Conselho

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Hanyel

Ouço risadas eufóricas vindas da sala, me pergunto quem será que havia causado tanta felicidade em Bianca.
- Uma boa tarde a todos!! – Uma voz nos saúda.
Viro-me rapidamente, era uma senhora baixinha de cabelos bem curtos e grisalhos, estava carregando uma mala quadrada de couro. Era a avó de Bianca, ela me parecia tão simpática, levantei-me e me pus a cumprimenta-la.
- Ora, vejamos só, temos um coven aqui? – Dona Jane sorri. – Não vejo tantos bruxos assim reunidos vivos a décadas. – Ela larga a mala no chão, pega um prato e vai em direção ao caldeirão. – Quem fez esta sopa? Foi você Adriana?
- Fui eu com uma ajuda de meus novos amigos! – Adriana me olha sorrindo.
- Parece comestível! – Diz ela brincando.
Fiquei apenas espreitando dona Jane para ver se ela era ou não uma bruxa. Ela se senta próxima a mesa, experimenta um pouco da sopa e aperta o pé da orelha com os dedos em sinal que a sopa estava muito boa.
- Que bons ventos a trazem a Capital mãe? – Anderson pergunta.
- Ventos cheios de areia para ser mais exata. Vou contar como foi que decidi vir para cá.
Adriana cruza os braços, se encosta na parede e se mostra atenta, assim como todos nós.
- Lá estava eu, sentada em meu sofá assistindo TV, até aí tudo bem, não é? – Ela fala erguendo a sobrancelha e provando mais um pouco de sopa. – Foi aí que veio um plantão jornalístico, fiquei atenta na notícia que iria vir. Quando vi aquela reportagem eu fiquei boquiaberta. Como é que vocês não me chamaram para aquela luta livre?
Todos nós soltamos risos espontâneos.
- Vi que era Adriana que havia passado por Commanvall destruindo coisas, quando vi aquelas dunas de areia em meio a cidade, subterrando dezenas de tanques de guerra! Eu parei por um instante, fiquei sem reação. Logo decidi... vou ter que ir até a Capital para dar um puxão de orelha em minha filha porque ela não me chamou para dar uns sopapos naqueles miseráveis ditadores!! – Dona Jane começa a rir.
- Mãe, olha sua idade! E outra... nós nem sabíamos que iam ter tantos guardas assim lá. – Adriana fala.
- Pois bem... e desde quando uma bruxa para de lutar, hein? Eu sou da época em que as bruxas entravam na pancadaria por seus direitos minha filha! – Diz dona Jane levantando-se e indo até perto de sua mala.
Ela abre as trancas daquela mala de couro e retira de dentro uma vassoura toda ornamentada, desde o cabo de madeira todo entalhado, até as cerdas de palha amarela com brilho dourado.
- Vindo para cá, tive uma visão. Minha mente vagou pelo vácuo do universo, pude ver escuridão, medo e dor. Mas também vi luz, paz e alegria. Os dias de guerra voltaram. – Ela diz com a voz cheia de raiva. – E eu estou aqui para ajudar vocês nessa batalha!
Sinto um arrepio no corpo, as palavras de dona Jane me deixaram nervoso, tremi por um certo momento. 
- Vou deixar minhas coisas no quarto! – Disse dona Jane.
- Vou ceder minha cama a senhora, pode ser? – Pergunto a ela.
- Fico grata! – Respondeu.
Fui até o quarto rapidamente e peguei meus pertences e levei para a sala.
- Bom, terei de dormir aqui agora!
Adriana foi acomodar sua mãe no quarto. Ariane veio até mim.
- Acha mesmo que uma guerra está se aproximando? – Ela pergunta.
- Creio que a guerra já está programada desde o dia da morte de Margareth. – Falo olhando para Bianca que vinha da cozinha.
Ela se senta no sofá próxima a mim. Põe a mão no rosto e desliza pelo cabelo.
- Eu não quero morrer tão já! – Disse Bianca.
- Não iremos morrer tão cedo Bianca. – Ariane a tranquiliza.
- Teremos uma vida longa para atormentar muito a Nova Ordem. – Falei rindo.
Disse aquilo somente da boca para fora, pois sabia que não iria ser nada fácil derrotar aqueles malditos. Meu maior medo, era o de não cumprir as promessas de vida que eu fazia para Ariane e para Bianca.
- Vou tomar um pouco de ar fresco. – Ariane fala.
- Vou junto! – Bianca levanta-se e acompanha Ariane até o jardim.
Fico só na sala por alguns minutos, refletindo no que eu havia feito e no que deveria fazer a partir de agora. Coloco minhas mãos sobre o rosto, encobrindo meus olhos e nariz com meu cabelo que estava cada vez maior. Ouço as vozes de dona Jane e Adriana vindas do quarto. Retornaram a sala.
