Alissa sentia o corpo flutuar, se sentia bem pela primeira vez em meses, uma sensação estranha de paz. Até ouvir vozes ao seu redor, vozes que falavam com ela ou para ela, mas não faziam sentido. Tentou abrir os olhos, mas estes não obedeciam, tentou erguer a mão e tocar alguém, mas tudo pesava.
Só então lembrou o que havia acontecido, os remédios, o álcool, e então focou ao seu redor e tudo começou a fazer sentido. Pelo barulho e cheiro, ela estava em um hospital. Lembrou então de ter ligado para o pai e depois escuridão.
Uma parte dela sentia vergonha pelo momento de fraqueza, a outra sentia raiva por não ter conseguido. Ela não se sentia a mesma, e isso era ainda pior do que estar doente. Perder o que ela sempre havia considerado sua maior qualidade: Sua coragem.
Abrindo os olhos com certa dificuldade, ela viu ao seu redor enfermeiras, sua médica.
Apos ser examinada, ela se viu sozinha no quarto. Sabia que não seria por muito tempo, logo alguém entraria. Suas irmãs, seu pai, quem sabe.
Ela olhava pela janela quando ouviu a porta abrir.
Alissa…
Ela não se virou, não sabia se poderia olhar o pai e não sentir vergonha, ou pior, pedir colo, como tantas vezes quisera fazer e não havia podido.
— O que houve minha filha? O que te levou a tal ponto para fazer isso?
Só então ela olhou para ele e viu medo, dor e o que pareceu repreensão nos olhos dele e aquilo a fez perder a calma.
— O que deu em mim? Estou morrendo meu pai, cada dia eu morro um pouco. Você não faz ideia do que é isso.
Ele se aproximou dela e chegando bem perto disse de um modo firme e suave, no entanto:
— Eu sou seu pai Alissa, sinto tudo o que te aflige, sua dor é a minha.
Ela riu sem humor e disse rascante:
— Sente? Tem certeza? Por anos você foi uma visita, um cheque depositado na conta de mamãe, nunca indo visitar, nunca se interessando pelo que me acontecia. Agora quer preocupar papai? Porque deixei de ser a filha perfeita, a bailarina perfeita, a empresária impecável? Você esteve lá, ontem quando ela disse coisas terríveis para mim? Ou hoje quando publicamente ela me repudiou? Diz papai, você estava ao meu lado? Quando o homem que julguei me amar dizia a outra que ela era seu diamante? Não me diga que sente a minha dor papai, isso é mentira.
Carlos não merecia suas palavras, ela sabia disso, mas estava tão ferida que elas apenas saíram.
— Eu não fui um pai perfeito Alissa, sei disso, mas ainda sou seu pai, e como seu pai e nesse momento graças a sua atitude, seu guardião legal, digo o que você vai fazer, o que vamos fazer, você irá se tratar, vai fazer cada procedimento para se curar. E não pense que vai poder fugir disso, da vida. Agora descanse.
Ela sentiu o beijo suave que ele lhe deu, e ouviu seus passos, e fechou os olhos apertados. Mas era inútil, as lágrimas caiam mesmo sem sua permissão.
Ninguém mais veio vê-la, e ela achou melhor assim, embora soubesse que algum deles estava lá fora, ela não sentia vontade de ver ninguém, de ouvir ninguém.
A noite ia alta e ela ainda não havia dormido, quando a porta abriu e ela viu Vitor entrar. O cunhado ali não era uma surpresa, mas era no mínimo inusitado.
— Alissa.
Ela ligou a luz e olhou para ele, que parecia preocupado e tinha olhos fundos.
— Nina… Algo aconteceu com ela?
— Não, ela está, na medida do possível, bem. Mas penso que precisamos conversar criança.
Ela quase riu, pois, ele era pouca coisa mais velho que ela.
— Não sei se quero falar. — Ela teimou
Ele sentou na cadeira perto da cama e continuou como se ela não houvesse dito nada.
— Nina e eu iremos para o rancho, quero que ela conheça Rosa, mas assim que você sair daqui, irá ficar conosco por lá. O ar do campo irá te fazer bem e eu julgo que você precisa sair daqui. Respirar algo novo e sem fantasmas. O que me diz?
Ela pensou em recusar, mas não via sentido nisso, ela realmente precisa de uma mudança, nela e ao seu redor.
— Eu penso que vai ser bom.
Ele olhou para ela como se esperasse uma briga, mas sorriu satisfeito quando não houve. Homens.
— Obrigada Vitor.
Ele levantou e fez um carinho no rosto dela, seguido de um beijo, e saindo disse:
— Durma menina. Seu irmão está lá fora, penso que logo ele virá.
Ela sorriu na menção de Javier.
Após se despedir de Javier e contar o que havia combinado com Alissa, Vitor pegou o elevador e desceu.
Ia andando pelo corredor, quando esbarrou em alguém. Pronto para se desculpar, olhou o desconhecido e viu o Stetson preto que era a marca registrada de seu amigo e vizinho Kyle.
— Kyle, o que faz por aqui?
O outro lhe deu um abraço e os dois homens começaram a falar. Kyle estava ali para falar com o irmão que trabalhava ali e ficou surpreso quando Vitor lhe contou por alto sobre a cunhada. Lembranças dolorosas vindo a sua mente.
Os dois se despediram e seguiram rumos diferentes. Cada um com seus pensamentos, e ambos pensavam na mesma coisa. Alissa.
Quem seria a desconhecida que havia preocupado o amigo e, porque um arrepio na coluna lhe dizia que tudo ia mudar?
Enquanto isso Alissa pegava no sono, pela primeira vez sem pesadelos. Apenas vazio. O que era muito bom.
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MEU TORMENTO 04 - confiar e perdoar
RomanceLivro em atual revisão, em breve os capítulos serão alterados. E a saga da Família Sandoval, continua, agora com Alissa, considerada a razão e consciência, entre os irmãos, agora chega para nos contar a sua própria história... "Estar partindo é uma...