Era um abrir de olhos, mas era também um respirar. Era um respirar profundo, um encher-se dolorosamente de espaço em busca de ar.
Piscou os olhos mais algumas vezes. Sua cabeça era tudo o que sentia. Era tudo o que era. Cabeça, ar e teto febril.
Engoliu com dificuldade, e a partir daí tudo veio à tona. Estava deitada de barriga para cima, vestida de azul em um pano sem graça, definitivamente mais apropriado para uma toalha. Movimentou os braços e as pernas, e viu que estavam livres; apenas cobertos por um lençol esverdeado.
O resto voltou lentamente, mas voltou com convicção. A testa parecia querer abrir-se ao meio; este foi o retorno da cefaleia. Ela fechou os olhos e desviou a cabeça. Quis puxar a mão em direção ao rosto, mas mexeu-se de leve apenas, descobrindo-se fraca.
A fome a atingiu também, gritando, pressionando para que desse atenção à barriga, que se contorcia com ardor. Um formigamento incômodo nos dedos dos pés também apareceu para dar-lhe as boas vindas.
***
Dalki entrou com pressa no prédio amarelo de quatro andares. Uma construção reta, sem muitos atrativos além das vigas de pedra bruta nas arestas e das janelas envidraçadas, que formavam do lado de fora, todas juntas, um hexágono vermelho em meio a um fundo azul.
Quando o chefe de polícia ladeado por outros três agentes parou na recepção, confuso frente aos possíveis caminhos, um homem calvo vestido de verde aproximou-se depressa.
--- Dalki, não é? Chefe de...
--- Sou eu. --- Cortou ele.
--- P-por aqui, por favor.
O médico os levou na direção das escadas largas e escuras. Subiram até o terceiro andar. Os corredores eram longos, espaçados e, ao contrário das escadas de acesso, bem iluminados, cheios de portas claras e lembretes de que o silêncio era fundamental. As luzes iam ficando mais fracas por onde passavam, acompanhando com desvanecimento os quatro homens e uma mulher que rumavam com passos decididos até a última porta à direita. O médico abriu passagem e, antes de entrar, Dalki virou-se para os outros policiais, apontando para si mesmo com um olhar suficientemente comunicativo.
A janela estava fechada, mas ainda assim o lugar mantinha-se arejado. Dalki sentia-se de forma ambígua ao estar ali; se por um lado tudo naquele local fora projetado para ser agradável, este mesmo objetivo marcava cada móvel, cada lençol, cada canto com estigmas de luta e perigo. Aquele era ou um lugar de morte ou um lugar para não se estar. Entre esses dois havia desesperada resistência, como a que a filha de Hourin visivelmente enfrentara. Os caracóis de seus cabelos estavam espalhados pelo travesseiro verde, e seu rosto maltratado pela doença e pelo pesar acompanhava de maneira pouco graciosa suas madeixas.
--- Eu sei que ele morreu. --- Disse ela, com olhos enlameados.
--- Queremos punir quem fez isso. --- Disse Dalki. --- Queremos saber...
--- Eu vi tudo. --- Interrompeu ela.
Rainha fechou os olhos e fez uma careta de desgosto; Dalki olhou para o médico, que o despreocupou. Foi até uma pequena mesa ao lado da cama, e de lá tomou um minério de seis lados, prateado e opaco, e o quebrou batendo-o na parede com agilidade. Colocou as duas metades perto do pescoço da garota, e uma fumaça cinza começou a subir do interior rasurado das pedras. Ela abriu os olhos, respirando fundo o vapor curativo.
--- Por que não posso usar isso o tempo todo? --- Perguntou ela.
--- Porque precisamos saber se você ainda tem dor de cabeça. --- Respondeu o médico, sereno.
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A Aliança dos Castelos Ocultos
FantasyNa série Controlados, a magia está em todo lugar. Os magos podem alterar os seus sentimentos, os seus pensamentos ou comandar as suas atitudes. Não se pode confiar em ninguém. No primeiro volume da série, A Aliança dos Castelos Ocultos, Heelum está...