O sol se punha de maneira sempre igual, cena reprisada a cada dia aberto. O abraço que unia Tadeu a Amanda parecia igual no que tocava à mecânica do movimento, em que um braço vai por lá e o outro por ali. Os dedos se arrastam enfim pelo tecido que separa as peles, e se acomodam quando os músculos ou os ossos se anteparam, e não há mais como apertar ou para onde ir. Dessa vez, tanto um quanto o outro sabiam o que dizia cada batida descompassada de coração; o que significava o afastamento mais ligeiro, o beijo mais curto, a mão trêmula que há rosanos já não tinha o hábito de tremer. Afinal, mesmo nos mais idênticos fins de dia as nuvens garantem que nenhum pôr-de-sol seja igual a outro.
Sabiam que não podiam falar nada, e o eco dessa regra repelia olhares ansiosos. Sabiam, na verdade, que sequer poderiam se encontrar, mas ver um ao outro era tudo pelo que esperavam todos os dias. Uma das coisas que mais incomodavam os aprendizes de mago era justamente que precisavam vir, nem que fosse para cancelar encontros futuros --- embora isso significasse cancelar muito mais do que meras reuniões.
--- Como... E-estão sendo as aulas? --- Perguntou Amanda.
Tadeu suplicou pelo semblante que ela não fizesse aquilo. Ela entendera a mensagem.
--- Isso é tão injusto...
--- É, eu... --- Ela começou, embarcando na fracamente expressa rebeldia dele. --- Eu não preciso saber o que você faz, mas... Por que a gente não pode nem se ver?
Continuaram de pé, os dois com as mãos nas do outro.
--- E agora? Eu não posso deixar de te ver. Não posso...
Lágrimas desciam pelos rostos de ambos. As mãos se apertaram mais.
--- Meu pai disse que... Que não podíamos ficar juntos porque todo mundo ia desconfiar da gente. Nós somos muito jovens...
--- Ele sabe?! --- Interrompeu Amanda, apavorada.
--- Não --- emendou Tadeu --- mas quando ele me explicou por que ele não queria me ver perto de você, ele disso isso.
Amanda torceu os lábios.
--- Por que isso é importante agora?
--- Bem, eu... Estava pensando... Talvez isso quer dizer que quando formos mais velhos... Talvez possamos ficar juntos. Quando acharem que nós vamos nos controlar melhor e...
Amanda puxou Tadeu para perto e o beijou. Ele reagiu lentamente, passando a beijá-la depois de um tempo de estupor, tomado pela boa sensação dos lábios mornos dela. Não sabia se ela sorria ou se desesperava; não sabia se havia pensado em uma solução que não envolvesse paciência, segredos e riscos.
--- A gente vai consertar isso. --- Sussurrou ela ao se separar dele.
Tadeu suspirou pela boca, esperando ter um dia a mesma confiança.
--- Eu estava pensando também... --- Recomeçou ela. --- Você sabe que de vez em quando eu... Pensava em ser médica, lembra?
--- Sim. E eu achava que a gente tivesse que escolher entre ser mago ou ser outra coisa.
--- É, eu também.
--- Como se ser mago fosse uma profissão, que...
--- ... Que você tivesse que fazer só isso! --- Completou ela.
--- Uhum.
--- Bem... --- Amanda parou, olhando para a boca de Tadeu. Ele sabia que ela, na verdade, selecionava palavras com especial cuidado. --- Eu posso ser médica... E ser maga vai ser bom porque eu vou... Poder...
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A Aliança dos Castelos Ocultos
FantasyNa série Controlados, a magia está em todo lugar. Os magos podem alterar os seus sentimentos, os seus pensamentos ou comandar as suas atitudes. Não se pode confiar em ninguém. No primeiro volume da série, A Aliança dos Castelos Ocultos, Heelum está...