de que empunhava uma espada e tentou em vão, golpear um Ogro, por outro lado, na realidade, o garoto a sua frente grunhiu de dor e em seguida caiu sobre o chão, sangrando.

Victoria gritou de desespero quando aquela visão teve fim revelando a realidade a sua frente. Ela havia apunhalado Adam, que soluçava sobre o chão, enquanto seu sangue se esvaia. Não acreditava no que acabarás de fazer, a espada em sua mão respingava. Lançou-a para longe e pode ouvir á lamina se chocar contra o chão, provocando um zumbido estridente. Rapidamente, tampou os ouvidos e pode ouvir algo a mais, quase como um sussurro.

- Victoria Miller, você é como eu...

Horrorizada segurou o ferimento do garoto ensanguentado enquanto se desculpava. A culpa se alastrava como veneno em sua alma, sorrateiramente e dolorosamente. Laura Allen afastou a garota rapidamente enquanto Pedro e Lexia levavam-na para fora, relutando e gritando.

Em sua mente, Victoria Miller negava tudo, aquilo não poderia ser real, deveria ser um de seus sonhos ruins. Ela não poderia ter apunhalado Adam. Sobre o chão do quarto ao lado, ela segurava a cabeça e repetia em voz alta:

- ACORDE! ACORDE, VICTORIA.

Na Sala de Treinamento, Pedro Valentin e Mia seguravam Adam, enquanto Laura jogava um liquido verde sobre o ferimento do garoto que gritava. Queimava como ácido e a dor fazia o desejar morrer. Segundos se passavam e finalmente o corte começava a se fechar e revelar uma grande cicatriz.

O garoto havia desmaiado quando o levaram para um quarto, ele se sentiria cansado e fraco por alguns dias até que o seu corpo voltasse ao normal, até que a magia saísse de seu organismo.

Já havia amanhecido quando explicaram a Victoria que não era a sua culpa ter acreditado naquela visão. Aquilo era Magia Negra, alguém estava tentando mexer com a sua sanidade e ela precisaria ser forte e se concentrar para não deixar ninguém entrar novamente em sua mente.

O sol estava em seu auge quando os olhos do garoto se abriram e ele esticou a mão em sua direção. Ela segurou firme, como se tivesse medo que alguém o levasse embora. Adam a puxou para deitar ao seu lado na cama amarrotada. Cuidadosamente, a garota deitou a cabeça sobre o peito do garoto que soltou um suspiro de dor.

– Eu nunca irei me perdoar por ter o ferido.

- Irá ficar tudo bem, Victoria! – falou, com certa dificuldade. – Não foi sua culpa.

- Eu ouvi em minha mente, um sussurro dizendo que eu sou como Ele. – a garota engoliu em seco antes de dizer mais. – Uma pessoa ruim, Adam. E se eu feri-o porquê uma parte de mim realmente quis?

Adam segurou o rosto da garota sobre as mãos e a olhou profundamente nos olhos, e qualquer resquícios que as Trevas habitavam-na pareceu desaparecer.

- A Victoria Miller que eu conheço, é uma boa pessoa. Ela nunca deixaria uma voz maligna corrompê-la e dizê-la quem ela é! Seu coração é puro e forte.

A garota sorriu timidamente e ele a beijou nos lábios, intensamente. Lá fora, o sol fraco brilhava atravessando as janelas e iluminando o quarto. Juntos observaram as brasas da lareira se apagar.

Quando um trovão seguido de um relâmpago cintilante cortou a noite da segunda pior tempestade que a cidade enfrentará, Victoria Miller reabriu os olhos. Ao seu lado, Adam Agostini lia um livro sobre a luz de um abajur, o garoto parecia intocado por sua espada e nada que viveras há minutos atrás era real.

- Eu tive um sonho ruim...

Seres das Sombras - O ValeOnde histórias criam vida. Descubra agora