Capítulo 5 - Manuela

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     No último mês, muita coisa havia mudado na minha vida. Apesar de no começo ter sido difícil para mim aceitar que não existia mais volta para o meu relacionamento com Eric, com o tempo percebi que o fato de ter me dedicado a ele durante dois anos de relacionamento pareceu não significar nada, o que me fez notar que enquanto ele era tudo para mim, eu não era nada para ele, e que mais cedo ou mais tarde, de alguma forma, o que tínhamos chegaria ao fim.

     Apesar de ter me encontrado acidentalmente com Eric duas vezes nas últimas semanas -uma no supermercado e outra na oficina- quando olhei para seus olhos negros, que antes tanto me fascinavam, não consegui sentir nada, nem raiva ou ódio, apenas queria estar longe dele, se possível, nunca mais vê-lo.

     Enquanto eu estava decidida a esquecê-lo para sempre, ele parecia empenhado em me ter de volta, já que nestas duas ocasiões ele tentou se reaproximar de mim e me pedir perdão, mas foi em uma terceira tentativa, quando ele bateu a porta do apartamento de Amber, bêbado, procurando por mim, que eu decidi que aquela história já havia ido longe demais.

     Apesar de Amber não se mostrar incomodada por eu ser sua hospede, eu não queria que minha amiga tivesse que ficar preocupada se o meu ex entraria no seu apartamento e se esconderia embaixo da sua cama para tentar falar comigo, por isso, o quanto antes, comecei a procurar por apartamentos e finalmente encontrei um relativamente próximo ao hospital em que trabalhava, com um espaço adequado para mim e também com um bom preço:

     ― Ah Manu, tem certeza de que você ficará bem aqui? –Amber me olhou preocupada, deixando uma caixa com alguns livros em um canto do apartamento.

     ― Sim, ficarei.

     ― Olha, se você quiser ficar mais algum tempo comigo, tudo bem...

     ― Ah Amber –Me aproximei segurando sua mão- Você é uma amiga incrível e agradeço tudo o que fez por mim nas últimas semanas, mas eu não posso continuar lá e permitir que o Eric continue vigiando seu prédio e tirando o seu sossego.

     ― É isso que me preocupa, quem garante que ele não fará o mesmo aqui?

     ― Já avisei o porteiro, tenho certeza de que ele nunca o deixaria subir sem a minha permissão.

     ― Você não acha que deveria avisar a polícia sobre o comportamento dele?

     ― Acho que não é para tanto, o Eric pode ser um babaca, mas não acredito que ele teria coragem de fazer algo ruim contra mim.

     ― Tudo bem então –Amber suspirou, se tranquilizando um pouco- Quer ajuda para tirar suas coisas das caixas? –Ela se ofereceu, apontando para a pilha de caixas amontoadas no canto da sala.

     ― Eu iria adorar, temos muito trabalho aqui!

     Aos poucos o lugar foi ganhando minha cara, a medida em que cada pertence meu parecia se encaixar perfeitamente em cada canto e cômodo do apartamento.

     Depois de guardar e colocar tudo em seu devido lugar, Amber e eu fomos até a cozinha, onde enchemos duas taças com vinho e depois fomos para a sacada, onde ficamos observando o sol aos poucos ir desaparecendo no horizonte em meio aos prédios:

     ― Uau, você tem uma bela vista aqui! –Amber disse fascinada, dando um longo gole em sua bebida.

     ― É, tenho sim. –Sorri, segurando a taça em minhas mãos, contemplando aquela nova fase da minha vida.

     Deixei que meus pensamentos vagassem para longe, e pela primeira vez em muito tempo, eu me sentia leve e mais voltada para a minha felicidade, traçando em minha mente novas metas que me aproximariam da minha realização pessoal, até o vibrar do celular em meu bolso, me trazer de volta, me lembrando de que cada coisa deveria acontecer no seu tempo. O apanhei, tentando identificar o número:

     ― Quem é? –Amber me olhou curiosa- Alguém que você convidou para vir conhecer seu novo apartamento? –Ela disse sugestiva, já alterada pelo efeito do vinho.

