Lamar estava correndo desesperadamente por entre galhos, folhas e raízes. Conhecia aquela floresta. Era sem dúvida a Floresta dos Oniotos, em Kerlz-u-een. Cortava com suas passadas descoordenadas uma névoa que encobria o lugar, iluminada por uma luz verde sem origem definida. Tudo o que ele podia ouvir era o som da própria respiração ofegante. Corria de um inimigo que sabia estar atrás de si; cada vez mais próximo, cada vez mais rápido. Sabia que não poderia escapar dele, mas mesmo assim corria.
--- AGUENTA FIRME, LAMAR! AGUENTA! --- Berrava Kerinu. Estaria correndo ao seu lado ou atrasando o caçador?
Para onde estavam indo? Aonde aquele caminho os levaria?
Lamar foi atingido. Olhava para frente e, logo depois, viu-se caindo como se o tempo passasse mais devagar. Algo acertara seu joelho direito, e a dor era intensa; berrando e gemendo assim que caiu no chão, viu que recebera uma flechada. O sangue escorria rapidamente pela canela. Nervoso e sentindo uma excruciante dor a cada mínimo movimento, chamava por ajuda, mas Kerinu parecia ter ido embora --- ou estava morto.
Então alguém se aproximou. Lamar sabia quem era. Era o atirador arqueiro. O predador de quem fugia. Aproximava-se com cruel demora, pisando nas folhas espalhadas pela terra. Juntando o resto de suas forças, levantou o pescoço o quanto pôde para tentar olhar para seu nêmesis. Viu a si mesmo.
Sentou-se na cama num pulo, o coração batendo forte, o suor abundante dando motivo para arrancar a coberta levemente esburacada de cima da perna. O quarto do casal era escuro, e apenas duas coisas traziam um pouco de claridade para dentro do cômodo se as janelas estivessem fechadas: o minério azul da cozinha e o sol. O minério sempre brilhava por debaixo da porta enquanto dormiam. O sol, por outro lado, os despertava. Sua luminosidade estava ainda tímida na altura do peito deles; o horário perfeito para acordar era quando ela alcançava os olhos de Lamar. Mesmo antes disso acontecer, Myrthes não estava mais na cama.
Deitando de novo, Lamar começou a pensar com mais calma no sonho que tivera. As imagens já se desgastavam, fugidias, mas ele sentia ainda o medo apertando-lhe a mente. Lembrava de ter visto Kerinu, seu amigo de Kerlz-u-een, alorfo desde tempos imemoriais e irmão de Myrthes. Lembrava de ter visto a si mesmo.
Ouviu vozes. Uma era certamente de Myrthes, mas a masculina era muito diferente da do filho. Será que sonhara com Kerinu porque ele estava ali? Improvável... Tentou ouvir mais alguma coisa, mas o silêncio imperou novamente.
Levantou-se e, cuidadoso, abriu a porta do quarto. Viu Horacil em pé em frente aos armários da cozinha. Myrthes estava sentada no banco, à mesa, tomando chá com as pernas cruzadas e o rosto sério. Lamar olhou para o primo, que lhe devolveu o olhar por apenas um instante, voltando a olhar para baixo.
--- Bom dia, Horacil.
--- Bom dia, Lamar. --- Respondeu.
--- E... Tem alguma coisa errada? Aconteceu alguma coisa?
Myrthes levantou os olhos para Horacil, que coçou a nuca.
--- Lamar, eu... A gente está se mudando.
Lamar estancou, sem expressão.
--- Mas... Como, ou...
--- O barco sai às cinco. A gente vai pra Den-u-pra.
Era como receber outra flechada.
--- Então é lá que... O pai e a mãe estão?
--- Não sei, Lamar, a gente agarra a oportunidade que pode! --- Horacil falava misturando defesa à súplica, com os ombros arqueando à proporção das sobrancelhas.
--- Oportunidade de fugir de mim...
--- As notícias estão se espalhando... Logo todo mundo vai saber que você é um alorfo e está ensinando magia. A gente não pode arriscar... Nem você podia, tendo filho pequeno desse jeito...
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A Aliança dos Castelos Ocultos
FantasíaNa série Controlados, a magia está em todo lugar. Os magos podem alterar os seus sentimentos, os seus pensamentos ou comandar as suas atitudes. Não se pode confiar em ninguém. No primeiro volume da série, A Aliança dos Castelos Ocultos, Heelum está...