Maya Nindberg estava começando a preocupar Nina Varell. Isabelle Allende já ficara doente de preocupação há muito tempo, mas só agora, percebendo entre uma brecha da porta a amiga pesquisar coisas estranhas na internet sobre deuses desconhecidos e misticismo indígena tão tarde de uma noite chuvosa, Nina teve medo de perder sua amiga. Maya não havia comido há mais de um dia, recebendo em seu corpo apenas água e a luz constante de um monitor. Não saiu daquele quarto, deixando de comparecer ao segundo dia da faculdade de seus sonhos de infância, aquela que as três lutaram tanto para alcançar. Seus professores já estavam começando a perceber a distância que existia entre a Medicina e os pensamentos da menina Maya.
Nina decidiu abrir a porta, o que fez com que Maya sobressaltasse assustada.
— Nina?! — ela fechou o notebook.
— Eu achei que a ideia fosse tranquilizar a Belle — Nina entrou —, não a tornar mais neurótica ainda. Ela vai ter um AVC por isso.
— Eu tô bem. — Maya insistiu.
— Eu sei que não está.
— Ah, e você acha que me conhece tão bem, Marcella?
Nina preferiu se calar, já sentada ao lado da amiga. Ela sabia que Maya não tinha a intensão de brigar. Só estava atordoada. Decidiu ignorar aquele tom.
— Nem eu sei quem sou. — Maya murmurou olhando para a parede.
— O que tá acontecendo?
— Só vai dormir, Nina.
— Maya, — ela tirou o computador das mãos de Maya, colocou-o na mesa ao lado da cama e sentou-se sobre as pernas esticadas da atormentada amiga, que esfregou os olhos manchados de cansaço — me escuta, meu bem: Belle e eu te amamos, fragou?
— O que?
— Sacou?
— Eu sei... — Maya confirmou, mas não teve tempo de falar mais que isso:
— E a gente não quer te ver enlouquecer. — Nina segurou a nuca da amiga, que olhou para ela nos olhos — Você não foi à faculdade no segundo dia de aula. No primeiro sim, foi, mas não estava lá. Os professores estão começando a perceber e marcar sua cara.
Maya desviou o olhar, mas Nina puxou seu rosto novamente:
— Preste atenção. Medicina é o teu sonho! Essas coisas estranhas que você está estudando, elas não têm o direito de receberem mais atenção que seu futuro feliz como oncologista.
Maya consentiu com a cabeça. Nina percebeu que ela estava emocionada.
— Eu quero muito contar a vocês. — as lágrimas caíram.
— Então conta.
Maya chorou silenciosamente, começando a soluçar. Nina não entendia o que toda aquela pesquisa tão insólita tinha a ver com o claro sofrimento que enchia o coração de Maya Nindberg. Decidiu não mais insistir, respeitando o espaço de que ela precisava.
— Me conta quando estiver pronta. — E abraçou a amiga, que devolveu um enlaço forte como de uma saudade de anos. As lágrimas de Maya ensoparam o ombro dela, chegando lentamente ao colchão através do braço, depois de alguns minutos de acúmulo. Maya deitou sua cabeça de lado sobre o ombro dela e continuaram abraçadas por mais tempo.
— Agora, vê se dorme e para de pesquisar histórias de deuses. — Nina pediu finalmente.
Quando Maya se deitou, Nina continuou sentada ao seu lado, afagando o cabelo negro e liso de mameluca, que parecia um espelho negro, refletindo qualquer mínimo feixe de luz. Olhou para o notebook. "O que há de tão importante nessa droga?", pensou.
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Prisões de Guarani - versão gratuita
Fantasy🏆Terceiro lugar no concurso PAX 🏆Prêmio de melhor vilão (Deusa Jaci) A vida pouco comum de Maya Nindberg, herdeira de um verdadeiro império e com os sonhos na palma da mão, passa a ser ameaçada por forças super-humanas ao descobrir que sua falecid...