- Precisamos conversar com você, bruxo da terra! – As duas apontaram seus dedos para mim.
Vou até junto delas, que me levam ao quarto de Adriana. Que no qual estava escuro e com apenas uma vela acesa sobre uma mesinha de madeira para iluminar o ambiente.
- Sinceramente... não sei como meu quarto fica tão escuro assim com a janela fechada. – Diz Adriana.
- Temos aqui então mais um vidente presente. – Fala dona Jane.
- Como sabe? – Pergunto.
- Sou uma também meu querido, sei que você adora gatos, tem fascínio pela natureza, ama comer, adora ficar sozinho e morre de medo de sapos!
Fico estagnado. Ela era boa mesmo.
- Não se preocupe, também não gosto de sapos. – Diz Jane ao sentarse na cama.
- Precisamos ter uma noção do que está por vir? É por isso que me chamaram até aqui? – Pergunto meio preocupado.
- Também. Mas queremos pedir para que você não conte nada sobre suas visões para aquelas duas bruxinhas lá fora. Saber o futuro não é algo tão bom assim como a maioria pensa. Podemos cometer sérios erros ao tentar mudar o destino que já está traçado. – Adriana fala colocando sua mão sobre meu ombro.
- Peço para que o que você ver agora, seja mantido a sete chaves e não deve ser revelado a ninguém, pois você já sabe o porquê! – Dona Jane me explica. – Dê-me sua mão querido. A sua também Adriana.
Nos damos as mãos, fecho meus olhos. Estava me preparando para ter uma visão.
- Isso meu bem... mantenha sua mente limpa assim! Muito bem! Você sabe fazer isso! Agora relaxe, imagine uma bola de energia saindo de sua cabeça e envolvendo todo seu corpo.
Começo a mentalizar aquela bola de energia. Senti um leve formigamento em minha cabeça, logo um arrepio e em seguida um susto que me faz abrir os olhos e me ver vagando no vácuo do espaço.
Sinto a presença de algo sombrio, sou levado até um lugar onde estavam dois pilares de concreto. Gritos ecoaram em minha mente, pessoas chorando e agonizando de dor invadiam minha mente, começo a tremer, me vejo frente a frente comigo mesmo. Fico paralisado, meus olhos ficaram arregalados. Vi o momento de minha morte.
Abro os olhos sugando ar assustado, meu coração estava disparado, batia muito forte e extremamente rápido. Coloquei a mão no peito, lágrimas escorriam de meus olhos.
- Oh querido! – Dona Jane me abraçou. – Não fique assim...
Não poderia ficar de outro jeito a não ser assim... abalado e chorando nos braços de uma senhora que havia conhecido a pouco menos de uma hora.
- Não perguntarei o que viu... não suportaria sentir a mesma dor que você está a sentir. – Adriana fala ao me abraçar também.
Comecei a me acalmar, o conforto de um abraço de carinho verdadeiro me fez esquecer por um momento o que eu havia visto. A dor de ver sua própria morte era terrível.
As cortinas são abertas por Adriana, o quarto se ilumina.
- Vamos para fora, agora quero falar com aquelas duas pequenas também! – Dona Jane fala séria.
Saímos do quarto e nos encaminhamos até o jardim, as meninas estavam sentadas na calçada conversando, abaixei-me ao lado de Bianca.
- Querem falar com vocês duas! – Falei.
Adriana e dona Jane ficaram em frente as meninas, elas levantaramse, ficaram em pé também. 
Com um olhar sério começaram a falar juntas.
- Nunca. Jamais. De modo algum, se separem. O destino de vocês e de todos os descendentes da magia corre risco. Não ouçam o coração, ouçam a razão, não deixem que os sentimentos atrapalhem suas escolhas, não deixem... de jeito algum, que os sentimentos tomem conta de vocês! Ter sentimentos é algo maravilhoso, mas estamos em guerra e a guerra mata todos que tem coração! – Disseram.
Ariane engoliu seco. Bianca apenas confirmou com a cabeça. Dona Jane as abraçou, acariciou as faces delas e foi para a cozinha, Adriana a acompanhou. 
- Não vamos ter como escapar disso... está escrito nas estrelas já. – Falei.
- Queria tanto que nada disso existisse de verdade, acordo todos os dias pensando que tudo não passa de um sonho, mas na verdade é um grande pesadelo. – Bianca diz.
- Às vezes, nossos piores pesadelos se tornam reais, apenas para nos testar! – Falo.
Ficamos em silêncio por alguns instantes. Aquilo que estava a vir em nossas vidas, era o maior dos fardos que iríamos carregar na vida toda.

A inquisição de B.A.H.V.Onde histórias criam vida. Descubra agora