50 - Não espere menos

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Sobreviventes de Belém


- Espero que esse maldito seja o último – Kára disse tirando sua lança da cabeça podre de um morto-vivo.

O interior da loja era abafado. E o cheiro dos produtos químicos que incomodavam Kára.

Eles já estavam lá dentro há dois dias e ainda encontravam mortos-vivos lá dentro. Eles se perguntavam se poderia haver alguma porta aberta lá que possibilitasse a entrada deles. Pensando assim eles decidiram procurar a possível abertura, entretanto ainda não haviam encontrado nada. Todas as portas que examinaram estavam trancadas. O medo crescia.

Kára limpou o suor que se formava em sua testa com as costas de sua mão. Tomás lhe ofereceu uma das últimas garrafas de água de que dispunham. A jovem pegou o frasco e com placidez tomou o líquido. Tomás a observava, um fio do líquido caiu do lado direito da boca de Kára e seguiu caminho até seu pescoço.

- O quê? – Ela perguntou para Tomás, ele enrubesceu. Pensamentos confusos estavam povoando a mente dele. Entretanto ele sabia que não passavam de bobagens. Todos corriam risco de morte, logo pensar algo assim era uma coisa estúpida. Extremamente estúpida.

- Nada, não – Ele respondeu fingindo examinar uma prateleira que continha laminas circulares.- Isso pode ser útil.

- Acho que sim – Kára falou, analisando o comportamento estranho de Tomás. Sua sobrancelha direita esta erguida.

- Vamos até o outro lado? – Tomás perguntou tentando disfarçar seu constrangimento. Agora era ele quem suava.

- Você não acha que pode fazer uma arma melhor pra você com as coisas que tem aqui?- Kára perguntou.

- Ele tem sido efetiva até agora.- Ele ergueu seu bastão.

- Mas tudo pode ser melhorado.

- De fato. E qual é da lança? Você também pode conseguir algo melhor aqui não?

- Por que eu trocaria ela? Ela é leve – Ela fez movimentos no ar com sua arma- E posso atacar de uma distancia segura, coisa que seu bastão não pode fazer.

- Meu bastão proporciona força e letalidade.

- Mas também pode ser um fator de contaminação.- Kára olhou com suspeitas para os pregos e parafusos que saiam da arma de Tomás. Fragmentos de mortos-vivos estavam grudados em vários pontos da arma.

- Você tem razão- Tomás disse constrangido- Você acha de devo usar uma lança como você? Suponho.

- Por que não?

- Já que nosso grupo aumentou, poderíamos fazer a coisa certa. Temos mais chance de lutar contra uma horda desses desgraçados se tivermos armas diferentes. Para podemos nos defender de qualquer tipo de ataque.

- Isso é uma boa ideia.- Kára seguia agora mais à frente.

- Como em um medicamento- Kára disse- Sua ideia é juntar diferentes elementos para alcançar um determinado fim. Estudamos isso lá na faculdade.

Kára encolheu seus ombros.

- Você não acha tudo isso uma droga?

Tomás foi surpreendido pelas palavras dela.

- Eu tinha sonhos- Kára continuou com a voz embargada. Tomás via apenas as costas dela.

- As coisas na nossa sociedade não iam lá tão bem assim- Kára continuou – mas alguém tinha que jogar a droga no ventilador?- Ela olhou pra Tomás, seus olhos estavam vermelhos.

- Sinto muito - Foi a única coisa que Tomás conseguiu dizer. Kará deu um fraco sorriso.

Silêncio.

- Mas as coisas podem melhorar não?- Tomás falou de alguns segundos- Você mesmo disse agora há pouco.- Ele sorria também.

- Podem sim – Kára disse- podem sim. Mas como serão  as coisas depois que esse inferno passar? - A pergunta ficou no ar.

*

- Aqui está limpo – Tomás falou depois de patrulharem a ala leste. - Vamos voltar?

- Vamos sim- Kára disse- Paulo deve estar preocupado com nossa demora.

Paulo estava se recuperando bem de sua queda, Kará lhe medicava todos os dias, e lhe perguntava frequentemente sobre seu estado. Na primeira noite ele teve febre muito alta e havia preocupado seus dois amigos que não dormiram quase nada preocupados. Entretanto mesmo com a melhora, o homem ainda era pouco útil na patrulha do local. E isso lhe incomodava demasiadamente. Ele e Tomás tiveram uma forte briga, pois o jovem havia dito que somente ele e Kará iriam fazer a ronda, o que Paulo se opôs veementemente. Por fim ele acatou o que seu amigo falara. Então ele ficava repousando enquanto os dois jovens vasculhavam o interior da loja.

*

- MAS QUE DROGA!- Tomás xingou, e correu até onde seu amigo estava. Perto do homem um corpo jazia no chão. Um dos mortos-vivos havia escapado da ronda dos jovens e havia alcançado Paulo.

- Você está bem? – Kará perguntou, depois de correr aflita até o homem.

Com um largo sorriso Paulo disse que estava bem a despeito da sujeira que ele havia feito ao matar a criatura.

- Como ele conseguiu chegar até aqui?- Tomás perguntou com a sua mão direita sobre sua testa.- Viemos desde a ala leste e limpamos todo o perímetro, que droga. Como isso pôde acontecer?

- Calma- Kára disse.- Paulo está bem isso que importa.

- Mas ele poderia não estar!- Tomás falou mais alto do que gostaria.

- Calma garoto- Paulo disse- Estou bem, e acho que sou bem grandinho para tomar conta de mim mesmo.

Tomás olhou preocupado para o homem.

- Já enfrentamos coisas bem piores- Paulo falou- ou será que você esqueceu? Um só deles nem chegou a me fazer suar.

- Está bem- Tomás falou por fim.- Mas não iremos mais demorar em nossas rondas.- Acho que dever haver alguma abertura pela qual esses desgraçados estão entrando. Precisamos encontrar logo essa fenda.

- Como está sua perna?- Kára perguntou, tirando Tomás do caminho se aproximando de Paulo.

- Está bem – Paulo mentiu.

Kára olhou séria para o homem.

- Ok,ok – Paulo disse rendendo-se diante do olhar acusador da jovem- Começou a doer novamente com o esforço que fiz.

- Paulo- Kára disse cansada.

- Eu vou ficar bem. Já estou melhor, você sabe.

- Tome isso – Ela falou depois de pegar um comprimido de sua mochila.

- Você não se cansa de me entupir dessas coisas não é?- Paulo falou zombeteiro.

- Acho que você deveria ser mais grato a ela- Tomás disse.

- O quê é isso? Estão de complô contra mim?

Tomás e Kára olharam sérios para o homem, porém não conseguiram conter o riso diante do humor de Paulo.

- É bom ficar bom logo velhote- Tomás falou-  Ainda precisamos ir até a sua casa.

O semblante de Paulo ficou carregado.

- Muito obrigado por tudo- Paulo disse- sou devedor aos dois.- Seus olhos estavam toldados por lágrimas.

- Somos seus amigos velhote- Tomás falou- não espere menos de nós.


The Walking Dead Sobreviventes do BrasilOnde histórias criam vida. Descubra agora