Entre as Sombras

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A marca em meu pulso começava a desaparecer ganhando um tom de amarelo esverdeado, aquele dia estava ficando distante, exceto pela mulher que havia começado atormentar os meus sonhos todas as noites. Em um desses sonhos efêmeros, eu descobri o seu nome, Isobel Devereaux. Após o meu inevitável afogamento eu contei a vó Mia sobre os apagões e as visões. Ela não agiu estranho, era como se ela esperasse aquilo.

- Esse chá lhe ajudará a se sentir melhor! – ela disse após entregar-me uma xicara com um liquido escuro.

Quando o liquido escuro e amargo percorreu a minha garganta, tudo pareceu desaparecer inclusive Isobel.

- Ultima chance para desistir. – Lexia falou trazendo-me de volta a realidade, estávamos a caminho da festa de Monalisa.

A casa era grande e moderna. Pessoas perambulavam nos arredores da casa, um garoto vomitava no jardim. Não havia mais como fugir, a barreira mental que me separava das festas e da vida social estava começando a rachar, e logo deixaria de existir.

- Você está pronta Victoria Miller? - gritou Lexia tentando soar mais alto que uma música da Rihanna que tocava.

- Não tenho certeza! - gritei de volta, enquanto subíamos a escada da varanda.

Adentramos a festa e as ondas sonoras quase nos derrubaram para trás. Havia um globo espelhado girando acima de todos e que projetava círculos no chão e nos rostos das pessoas.

- Caramba! Não é que vocês apareceram mesmo! - falou Monalisa, em um tom surpreso.

As pessoas da festa se dividiam em grupos, havia os do porão, de onde exalava o cheiro de maconha, os que dançavam sem parar por toda a casa e os que duelavam em frente ao videogame.

- Alguém quer cerveja? - perguntei.

- Com certeza, eu vou querer. – falou Cameron se lançando em frente ao videogame.

- Cuidado, seu idiota! Esse vaso custa mais caro que seus dois rins! – gritou Monalisa para um garoto próximo a porta. – É do século XIX, não é uma coisa que se encontre no eBay!

A frente de um barril de cerveja na cozinha estava Jackson White tagarelando com os outros garotos do time de beisebol. Seus olhos logo pousaram em mim, e eu instintivamente quis fugir, mas não havia como. Em poucos segundos, ele já estava a minha frente.

- Ei, Victoria Miller! – ele falou lentamente. – Você realmente está aqui?

- É, é o que parece, não é mesmo?- sussurrei desejando que ele não tivesse ouvido.

Seus lábios se contraíram em um sorriso mafioso e eu tive a certeza que ele havia ouvido. Jackson se afastou com o sorriso ainda no rosto.

Quando entreguei a cerveja a Cameron percebi que Lexia havia desaparecido. Eu a procurei nos banheiros e no porão da casa. As músicas que tocavam começavam a latejar minha cabeça e tudo o que eu queria era encontra-la para que me levasse para casa.

Encontrei-me na borda da piscina, meus pés tocavam suavemente a agua enquanto eu observava o céu de muitas estrelas. A porta se abriu e uma lufada de música que até então era quase inaudível foi ouvida.

- Está se divertindo? – Monalisa quis saber.

Junto a Monalisa estava Tom Foster, o garoto usava colar havaiano no pescoço e óculos escuros que lembravam os de John Lennon.

- Sinceramente? – perguntei. – Nem um pouco!

Monalisa sorriu e em seguida, entrelaçou seus braços sobre o garoto, que parecia um tanto triste.

- Esse é Tom Foster! – Monalisa o olhou. – Meu... Meu...

- Nosso relacionamento é complicado! – ele terminou.

Às onze horas da noite eu desisti da festa. A porta atrás de mim se fechou e todo aquele barulho pareceu desaparecer. Fazia uma noite quente enquanto eu caminhava para casa.

Em uma rua escura de paralelepípedos eu ouvi algo, como se fosse um rosnado. Meus olhos procuraram-no. Uma forma grande e escura se escondia nas sombras, seus olhos prateados brilharam com a luz da lua cheia, instintivamente ele saltou sobre mim e em instantes eu estava sobre o chão, minha cabeça doía e a partir daí tudo o que eu me lembro são apenas fragmentos. Seus dentes e sua pelagem escura foram jogados brutalmente para o lado e eu pude ver antes de apagar, uma lamina reluzir e atravessar o animal. Seu rugido ecoou enquanto eu fechava meus olhos lentamente vendo o seu cabelo longo cor da escuridão voarem com a brisa da noite.

- Acorde, Victoria...

E eu despertei com a voz de Isobel Devereaux no momento exato em que pude ver a pessoa que me salvará deixar-me sobre a porta de vó Mia. Havia sangue em sua mão e um ferimento.

- Ei! - minha voz saiu fraca e entrecortada enquanto meus olhos se fechavam novamente.

Quando meus olhos se reabriram já era manhã, o sol atravessava a cortina turquesa da sala de vovó, e ela me observava da poltrona segurando uma xícara pequena com algumas flores pintadas por ela mesma no verão passado. Ela suspirou afastando a xicara dos lábios.

- O que aconteceu com você querida? - a sua voz era tão calma quanto o mar depois de uma tormenta.

- O que era aquilo? – eu me levantei do pequeno sofá e a minha cabeça ainda doía.

- Eu não sei do que você está falando. – ela levou à xícara a boca e assoprou como se estivesse quente.

- Era um lobo enorme, como se fosse um alfa! – eu a encarei nos olhos. – Ele me atacou como se esperasse por mim...

- Não existem lobos em Sirius Falls! – ela colocou fim a conversa. – A bebida deve ter influenciado de alguma forma no que você acha que viu. 

Seres das Sombras - O ValeOnde histórias criam vida. Descubra agora