O punk está morto

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Entediada. Sozinha. Irritada. Essas três palavras definiam bem a minha maldita quarta-feira em casa. Se ser uma quarta-feira por si só já não fosse motivo bastante para me fazer derreter de tédio e fundir com a mobília, eu ainda podia contar com outros incríveis fatores que me levariam ao coma certeiro:

1- O fato de que Scarllet não foi à aula nenhum dia até agora,o que me leva a 2- o fato de que meus band-ainds de super heróis estarem acabando, o que me levará a 3- ter que usar o curativos do Nemo que ganhei do babaca, que por fim me leva a 4- o fato de Lennick não ter me procurado nenhuma vez desde que eu lhe dissera umas boas verdades na farmácia.

Estar sozinha em casa num sábado a tarde com o estoque de Cigarro&Chocolate's zerado e terminantemente sem amigos já seria ruim o suficiente, mas ter Rage Against The Machine como trilha sonora do meu sofrimento com certeza não estava ajudando em nada. Não que Rage Against The Machine fosse ruim; longe disso! Mas era que o meu momento de sofrimento pedia por algo mais agoniante e triste. Algo como Lana Del Rey em toda sua gloriosidade.

Cruzei os braços irritada com a batida nada melodramática que entrava pelas janelas. Se ao menos eu tivesse algum lugar para ir e reclamar de todos os seres humanos vivos na Terra...

Mas eu não tinha. Há uma semana atrás eu teria, mas agora, não mais. Antes eu tinha a boa e velha farmácia de Mike, mas agora não ousaria dar as caras até o fim dos meus dias. Não depois de tê-lo mandado catar coquinho por suas boas intenções em fazer com que eu e o babaca de seu primo fizéssemos as pazes. Pobre Mike, sempre tão ingênuo, sempre tão tolo! Eu nem sequer conseguia culpá-lo por esperar que eu e o abutre hollywoodiano nos entendêssemos com tanta facilidade, visto que seu primo tinha a horrível habilidade de me fazer ceder pelo cansaço. Além do mais, Mike não sabia da punhalada que eu havia levado nas costas.

Mike, na verdade, não parecia ter a menor ideia de que tipo de pessoa era seu primo. Lennick era um babaca, e isso era assim desde o ensino fundamental: ele atacava os mais fracos nos pontos mais fracos. Uma boa tática de guerra, devo admitir, mas também cruel demais. As garotas com quem ficava: ele contava com detalhes para a sala toda. Os garotos tímidos da escola: ele zombava e ria. Até mesmo sobre o melhor amigo: ele me revelara o grande segredo de Patrick.

Se ele teve coragem de trair o idiota sanguessuga que chama de melhor amigo, como pude eu achar que não faria o mesmo comigo? Como fui idiota!

Amassei minha cara contra uma almofada vermelha e gritei o som abafado do puro ódio. De Patrick, de Lennick, de mim. Imaginei quanto tempo levaria até que todos na escola soubessem do meu problema com cachorros... Larguei a almofada um pouco babada no sofá e subi para o meu quarto, apenas para calçar os velhos All Stars e colocar uma blusa fina de manga comprida. Estava quente, mas meu traje era sempre o mesmo: manga comprida.

Depois sai de casa a passos rápidos, nem sequer parando enquanto mostrava os dedos do meio em direção ao muro mostarda de onde vinha a parte sonora da minha irritação.

- O PUNK ESTÁ MORTO! - gritei em direção a casa de meu vizinho, embora provavelmente não tenha sido ouvida sob a música alta.

Enquanto caminhava pela calçada eu pensei em Lennick. Ele era um idiota completo, eu sabia disso. E eu não o desculparia por ter me traído, mesmo que ele me implorasse de joelhos do topo da Torre Eiffel. Mas, ainda assim, não pude evitar me sentir um pouco magoada quando o garoto não me procurou na escola, nem na saída, nem em lugar nenhum. Talvez porque eu estivesse começando a me acostumar com seu jeito irritantemente animado e persistente, ou talvez porque eu achasse que eu valhesse um esforço, mesmo que mínimo, mesmo que apenas para ser enganada e usada. Então, é, confesso que eu esperava por algum cutucão ou aviãozinho de papel com um pedido de desculpas no meio da aula. Mesmo que eu não fosse aceitar, eu esperava por isso. Mas eu estava enganada: tentar seguir com a encenação idiota de que queria ser meu amigo não valia seu suor.

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