O xerife estava em sua sala, diante do computador e pilhas de relatórios. De uniforme e estrela dourada, fumava calmamente seu charuto, com a luz da lâmpada reluzindo em sua cabeça calva. As grossas costeletas e bigode como distração para os dedos da outra mão. Emma aguardando, em pé diante dele.
O homem estava sentado, seu peso afundando o banco. Seu charuto empesteando o ar. Até que olhar de censura de sua parceira de trabalho o fez se livrar do fumo, um tanto contrariado.
— Você é chata mesmo, hein, garota! — resmungou.
— "Chata", seria a quimioterapia pra tratar do câncer de pulmão — respondeu ela.
Ele a notou examinando os formulários, relatórios e dados, antes da jovem se virar e dizer:
— Quem diria que a assassina cairia do céu assim, né? — disse ela, se aproximando. — Os repórteres vão ficar doidos quando souberem!
— Ninguém vai saber de droga nenhuma! — gritou ele, desabotoando a parte de cima da camisa estufada. — Ao menos não agora. Precisamos que a suspeita assine os papéis e nos dê algo mais concreto sobre o caso, para começar.
— E quanto ao Turner, ele estava no mesmo carro, não tem como não estar envolvido. Coincidências demais! Ele tem que ser indiciado, no mínimo depôr como testemunha.
— Acha mesmo? — E puxou a costeleta, olhar perdido.
Jeanne Hillton continuava detida na cela, situação que ele sabia, não poderia perdurar. Sem deixá-la ligar, não houve advogado, porém após a estranha confissão de culpa no hospital, ela negou-se a dar quaisquer outras explicações a respeito do caso, voltando atrás na confissão.
Há dez anos como xerife da cidade, era a primeira vez que Corlson Smith se viu contra a parede. Cidade pequena, crimes esporádicos e previsíveis, a realidade era aquela até pouco tempo atrás. Ele era respeitado pela população e elogiado pelo prefeito. Mas agora tudo era diferente. Seu pesadelo começou com o desaparecimento dos irmãos Freeman, jovens inconsequentes sobre quem pousavam denúncias de assédio sexual, brigas e acidentes de carro. Desapareceram na festa universitária que rolou na propriedade Turner, e mesmo que alguns suspeitassem do tal Adam, não havia quaisquer indícios que o ligassem a eles. Isso ficou muito claro após o encontro que teve com o homem... Não ficou? A verdade era que aquela noite ainda era confusa na mente do xerife, que talvez tivesse bebido demais após o trabalho.
Interrogaram pessoas, fizeram buscas pela floresta, mas sem sucesso. Fora as denúncias de invasão de residências, aumento no índice de furtos e o velho Freeman hospitalizado, culpando um lobo gigante!
Jeanne Hilton apareceu como sua salvação! Além de confessar espontaneamente o homicídio, no que sobrou do seu carro foram encontrados vários documentos falsos, todos dela. Também havia uma arma de grosso calibre com munição incomum. Podia ser suspeito que ela assumisse a autoria de um crime tão grave e ainda inocentasse o playboy, algo tão conveniente para o sujeito, mas uma confissão somada aquelas evidências não eram coisa que se pudesse desprezar.
E era sobre isso que o xerife refletia enquanto acendia um novo charuto, rapidamente tecado para longe pela policial.
—... mas você é mesmo chata, hein, garota!
— O senhor já disse isso xerife, não seja repetitivo — disse a policial, conferindo a arma. — Vou voltar pra junto da suspeita. Estou com um mau pressentimento.
***
Em uma cela solitária e fria, a vampira aguardou. Ela vestia as mesmas roupas de quando foi detida, horas atrás. Jogada em uma delegacia pequena, sem celular e com o xerife enrolando para lhe deixar fazer a ligação a que tinha direito, sua situação não era nada boa. A verdade é que passou dos limites com Adam, e como consequência, ele passou dos limites com ela. Jeanne tinha consciência disso. Subestimou a importância da humana a quem ele se declarava e superestimou a própria importância, só por ele tê-la protegido. Brincou com fogo, e agora se queimava. Talvez ele tivesse mais do pai do que parecia, afinal.
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Filhos da Noite
VampireAdam desperta! Trezentos anos após seus inimigos lhe arrancarem tudo, o vampiro tem finalmente um motivo para retornar: Claire Winnicot. Uma universitária de psicologia que se revela a reencarnação da sua esposa assassinada. O imortal fará qualquer...