2. Nina

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Enquanto o inverno de Minas Gerais trazia chuva forte e frio extremo à cidade de Monte Verde, Alagoas e sua capital ardiam no sol causticante, e isso era, para Nina Varell, uma imensa nostalgia. Ela não gostava da chuva e do frio do inverno de sua cidade natal. Desejava abertamente diante de sua família que pudesse morar num lugar onde o sol reina o ano inteiro e onde ela pudesse sentir a maresia morna de uma praia azul de areia branca e ouvir a marejada suave das ondas, vestida do seu biquíni mais bonito.
Ficar nesse cenário perfeito, deitada sozinha – obviamente, enquanto suas amigas não chegassem – debaixo de um grande sombreiro, sobre uma cadeira de aluguel e com água de coco e um picolé era tudo o que Nina queria agora, mas isso não podia ser feito, sabendo quem ela era e com tantos homens ao redor. Os olhares espalhafatosos de desejo eram direcionados ao belo corpo esquio e definido da jovem estudante. Ninguém podia deixar de notar seus seios erguidos e fartos e seu longo cabelo escuro e charmosamente ondulado, caído sob a pele moreno-clara bronzeada. Era uma questão de tempo até que alguém se aproximasse. Nina pôs os óculos escuros redondos, tirou um livro de dentro da bolsa, cruzou as longas pernas e começou a ler.
Como esperado, um rapaz molhado saiu do meio de seus amigos, que conversavam entre si, e aproximou-se de Nina com um cortejo de paquera. Medindo-a com os olhos, ele parecia imaginá-la na cama, pronta para ser desnudada. Nina podia notar isso nos homens. Era a mesma cara idiota de cachorro faminto e aquele olhar nojento que se matinha fixo nos seios ou no meio das pernas dela. Era sempre dessa forma arcaica que criam estar encantando seus alvos, quando na verdade apenas as aborreciam.
— Oi. — ele cumprimentou — tudo bem, gatinha? Esqueci teu número, pode me lembrar?
— Eu vim de longe pra tomar um banho de sol decente numa praia que não seja fluvial — ela tirou os óculos escuros, mostrando seus olhos amendoados cor de mel —, e você está na frente do sol. — e tomou um gole da água de coco.
O rapaz fez uma careta de admiração unida à risada masoquista.
— Nossa! — exclamou — já vi que é bravinha.
Nina deu um sorriso fechado.
— Bem, — ele disse — eu cobri o sol, mas talvez possa te mostrar...
— "Outras estrelas"? — ela completou, com ar de reprovação à cantada — Eu gosto mais do sol.
O rapaz ficou sem jeito. Toda a sua vontade de continuar insistindo se foi naturalmente. Ele saiu caminhando na areia de volta para seu grupo de amigos, sem nada a dizer. Nina pôs os óculos novamente e se preparava para voltar a ler, ajeitando-se na cadeira.
— Essa eu vi. — A voz atrás de Nina era conhecida e amada. Ela virou-se num belíssimo e sincero júbilo. Isabelle e Maya se ajoelharam na frente dela conjuntamente.
— Oi, amiga. — Maya disse sorrindo e as três se abraçaram com força.
— Senti tanta falta de vocês, gente. — Nina contava emocionada — Eu nem acredito que vamos ficar juntas. Isso é fantástico!
— Tem pelo menos oito anos pra ficar de saco cheio. — Isabelle informou com alegria.
— E eu certamente não vou aguentar. — Nina gargalhou, junto ao dueto de amigas. Soltou-a para ver os rostos queridos que tão poucas vezes pôde ver.
— O que andou fazendo pra conseguir ficar ainda mais sexy? — Maya brincou. Nina jogou o longo cabelo de beleza estonteante, que deu a volta sobre os ombros e caiu cobrindo um lado do rosto. Com um olho à mostra, lançou para o ar um pequenino beijo sensual, sorrindo com o olhar de desejo que só ela sabia fazer.
— Uau! Até a gente tá afim de você agora! — Isabelle gracejou.
— Falando nisso... — Maya apontou com a cabeça para o loiro e robusto entre a quadra de jovens. Nina olhou para eles rapidamente.
— Ah, o ‘Zé-dend’água’. Não.
— Por que, ué? — Isabelle perguntou.
— Ele me tirou quinze segundos de sol de verdade.
— Nossa! — Maya riu, tirando a blusa — você é “A Inflexível”, amiga.
Nina e Isabelle perderam o sorriso quando olharam o ombro nu da amiga, marcado com uma mancha circular e tão avermelhada como uma lua de sangue.
— Maya! — exclamaram em uníssono, com o olhar esbugalhado.
Quando tocou a queimadura, Maya sentiu dores.
— Nossa Senhora, May! — exclamou — O que foi isso?
— Alguém me deu um encontrão lá atrás.
— Algum imbecil deu um encontrão nela. — Isabelle retrucou.
— Mas, — Maya concluiu — como eu disse antes, vou sobreviver, pelo menos até hoje à noite.
— Eu sobreviveria e processaria aquele rinoceronte. — Nina disse. Derramou um hidratante na palma da mão e pôs no ombro de Maya, esfregando com cuidado. O sobressalto da amiga lhe fez ir com mais calma ainda.
— Quer ir pra casa, pra cuidar disso? — perguntou.
— Não. — garantiu Maya — Relaxa.

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