Capítulo 32

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Fez-se silêncio por uns instantes.

—Eu era o seu favorito. — e, ao dizer isso, um encardido garoto de escola pareceu espiar através das rugas e da barba emaranhada de Aberforth. —Não era o Albus, ele ficava sempre no quarto quando estava em casa, lendo seus livros e contando seus prêmios, mantendo em dia sua correspondência com 'os nomes mais notáveis da magia da época' — debochou Aberforth — ele não queria se incomodar com a irmã. Ela gostava mais de mim. Eu conseguia convencê-la a comer quando não queria comer com a minha mãe, eu conseguia acalmá-la, se tinha um acesso de fúria, e, quando estava tranquila, costumava me ajudar a alimentar os bodes. Então, quando completou catorze anos... entendem, eu não estava em casa. Se estivesse, poderia tê-la acalmado. Ariana se descontrolou e minha mãe já não era tão jovem quanto antes e... foi um acidente. Ariana não pôde controlar. Matou minha mãe.

Harry sentiu uma horrível mistura de pena e repulsa; não queria ouvir mais nada, mas Aberforth continuou a falar e o garoto ficou imaginando quanto tempo decorrera desde a última vez em que ele tocara nesse assunto; se, de fato, algum dia tocara.

—Esse imprevisto pôs fim à viagem de Albus ao redor do mundo. Ele foi a Godric's Hollow para os funerais de mamãe e, em seguida, Albus se acomodou no papel de chefe de família. Aah!

Aberforth cuspiu nas chamas.

—Eu teria cuidado de Ariana, e disse isso a ele, eu não fazia questão de frequentar a escola, teria ficado em casa. Ele me disse que eu tinha que terminar minha educação, e ele assumiria as obrigações de minha mãe. Um certo revés para o sr. Gênio, pois não há prêmios por cuidar de uma irmã semilouca, para impedi-la de explodir a casa a cada dois dias. Mas ele se desincumbiu bem nas primeiras semanas... até a chegada dele.

Agora uma expressão realmente ameaçadora surgiu no rosto de Aberforth.

—Grindelwald. E, finalmente, meu irmão teve um igual com quem trocar ideias, alguém tão genial e talentoso quanto ele. E o cuidado com Ariana passou a um segundo plano, enquanto eles tramavam os seus planos para uma nova ordem em magia, procuravam Relíquias e faziam o que mais despertasse o seu interesse. Planos grandiosos para o benefício da bruxidade, e se uma jovem deixasse de receber atenção, que importância teria, quando Albus Dumbledore estava trabalhando para o bem maior? Mas, depois de algumas semanas, eu dei um basta, dei mesmo. Já estava quase na hora de regressar a Hogwarts, então eu disse aos dois, cara a cara, como estou falando com vocês agora. — e Aberforth olhou com superioridade para Harry, e não foi preciso muita imaginação para vê-lo adolescente, vigoroso e zangado, enfrentando o irmão mais velho. — Disse-lhe: é melhor desistir agora. Não pode tirá-la daqui, ela não tem condição, não pode levá-la com você, seja lá aonde quer que pretenda ir, quando estiver fazendo os seus discursos inteligentes, tentando conquistar admiradores. Ele não gostou. — Os olhos de Aberforth foram brevemente ocultados pela luz das chamas nas lentes dos óculos: eles tornaram a parecer brancos e cegos. — Grindelwald não gostou de ouvir isso. Ficou irritado. Me disse que eu era um menino idiota, tentando barrar o seu caminho e do meu genial irmão... será que eu não entendia, minha pobre irmã não precisaria mais ser escondida depois que tivessem transformado o mundo, e tirado os bruxos da clandestinidade, e ensinado aos trouxas qual era o seu lugar? Então tivemos uma briga... e saquei a minha varinha, ele sacou a dele, e fui atingido por uma Maldição Cruciatus lançada pelo melhor amigo do meu irmão, e Albus tentou impedi-lo e, de repente, nós três estávamos duelando, e os clarões e os estampidos assustaram Ariana, ela não os suportava... — A cor foi sumindo do rosto de Aberforth como se ele tivesse recebido um ferimento mortal.

—... e acho que ela quis ajudar, mas não sabia exatamente o que estava fazendo, e não sei qual de nós fez aquilo, poderia ter sido qualquer um de nós... e ela caiu morta. Sua voz falhou ao dizer a última palavra, e ele se largou na poltrona mais próxima. O rosto de Hermione estava molhado de lágrimas e Malfoy estava quase tão pálido quanto Aberforth. Harry sentia apenas asco: desejou não ter ouvido aquilo, desejou poder apagar tudo de sua mente.

—Estou tão... estou tão penalizada — sussurrou Hermione.

—Foi-se — disse Aberforth, com a voz embargada. — Foi-se para sempre.

Ele limpou o nariz no punho da camisa e pigarreou.

—É claro que Grindelwald deu o fora. Ele já tinha uma história pregressa em seu país e não queria que Ariana fosse acrescentada à sua folha. E Albus ficou livre, não? Livre do encargo da irmã, livre para se tornar o maior bruxo da...— e fez uma pausa, que poderia ter durado minutos ou horas, ninguém quis ser o primeiro a falar. — Como pode ter certeza, Potter, de que o meu irmão não estava mais interessado no bem maior do que em você? Como pode ter certeza de que não é dispensável, exatamente como a minha irmã foi?

Uma ponta de gelo pareceu transpassar o coração de Harry.

—Não acredito. Dumbledore amava Harry — disse Hermione.

—Então, por que não lhe disse para se esconder? — retorquiu Aberforth. — Por que não lhe disse, cuide-se bem, eis como sobreviver?

— Porque — disse Harry, se antecipando a Hermione — às vezes, a pessoa tem que pensar além da própria segurança! Às vezes, a pessoa tem que pensar no bem maior! Estamos em guerra!

—Você tem dezessete anos, moleque!

—Sou maior de idade, e vou continuar lutando mesmo que você já tenha desistido!

—Quem disse que eu desisti?

—"A Ordem da Fênix acabou" — repetiu Harry. — "Você-Sabe-Quem venceu, tudo está terminado, e qualquer um que finja que é diferente está se enganando."

—Não digo que gosto disso, mas é a verdade!

—Não, não é — contestou Hermione. — Seu irmão sabia como liquidar Você-Sabe-Quem e passou esse conhecimento a mim, e vou continuar até conseguir isso ou morrer. Não pense que não sei como isso poderá acabar.

Ela esperou Aberforth caçoar ou argumentar, mas o bruxo não fez isso. Apenas franziu as sobrancelhas.

—Precisamos entrar em Hogwarts — repetiu Harry. — Se não pode nos ajudar, esperaremos o dia nascer, deixaremos você em paz e tentaremos encontrar um jeito sozinhos. Se você puder, bem, agora será um bom momento para nos dizer.

Aberforth permaneceu pregado em sua poltrona, fitando Harry com olhos extraordinariamente semelhantes aos do irmão. Por fim, pigarreou, levantou-se, deu a volta à mesinha e se aproximou do retrato de Ariana.

—Você sabe o que fazer — disse ele.

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