Capítulo 41 - Culpa

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Era um abrir de olhos, mas era também um respirar. Era um respirar profundo, um encher-se dolorosamente de espaço em busca de ar.

Piscou os olhos mais algumas vezes. Sua cabeça era tudo o que sentia. Era tudo o que era. Cabeça, ar e teto febril.

Engoliu com dificuldade, e a partir daí tudo veio à tona. Estava deitada de barriga para cima, vestida de azul em um pano sem graça, definitivamente mais apropriado para uma toalha. Movimentou os braços e as pernas, e viu que estavam livres; apenas cobertos por um lençol esverdeado.

O resto voltou lentamente, mas voltou com convicção. A testa parecia querer abrir-se ao meio; este foi o retorno da cefaleia. Ela fechou os olhos e desviou a cabeça. Quis puxar a mão em direção ao rosto, mas mexeu-se de leve apenas, descobrindo-se fraca.

A fome a atingiu também, gritando, pressionando para que desse atenção à barriga, que se contorcia com ardor. Um formigamento incômodo nos dedos dos pés também apareceu para dar-lhe as boas vindas.

***

Dalki entrou com pressa no prédio amarelo de quatro andares. Uma construção reta, sem muitos atrativos além das vigas de pedra bruta nas arestas e das janelas envidraçadas, que formavam do lado de fora, todas juntas, um hexágono vermelho em meio a um fundo azul.

Quando o chefe de polícia ladeado por outros três agentes parou na recepção, confuso frente aos possíveis caminhos, um homem calvo vestido de verde aproximou-se depressa.

--- Dalki, não é? Chefe de...

--- Sou eu. --- Cortou ele.

--- P-por aqui, por favor.

O médico os levou na direção das escadas largas e escuras. Subiram até o terceiro andar. Os corredores eram longos, espaçados e, ao contrário das escadas de acesso, bem iluminados, cheios de portas claras e lembretes de que o silêncio era fundamental. As luzes iam ficando mais fracas por onde passavam, acompanhando com desvanecimento os quatro homens e uma mulher que rumavam com passos decididos até a última porta à direita. O médico abriu passagem e, antes de entrar, Dalki virou-se para os outros policiais, apontando para si mesmo com um olhar suficientemente comunicativo.

A janela estava fechada, mas ainda assim o lugar mantinha-se arejado. Dalki sentia-se de forma ambígua ao estar ali; se por um lado tudo naquele local fora projetado para ser agradável, este mesmo objetivo marcava cada móvel, cada lençol, cada canto com estigmas de luta e perigo. Aquele era ou um lugar de morte ou um lugar para não se estar. Entre esses dois havia desesperada resistência, como a que a filha de Hourin visivelmente enfrentara. Os caracóis de seus cabelos estavam espalhados pelo travesseiro verde, e seu rosto maltratado pela doença e pelo pesar acompanhava de maneira pouco graciosa suas madeixas.

--- Eu sei que ele morreu. --- Disse ela, com olhos enlameados.

--- Queremos punir quem fez isso. --- Disse Dalki. --- Queremos saber...

--- Eu vi tudo. --- Interrompeu ela.

Rainha fechou os olhos e fez uma careta de desgosto; Dalki olhou para o médico, que o despreocupou. Foi até uma pequena mesa ao lado da cama, e de lá tomou um minério de seis lados, prateado e opaco, e o quebrou batendo-o na parede com agilidade. Colocou as duas metades perto do pescoço da garota, e uma fumaça cinza começou a subir do interior rasurado das pedras. Ela abriu os olhos, respirando fundo o vapor curativo.

--- Por que não posso usar isso o tempo todo? --- Perguntou ela.

--- Porque precisamos saber se você ainda tem dor de cabeça. --- Respondeu o médico, sereno.

A Aliança dos Castelos OcultosOnde histórias criam vida. Descubra agora