35- Como lágrimas na chuva

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Um dia enevoado se levantava sobre Belém. Mesmo os dois já tendo traçado mentalmente o plano para irem até a casa de Paulo, os dois pareciam relutantes para se levantar. Por fim Tomás ficou de pé, foi até a área destinada como banheiro e ficou pensando como seria o trajeto enquanto se aliviava.

- Pronto?- Tomás perguntou quanto retornou até onde Paula estava.

- Acho que ontem eu estava bem mais que hoje – Paulo disse e sorriu penosamente.

- Me sinto da mesma forma – Tomás disse olhando a avenida pela janela, dois mortos vivos caminhavam lentamente pela manhã abafada.

- Já temos tudo o que precisamos para chegar até minha casa. Mas também tenho medo do que eu posso encontra – Paulo disse.

- Sei como se sente. Fiquei refletido sobre isso. Enquanto estamos aqui, há a possibilidade de que nossos parentes ainda estejam vivos. Mas se nós chegarmos lá e não encontrarmos nada, o que fazemos?

-É o risco que temos que correr. É melhor encarar a realidade do que se esconder por trás de uma cortina de incertezas - Paulo falou.

- Confesso que até hoje tinha encarado essa droga toda com outros olhos. Mas a perceptiva de não ter mais ninguém de minha família vivo é algo enervante – Tomás disse ainda olhando para fora. Paulo falava e observava o jovem.

- Fico pensando se foi algum filho da mãe que provocou tudo isso, ou se foi um acidente. Se foi algo pensando, nem sei o que faria aos autores desse inferno – Paulo falou apertando os punhos até os nós de suas mãos ficarem brancos.

- Teria que ter sido um plano bem estúpido isso tudo. Pois pensa só. Quem ganharia com uma coisas dessas? Mesmo as guerras que foram provocadas ao longo das eras foram motivadas por um lucro mais na frente. Mas uma epidemia dessas onde ninguém está seguro. Que lucro poderia haver?

- Sabe filho. Já vi muito nessa vida, e já também fiz muita coisa buscando lucro. A possibilidade de lucro fácil cega as pessoas. Quantas pessoas não foram mortas antes dessa merda toda ter sido jogada no ventilador simplesmente por causa do lucro? O que é pior alguém que mata outras pessoas por causa de um celular, ou um morto vivo que tira a vida de uma pessoa?

- Acho que no fim o ladrão do celular é ainda mais bestial do que esses mortos vivos. Pois o ladrão tem consciência do que está fazendo – Tomás falou olhando para Paulo.

O silêncio tomou os dois de assalto.

Paulo usando as ferramentas que obtera fazia melhorias em seu bastão, colocando novos objetos perfurantes.

- Você está ficando obcecado por essa coisa sabia? – Tomás falou.

-Sei sim. Essa beleza que tem me livrado da morte. É o mínimo que posso fazer.

- Só não vá se machucar com isso. OK?

- Pode deixar. Depois de tudo o que já passei não acho que eu vá virar uma daquelas criaturas de forma tão estúpida.

- Acho bom mesmo. Pois de outra forma irei dar cabo de você com essa sua arma mesmo.

- Por favor faça isso – Paulo disse.

Depois os dois em silêncio e vagarosamente, como dois espartanos antes de uma batalha, pegaram todos os pertences que poderiam levar e os guardaram em suas mochilas.

- Eu já estou pronto – Tomás disse.

- Eu também estou.

- Então eu acho que é isso.

- É sim, para o bem ou para o mal, é aqui que nossa vida vai mudar. Obrigado Tomás por ter me recebido, mesmo sem em conhecer.

- Fica tranquilo cara, confesso que foi uma honra poder estourar a cabeça desses malditos do inferno ao seu lado. Chegou até a ser divertido.

- Divertido?

- Ah, vai dizer que não foi?

- De certa forma, mas eu não diria divertido. Estimulante talvez? Mas não divertido.

- Acho que tem razão.

Com as mochilas em costas e conduzindo suas bicicletas os dois deixaram o seu abrigo e se dirigiram até a avenida.

Mesmo já perto do meio dia, o sol ainda mostrava-se tímido, tingido de chumbo.

- Acho que vai chover – Tomás disse.

- Também acho. Só não sei se isso é bom ou ruim.

- Acho que pode nos ajudar, ficamos mais camuflados sob a chuva do que sem ela.

Tomás começou a pedalar, mas suas pernas estavam tão pesadas como dois blocos de concreto, e tropegamente ele foi avançando.

- Tem certeza que sabe andar de bicicleta? – Paulo perguntou mais atrás.

- Claro sei, é só a falta de pratica.

- Se você diz.

Com o pedalar suas pernas ficaram mais leves, o medo foi diminuindo e Tomás já pedalava com mais velocidade.

- Vai com calma aí – Paulo disse.

Eles passaram por um grupo de quatro mortos vivos que inutilmente tentaram segui-los, porém logo desistiram, pois mesmo as bicicletas não andarem tão velozmente quanto um carro ou uma moto, eram ainda assim mais rápidos que as pernas bambas dos mortos vivos. Um deles caiu e levou mais dois consigo ao chão.

Mais rápido do que eles pensaram no pricípio percorreram uma boa distância.

Meia hora após o inicio da saída deles foram assustados por um forte barulho, um trovão ecoava acima no céu. Tomás parou para falar mais calmante com Paulo.

- Continuamos?

- Sim, já percorremos uma boa parte do caminho, só tome cuidado se realmente começar a chover, e não fique longe demais de mim, entendido?

- Sim, entendi.

- Se a chuva ficar pesada demais não poderemos enxergar muitos metros a frente de nós.

- Quer tomar a dianteira agora que estamos mais perto?

- Quero sim. Vamos agora, há três mortos vivos vindo cara cá.

Os dois seguiram serpenteando por entre os carros, caminhões e ônibus parados sobre a avenida.

Mais um trovão preencheu o céu da cidade, e grandes gotas de chuva começaram a cair sobre o dois sobreviventes. 

Tomás então lembrou de algo.

Todas essas lembranças se apagarão com o tempo, como lágrimas na chuva. 

Ele então sentiu seu rosto esquentar por um breve momento. 



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