Byron examinava de pé a cena do atentado, trazendo no corpo a capa laranja que usava para se orgulhar de sua tradição. Naquele dia, entretanto, ostentava um semblante de alguém que tinha poucas coisas valiosas na vida --- e observava, em silêncio, as cinzas de uma delas. Na cela estavam duas metades de uma esfera de bronze. Tornero voltava da cela de Lamar, tendo visto que ele não estava lá.
--- Ele teve ajuda...
--- Não diga! --- Disse Byron, sem tirar os olhos do mineral quebrado. --- O que vai me dizer depois, Tornero? Que o policial foi iludido por este minério na madrugada de ontem?
Tornero calou-se, juntando as mãos à frente do corpo. Percebia, disfarçando neutralidade, o olhar de exaustão que Byron lhe lançava com o canto do olho.
--- Pensei que os policiais dessa cidade fossem menos estúpidos...
--- Cuidado com as palavras, parlamentar. --- Disse um homem de uniforme policial que entrava no vão central do lugar.
Ele andava com determinação tal que seu rosto parecia uma extensão das rígidas pernas e dos fortes braços. Byron manteve sua posição, olhando com curiosidade para o --- observaram imediatamente os magos --- homem comum que entrava no cenário da fuga.
--- Quem é você?
--- Sou o chefe de polícia de Prima-u-jir, e digo que...
--- Nome, chefe de polícia. --- Interrompeu Byron. --- Eu quero um nome.
O homem de grossas sobrancelhas escuras olhou por um instante para Tornero, que não ousaria se intrometer, e voltou-se para o político novamente.
--- Meu nome é Francesco. E nós somos policiais, pagos para cuidar da cidade, não dos seus presos particulares.
--- Policiais são homens e mulheres que devem fazer um trabalho bem feito e saber onde são seus lugares.
Byron caminhou tranquilamente em direção a Francesco, que desviou o olhar ao perceber o aumento na própria temperatura; sua pressão disparara, descontrolada. Byron se perguntava, por diversão, se precisaria ser um mago para causar aquele tipo de efeito --- se não conseguiria apenas por sua autoridade e figura deixar o policial arisco, dotá-lo de passos vacilantes, enredá-lo em indecisão e temeroso respeito.
--- A policial de ontem viu alguma coisa?
--- Não. --- Respondeu Francesco, de cabeça baixa.
--- Ela não viu nada. Nem um vulto sequer.
--- Não.
--- Não ouviu um nome.
--- Não.
A resposta com ênfase atacou os nervos de Byron, que teve vontade de causar alguma espécie de agudo desconforto naquele homem abusado. Mas, entendendo que a resistência faria parte da cooperação, controlou-se.
--- Você entende que uma grave falha de segurança aconteceu aqui, Francesco?
O policial concordou com um balanço enérgico de cabeça. Byron o acompanhou mais lentamente.
--- Devemos pegar o prisioneiro de volta, não?
--- Sim.
--- Posso esperar por sua cooperação? --- Perguntou Byron, amigável.
--- Sim.
--- É claro. Tornero, alguma ideia de quem poderia ajudá-lo?
--- Creio que ele tenha ajudantes o suficiente, mestre.
--- Estava falando de Lamar.
Tornero piscou com veemência por um segundo ou mais.
--- Ele veio para a cidade depois de viver em Kerlz-u-een. Trouxe uma companheira e um filho.
--- Quem são eles?
--- Já perguntei. --- Tornero respirou pesadamente, fazendo um sinal impaciente para o chefe de polícia. --- Para eles. Quando chegamos com Lamar, dei ordens para que ninguém o visitasse... A mulher e a criança tentaram, mas foram impedidos. --- Voltou a olhar para o mestre, dando de ombros. --- Como não entraram, ninguém registrou nomes.
--- Ontem --- disse Francesco --- houve uma visita, mas nenhum dos policiais que estavam na guarda fizeram o registro. E-eu não sei o que aconteceu. Nós sempre fazemos registros.
Byron balançou a cabeça um pouco menos energicamente antes de voltar a olhar para o minério. Francesco, como se acordasse em um susto, olhou para os pedaços perfeitamente curvos da pedra e os juntou do chão.
--- Quem fez isso tinha acesso a minérios como este. --- Raciocinou Byron, andando pela cela. --- Também atacou policiais. Se a mulher de Lamar veio até aqui com o filho, não se arriscaria a tanto.
--- E isso foi há dias.
--- Não eram as mesmas pessoas. --- Completou Francesco.
--- Muito bem... Pode ir, Francesco.
O policial quis que sua despedida fosse profissional, salpicada com obstinada vontade de fazer um bom trabalho, mas pareceu antes uma comemoração para a sorte que teve de poder ir embora.
--- O que eu penso --- explicou Byron enquanto adentrava, seguido por Tornero, o corredor da área de celas --- é que Lamar fez amigos em Kerlz-u-een. Outros alorfos.
--- É provável.
--- Esse amigo veio ao resgate... E agora já está longe demais para nós. Mas você, Tornero, vai ver onde a família de Lamar está. Quero os nomes deles. E se eles não estiverem aqui, você me avisará.
--- O que você vai fazer?
--- Faça o que eu disse, Tornero.
--- Eu farei, mas preciso saber onde você vai estar, mestre.
Byron assentiu, com a mente distante.
--- Procure por mim no Parlamento.
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A Aliança dos Castelos Ocultos
FantasiaNa série Controlados, a magia está em todo lugar. Os magos podem alterar os seus sentimentos, os seus pensamentos ou comandar as suas atitudes. Não se pode confiar em ninguém. No primeiro volume da série, A Aliança dos Castelos Ocultos, Heelum está...