Castigo

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Victor


Ouço o som de madeira estalando no fogo, música clássica a tocar e batidas de sapatos no chão no ritmo da melodia. Minha cabeça está estranha, dói bastante, passo a mão nos cabelos e abro os olhos. Estou deitado em uma cama enorme com vários travesseiros, olho em volta e vejo a decoração do quarto, quase todo em madeira e com lustres de cristal.
- Onde estou? – Falei comigo mesmo em voz baixa.
Coloco os pés devagar ao chão, minha cabeça rodava, certamente havia caído e batido a cabeça no chão quando ameacei atirar em meu pai, firmo minhas pernas e levanto me apoiando nos móveis de madeira negra muito bem lustrados. Vou andando até a porta, fico com receio de abri-la, mas sigo em frente. Giro a maçaneta, abro a porta lentamente e me dirijo próximo a um sofá de couro em frente a uma lareira, com diversas cabeças de animais em cima dela, alguns deles por mim eram desconhecidos.
A música para. Viro-me rapidamente e observo aquela poltrona em frente a uma enorme janela de vidro que dava em uma sacada.
- Achei que demoraria mais para acordar. – Uma voz veio da poltrona. – Bom... já que acordou, devemos conversar. – Disse o homem que se levantou com um copo na mão.
Era meu pai, com as mesmas roupas de sempre, terno, gravata, óculos escuros, sapato preto muito bem lustrado, ele era fascinado por coisas brilhantes, agora entendo o porquê de os móveis aqui serem tão reluzentes.
- Porque me trouxe aqui? – Pergunto.
- Ora filho, seu lugar não é com aqueles seres nojentos e sim com seu pai. – Disse meu pai indo até um balcão com bebidas.
Pegou uma garrafa de whisky e colocou um pouco em seu copo.
- Ah! Nada melhor do que um bom e velho whisky escocês! – Disse ele bebendo um gole e apertando os lábios para demonstrar apreço pela bebida. – Quer um pouco?
- O que você fez com eles?
- Eles quem filho?
- Meus amigos e Ariane!
- Amigos? Hahaha, você acha que tem amigos? Pelo que vi, aquele loiro magrelo e aquela menina com o dom do fogo não são seus amigos. – Ele ri descaradamente.
Abaixo a cabeça e espremo os dedos nas mãos. Hanyel e Bianca não me queriam bem, mas não mudava o fato de que um dia os considerei amigos. Meu pai vem até mim, caminhando suavemente, seu cabelo penteado para o lado e cheio de gel brilhava assim como seus sapatos. Ele para em minha frente e põe a mão em meu queixo.
- Você sabe que eu quero cuidar de você como cuidei de sua mãe antes de saber o segredo dela.
Meus olhos se encheram de lágrimas, lágrimas de ódio.
- E eu quero ensinar a você, tudo o que sei, para um dia me suceder e ser o comandante de todo este império que construí e terminar com a escória que se esconde de mim.
- Eu... eu te odeio. – Falei.
- Hahaha... O ódio é a base de todo amor filho.
- Você é desprezível, é arrogante é um... um filho da puta!
Ele me soqueteia o queixo para trás. Caminha até a lareira e paga um chicote que havia ao lado. Volta andando lentamente, parecia contar os passos. Meu corpo treme, já sabia o que ele iria fazer, mas me mantive firme à espera do castigo que iria receber. Meu pai alisa o chicote com a mão, parecia recordar algo.
- Sabe filho, foi com esse chicote que eu enforquei a vadia da sua mãe. Mulher adorável, cozinhava muito bem. Ah sim! A macarronada que ela fazia era sensacional. Mas ela me decepcionou, me desafiou ao se revelar uma bruxa. A bruxa das sementes maduras assim era chamada. – Ele sorri e uma lágrima corre de seus olhos. – Eu a amei muito, mas não devia deixar que gente como ela continuasse a viver, continuassem a serem superiores a nós meros humanos, sem dons ou qualquer tipo de poder extraordinário.
