Era uma noite de céu estrelado, com a garota desfilando sorridente pela sacada de seu quarto, muitos metros acima do chão. A vista era impressionante! O ar puro da vegetação encheu seus pulmões, da mesma forma que seu coração se encheu de felicidade.
— É até difícil crer que tudo isso seja nosso.
— Pedra por pedra, coluna por coluna, flor por flor — disse ele, segurando as delicadas mãos dela. — É o nosso lar, longe de toda a dor, sangue e morte.
Ela beijou o amado com ternura. Um homem com roupas de séculos passados, mas a mesma face que ela tão bem conhecia. Ele a abraçou forte, seus braços lhe trazendo paz e segurança.
— Nossa casa, que nos protege da chuva e do sol, e que será testemunha de toda felicidade que nos aguarda daqui em diante — cada palavra dele era uma promessa que ela tomou como profecia. Não houve lugar ali para medos ou dúvidas.
Eles estavam juntos, e essa era a maior e mais improvável vitória que poderiam ter tido.
— Ainda não acredito que estamos casados, que sou uma jovem senhora a começar nova vida em terra distante. — Ela tocou no colar dourado, o maior presente que ele lhe deu. Tão valioso quanto cheio de significados. — Que sou sua, de corpo e alma. Que podemos enfim viver como sempre sonhamos.
— Não faz ideia do quanto sonhei com esse momento, meu amor. O quanto a desejo, o quanto a amo. — Ela mal podia se aguentar de emoção enquanto ouvia as palavras — Meu anjo, meu amor, minha Alice.
***
A jovem acordou de má vontade, ainda com aquela gostosa sensação de nostalgia. Outro sonho com ele. O terceiro na semana. Ela levou as mãos a face, respirando profundamente, tentando afastar-se daquele mundo onírico e abraçar a realidade. Por mais amarga e tediosa que ela fosse.
Claire não compreendia, desde que parou de vê-lo os sonhos começaram a vir. Fragmentos apenas, às vezes uma fala, um sorriso, um beijo especialmente bom... E agora, uma conversa completa. E o mais estranho neste último foi a forma como ele a chamou: Alice. Isso apenas a fez lembrar-se da dor daquela noite em que terminaram, afastando toda a alegria que sentiu no sonho.
Sonhos esses que eram cada vez mais vívidos, como se fossem lembranças recuperadas. Obviamente, uma conclusão que não fazia sentido, e por isso mesmo descartada por uma mente como a dela. Uma psicóloga era uma cientista, não uma mística ou charlatã. Quando Freud lançou seu clássico "A Interpretação dos Sonhos", o que ele propôs não era desvendar revelações de uma força superior, previsões do futuro ou visões do passado. Era apenas um método para o autoconhecimento dos seus pacientes, uma tentativa de decifrar aquilo que o próprio inconsciente revelaria através dos sonhos. E o pior é que Claire nem mesmo era adepta da Psicanálise, para início de conversa.
— Como se sente sobre esses sonhos? — questionou sua psicoterapeuta, sentada em uma cadeira de frente para a cadeira de Claire.
Uma profissional e velha conhecida, a quem a estagiária de tempos em tempos recorria, quando sentia que precisava cuidar de si mesma.
— Não sei dizer ao certo — respondeu ela, após alguma hesitação. — Durante o sonho a sensação é muito boa, um clima de paz e tranquilidade, sabe. Mas depois que eu desperto, depois que percebo que nada foi real...
— Que o Adam do seu sonho não existe na sua vida.
— É, ele não existe. É só uma projeção, eu sei, só o Adam que eu quero que exista. — Ela olhou para os pés, pensativa. — Um cara que eu acreditei que fosse real, mas no fim, foi tão falso quanto esses meus sonhos.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Filhos da Noite
VampireAdam desperta! Trezentos anos após seus inimigos lhe arrancarem tudo, o vampiro tem finalmente um motivo para retornar: Claire Winnicot. Uma universitária de psicologia que se revela a reencarnação da sua esposa assassinada. O imortal fará qualquer...