Letreiro neon de motel

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Caneta e papel: eu não me importaria de tê-los agora. Talvez um giz de cera rosa também, alguns tons de lápis de cor amarelo e azul, uma borracha, grafite... Talvez a folha sem pauta. É, os retratos sempre ficam melhores sem as linhas cortando uniformemente.

Lennick levou o cigarro aos lábios e tragou calmamente, logo soprando a fumaça acinzentada para cima, que subiu se espalhando pelo ar, enquanto eu contornava seu perfil em minha mente.

Oh, como eu o amava! Por Deus, como eu o amava e o que eu não faria para poder tê-lo junto aos meus lábios! Ele, que há tanto tempo eu desejava: cigarro. Oh, Deus, como eu queria ter um pouco de nicotina, só um pouquinho, para me acalmar!

– É, hmm... - hesitei por não saber ao certo como pedir – Será que... Sabe? Será que você pode... Hmm... - apontei para sua mão.

O garoto ergueu uma sobrancelha e olhou para o bastão nos próprios dedos.

– Você... Quer um cigarro?

Balancei a cabeça afirmativamente, já até ansiando.

Lennick enfiou a mão no bolso e me estendeu seu maço, logo pegando o isqueiro laranja de plástico e me ajudando a acender meu câncer. Na hora que suguei a fumaça e senti-a preencher meus pulmões com calor, a tranquilidade se espalhou pelo meu corpo, da cabeça à ponta dos dedos. Fechei meus olhos aproveitando a sensação, mesmo que numa das pequenas saletas escuras do meu cérebro ecoasse a frase "você é viciada também".

– Não sabia que você fumava.

Dei de ombros.

– Acalma mais que chocolate.

– Michael sabe disso?

Abri apenas um dos meus olhos para ver a cara do garoto pela visão periférica. A quê vinha isso agora?

– E por que ele deveria saber?

– Não quis dizer isso - deu uma leve risada antes de voltar a falar – Não é que ele tenha que saber, é que ele odeia cigarros, então sempre faz aqueles discursos e sermões sobre como isso faz mal à saúde. Por isso viemos até aqui. - falou apontando para os brinquedos em volta na praça.

Lenny terminou o próprio cigarro e jogou a bituca no chão de areia, pisando com a ponta do tênis. Nós estávamos sentados nos balanços infantis, apoiando nossas mãos e cabeças nas correntes metálicas grossas.

– Então apenas me usou como desculpa para sair e fumar escondido?

O garoto riu. De novo. Ele ria demais para o meu gosto.

– Na verdade acho que eu usei o cigarro como desculpa para vir aqui com você... - falou piscando lentamente seus enormes cílios que rodeavam os olhos azuis.

Era como estar num filme clichê adolescente, e esta seria a parte em que eu me apaixonaria por um dos maiores babacas bonitos da escola e descobriria que ele não era tão babaca quanto eu julgava. Tudo ia conforme o roteiro, apenas com leves mudanças, como o fato de eu não estar apaixonada por Lenny nem ele por mim. Ah, claro: e ele não era um dos maiores babacas da escola; ele era O maior babaca da escola.

– Valentina?

– Babaca! - falei por impulso a palavra que estava na minha mente, sem nem saber por quê ou a que, piscando para me situar.

No mesmo instante em que pronunciei o feitiço mágico, a cara do loiro se fechou como um tornado. Revirei meus olhos.

– Ah, qual é?! Saiu sem querer. Não é possível que uma coisa tão besta assim possa machucar tanto seus sentimentos!

Guia Prático Para Um Suicídio De ÊxitoOnde histórias criam vida. Descubra agora