Capítulo 21 - De Ia-u-jambu a Enr-u-jir

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Jen saiu de casa e trancou a porta vermelha. Olhou para cima, onde o telhado azul podre fazia as vezes de seta. O resto da casa, pequenina e bem moldada, toda bordô em tijolos finos, ficaria vazia por um bom tempo.

Pisou na rua e se concentrou na tarefa. Tinha certeza de que pôs tudo o que precisava na pequena mala gorda. Encaixou-a no fundo da charrete, junto à de Richard, e deixou os braços caírem e balançarem como um pêndulo após o esforço. O céu claro, deixando Roun desimpedido, afastava o frio, trazia pra mais perto a fadiga e mantinha a distância segura a preguiça. Do outro lado da contenda estava o medo; expectativa azul frente ao desconhecido. Distante, mas similar o suficiente para ser confundido com a letargia que desencoraja quem não precisa de fato viajar.

--- Já podem ir? --- Perguntou Christine, aproximando-se com o mesmo divertido olhar de esguelha que sempre lançava a Jen.

--- Desse jeito até parece que você está feliz por se ver livre de mim.

Christine riu enquanto as pressões do abraço se encontravam, fortes.

--- Você realiza um sonho seu e um meu vai junto. Me parece bom!

Jen ficou boquiaberta, e Christine riu mais ainda, travessa. Quando as risadas cansaram, Jen pensou pela mais cansativa das vezes no porte da viagem na qual estaria prestes a embarcar.

--- Eu vou ficar fora por muito tempo.

--- Uma estação?

--- Duas... Se tivermos sorte.

--- Richard é legal. Você vai se divertir com ele.

Kinsley havia aceito a proposta de pesquisa. Financiaria tudo, do próprio bolso. Jen nunca imaginara que levaria a cabo aquele sonho louco; a Universidade nunca a ajudaria. Eram muitos os riscos envolvidos.

--- Ou talvez eu me canse...

Teria todas as despesas pagas: viajaria de charrete até Al-u-tengo, passando por Enr-u-jir, contando com muitas provisões. Teria Richard, o guardião das reuniões secretas, como guia. Lá contratariam um guerreiro do exército da cidade, e então partiriam novamente. Iriam de charrete somente até Rirn-u-jir, a cidade da chuva, na passagem entre as duas Grandes Cordilheiras do Noroeste. De lá abandonariam o veículo e seguiriam pela floresta da região a pé até chegar ao Pântano dos Furturos, onde encontrariam o que procuravam.

Richard se aproximava da charrete trazendo uma caixa cheia até a borda de doces marrons.

--- Não seria uma viagem divertida sem marrom. --- Explicou, causando tristes sorrisos.

--- Boa viagem. --- Desejou Chris, enfim.

--- Obrigado. --- Respondeu ele, ajeitando os novos suprimentos junto ao resto da bagagem.

--- Adeus, Chris.

--- Até mais, Jen. --- Censurou ela. --- Até mais.

Richard subiu na charrete, com Jen fazendo o mesmo pelo outro lado. Christine se afastou quando Richard, com um movimento rápido e decidido, fez os dois yutsis avançarem devagar pela ruela à frente da casa de Jen.

***

Os dois viajantes logo chegaram ao início da estrada que saía para o oeste, circulando o Lago do Meio. Foi no ponto em que o rio de mesmo nome deságua no lago que Ia-u-jambu fora construída. Aquele era o segundo maior lago de Heelum, menor apenas que o Lago Ia do Leste.

Saíram dos muros da cidade às dez da manhã do vigésimo-quarto dia de inasi-u-sana. Ia-u-jambu era a única cidade murada de Heelum. Isso se devia à decisão de proibir os magos: toda vez que alguém de fora entrava na cidade, recebia um lenço vermelho-berrante que deveria ser usado em todos os momentos. Caso algo de anormal acontecesse, qualquer pessoa poderia denunciar o forasteiro, e ele seria imediatamente expulso. Muitas vezes se discutiu o fato de o sistema fazer da desconfiança, prerrogativa, mas tempos de desespero exigem medidas drásticas. A cidade sempre foi consciente do preço das medidas, e sempre esteve disposta a pagá-lo.

A Aliança dos Castelos OcultosOnde histórias criam vida. Descubra agora