Fico olhando seriamente em seu rosto, ele retira os óculos para limpar os olhos aguados. Vejo que os olhos dele estavam completamente negros, era como se a pupila estivesse dilatada muito e tomado conta dos olhos todos. Põe os óculos novamente, sorri e com um brusco movimento de braço me acerta com uma chicoteada na cara.
Caio ao chão sem produzir nenhum som de dor.
- Levante-se! – Diz meu pai dando outra chicoteada em minhas costas.
Aquilo doía na alma, contorcia meu corpo com a ardência. E sem piedade recebo mais cinco golpes seguidos no qual começaram a rasgar minha pele. Não pude suportar e soltei um grito desesperado de dor.
- Isso é música para meus ouvidos. – Dizia ele sorrindo e conduzindose até próximo de sua poltrona, ligou a música outra vez, tirou o terno, o colocou sobre a bancada e veio correndo em minha direção girando o chicote no ar.
Desta vez acertou em cheio nos meus olhos, o me deixou temporariamente cego.
- Não vou te matar, hoje não, mas vou te ensinar a não ser como a vadia da sua mãe!
Uma, duas, três, dez chicoteadas seguidas. Meu corpo tremia descontroladamente, sangue espalhado pelo chão daquele grande salão, eu cuspia sangue que estava coagulando em minha garganta. Em um suspiro de dor disse:
- Pare! Por favor!
- Estou apenas começando! – Disse limpando a baba que saiu da sua boca na hora que me chicoteava.
Chegou um momento que eu não sabia onde estava, meu corpo doía muito, os cortes pelo rosto e pescoço ardiam tanto quanto a carne das minhas costas sendo golpeadas por aquele chicote de couro.
Um guarda entra na sala, vejo apenas o vulto.
- Senhor...
- Pode falar soldado!
- A que horas irá mandar as tropas em busca dos bruxos fugitivos?
- Darei a ordem em breve, estou resolvendo um assunto de família.
- Mas senhor, assim eles ficarão em vantagem!
- Você é surdo? Logo mandarei as tropas! Nenhum metido a praticante de magia jamais pode escapar de mim. Agora vá, e providencie a cela do corredor direito para meu filho.
- Sim senhor! – Disse o guarda saindo da sala onde estávamos.
Meu pai aproxima-se de mim e abaixa. 
- Não doeu muito, não é? – Falou dando mais um golpe em minhas pernas.
Não conseguia pronunciar nenhuma palavra sequer, meu olho esquerdo estava embaçado e o gosto de sangue corria por minha garganta, tentei me levantar, mas não obtive sucesso. Meu pai vai até o balcão de bebidas, pega mais um copo de whisky e vem ao meu lado novamente. Derrama toda a bebida em cima dos meus graves ferimentos, solta uma gargalhada, passa o dedo sobre a minha carne que estava latejando de dor e lambe o sangue.
- Você tem o mesmo gostinho dela!
Dá uma gargalhada, chama os guardas e senta-se na poltrona.
- Chamou senhor? – Disse um dos dois guardas presentes.
- Levem-no para a cela. Não deixem comida ou água, ele deve aprender a me respeitar.
Os guardas vêm até mim, pegam em baixo dos meus braços e vão me arrastando. Me arrastam pelo piso gelado, deixando ao chão um caminho de sangue que agora estava preto.
Abrem a cela e me jogam bruscamente, caio com força e solto um gemido de dor. Sangue ainda escorria de meus ferimentos, meu olho já estava ficando melhor. O frio que fazia ali estava me matando aos poucos, tremia muito.
Meus olhos se encheram de lágrimas, meu corpo tremia no ritmo que as lágrimas escorriam pelo meu rosto. A dor que eu estava sentindo certamente não se comparava com a dor que Ariane sentiu quando eu revelei meu segredo.
Ouço as sirenes tocarem, passos alinhados e gritos de comando ecoaram pelos corredores. Meu pai havia dado ordem para a caça de Ariane, Bianca e Hanyel.
- Me perdoa Ari... – Foi a única coisa que disse ao fechar os olhos e tentar tranquilizar a mente em desespero.

A inquisição de B.A.H.V.Onde histórias criam vida. Descubra agora