     ― Não seja tola, Amber! É o David!

     ― Diga a ele que estou mandando um abraço, enquanto isso vou até a cozinha pegar um pouco mais disso. –Ela disse apontando para a taça, me deixando ali no instante seguinte.

     Atendi a ligação:

     ― Olá David! Como vai? Pensei que nunca mais me ligaria!

     ― Olá Manu! Estou bem e você? Desculpe, mas desde que voltei de viagem, não tive mais tempo para nada.

     ― Entendo, eu estou bem também, na verdade ótima! Acabei de me mudar para um novo apartamento. –Comentei animada.

     ― Isso é ótimo! Alguma razão específica?

     ― Na verdade, acho que essa mudança simboliza uma nova fase da minha vida, onde eu sou livre e independente. –Disse, dando um gole na minha bebida, sentindo um certo orgulho de mim mesma naquele momento- Quer dizer, quase livre, já que de certa forma você e eu estamos casados! –Ri, recordando nosso casamento de mentirinha em Vegas.

     David se manteve em silêncio do outro lado da linha, o que me deixou bastante apreensiva, já que em todas as vezes em que trocávamos mensagens e recordávamos aquele momento, caiamos na risada:

     ― Está tudo bem, David?

     ― Manu, aquele casamento não era de mentirinha. –Ele disse pausadamente.

     ― O quê? –Disse, quase me engasgando com o vinho.

     ― O Lorenzo tentou vender uma casa hoje e não conseguiu, porque no cartório o estado civil dele foi mudado para casado e lá consta o seu nome.

     ― Como isso é possível? O casamento que fizemos em Vegas não passou de uma grande brincadeira, é uma tradição de quem vai aquele lugar! –Disse inquieta, torcendo para que tudo aquilo não passasse de um grande engano.

     ― Eu sei, mas existem também capelas que fazem casamentos oficiais e foi em uma dessa em que entramos.

     ― Eu vou te matar, David! –Disse, sentindo uma inquietação crescente dentro de mim- Eu estou casada de verdade com um homem que eu não conheço!

     ― Você poderá me matar, se o Lorenzo não me matar antes, ele ficou uma fera com tudo isso!

     ― E agora, o que vamos fazer? –Perguntei, rezando para que ele tivesse alguma solução.

     ― Calma, tudo o que você precisa fazer é vir ao Brasil para que juntamente com o Lorenzo vocês assinem a papelada do divórcio, é um processo um pouco demorado, mas é o único meio.

     ― Eu não acredito que isso está acontecendo. –Disse sentindo raiva de mim mesma, aquela com certeza deveria ter sido a maior besteira que eu já havia feito na minha vida.

     ― Nem eu. –David disse com a voz baixa- Quando você acha que pode vir?

     ― Eu não sei, talvez em dois dias, preciso organizar algumas coisas antes de sair.

     ― Tudo bem Manu, estarei te esperando e por favor, me perdoe por ter colocado você nessa.

     Sem dizer nada, apenas desliguei, tudo o que estava acontecendo era bastante surreal para ser verdade:

     ― O que aconteceu? Por que você está com essa cara? –Amber se aproximou com uma taça de vinho em mãos, me encarando atentamente.

     ― Preciso ir ao Brasil para me divorciar de um homem que eu sequer conheço.

     Ao ouvir o que eu havia dito, ela piscou por alguns instantes e pegou a taça de minhas mãos, retornando para a cozinha:

     ― Aonde você vai?

     ― Pegar mais vinho –Ela me olhou sobre o ombro- Já vi que a história vai ser longa.

O que acontece em Vegas, nem sempre fica em VegasOnde histórias criam vida. Descubra agora