O Homem da Máscara

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Em um quarto escuro e selado contra luz, ele dormiu. De porte robusto, cavanhaque, tatuagens tribais e vestindo apenas uma calça jeans. Ao alcance do corpo, uma pistola de grosso calibre; sua companheira em momentos de necessidade. Abriu os olhos assustado, ao som da porta sendo arrombada, e estendeu a mão para a arma por puro reflexo. Com sua existência condenada à escuridão, o dia era período de hibernação forçada, de esconder-se do sol em seu lar protegido por soldados humanos. "O que poderia vir atrás de mim pela manhã?", se perguntou.

Mal teve tempo de levantar, algo avançou pela porta recém-aberta. O quarto estava escuro, mas seus olhos de bicho da noite discerniram os objetos sendo arremessados. Latas de coquetel molotov. Fogo!

Ele se jogou contra a parede para escapar das chamas. Gritou por seus homens, sem resposta, provavelmente mortos pelo esperto caçador. Fogo era o fim de qualquer vampiro, tanto quanto o sol, e ele se forçou a manter o controle em meio ao calor e proximidade das chamas, em meio aquela situação desesperadora.

Permanecer acuado seria apenas adiar seu fim, de modo que o vampiro usou o poder do sangue para saltar sobre as chamas o mais rápido que pôde, olhos acessos e presas de fora, totalmente entregue a fera! O calor infernal pareceu enlouquecê-lo, e o toque das chamas sobre sua pele, o fizeram urrar enquanto saltava. Mas nada disso adiantou, pois assim que chegou a porta, o invasor abriu fogo. O corpo do morto-vivo foi transpassado por uma rajada de balas. Balas de prata.

O vampiro caiu, sem forças. Fogo e prata, as armas dos caçadores humanos, as armas dos matadores de vampiros. Balas comuns causavam dor, mas logo o corpo vampírico era capaz de regenerar seus efeitos. Balas de prata não. Por algum motivo qualquer, a prata castigava a carne dos mortos, queimando e dificultando a regeneração, os deixando vulneráveis. Que dirá uma rajada delas!

O invasor trajava roupas pretas que tapavam todo o corpo, mesmo seu rosto. Era rápido e habilidoso, e encarou o vampiro, de joelhos e abalado.

E sob a luz das chamas, o morto-vivo pôde contemplar a máscara sob o capuz: óculos de visão especial sobre um tecido rígido. Escritas nela, palavras em uma língua que ele não compreendeu.

— Quem diabos é você? — perguntou um vampiro experiente, empurrado de costas ao chão.

Eu sou o Golem — respondeu o invasor, seu pé descendo pesado sobre o monstro. — Sou sua morte.

O golpe atingiu em cheio o rosto dele, seguido de outros, até tudo se tornar escuridão.

***

Curso de Psicologia, Universidade de Bleak Hill.

Às 8h30 da manhã, os alunos se dividiam entre aqueles que prestavam atenção na aula de Antropologia, os que conversavam discretamente e os que dormiam.

— No mundo de hoje, é fácil se manter cético, racional e cientificista quando nos confrontamos com as lendas e mitos dos nossos antepassados. Resumir tudo a simbologia, ignorância ou crendice — disse o magistrado ao lado do projetor. Terno marrom, cabelos e olhos de um castanho escuro, barba por fazer, para além de um meio sorriso no rosto. — Mas alguns de nós, tolos ou sábios, acreditam que alguma verdade se esconde por trás daquelas histórias que gelavam espinhas.

— Diz aí, o que acha do professor? — perguntou a garota de olhos amendoados e voz melodiosa, para a amiga da carteira ao lado.

— Ele não é lá muito ortodoxo, mas carisma tem de sobra. Gosto da aula dele — respondeu uma Claire sonolenta.

— Esses indivíduos percebem que nem tudo no mundo pode ser resumido a números e reações fisiológicas. Que as trevas da noite ainda escondem mistérios e segredos disponíveis apenas para quem tenha estômago de ir atrás deles — continuou o professor, fitando as duas. — Enxergam os monstros, fantasmas e demônios que caminham entre nós.

Filhos da NoiteOnde histórias criam vida. Descubra agora