Tudo sempre pode mudar

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Os trailers já estavam sendo exibidos quando Danilo voltou ao corredor trazendo um enorme saco de pipoca, pelo brilho no topo se podia ver a manteiga. Pediu desculpas quando pisou, sem querer, no pé de numa moça que estava a duas cadeiras antes mim. Ela apenas bufou enquanto ele se equilibrava com o saco de pipoca em uma mão e um enorme copo que parecia ser refrigerante, na outra. Quando se aproximou eu peguei o saco de pipoca que fez meu estomago roncar, pois estava com fome. Sentou-se e colocou o copo entre nós.

- Gosta de suco de uva? Espero sim. Perguntou-me.

-Claro, suco está ótimo. Ele sorriu enquanto eu respondia e aquilo me deixou um pouco envergonhado, e fiz o possível para não demonstrar. Ficou me observando um breve instante e depois voltou a olhar para tela. Ele encheu a mão de pipoca e eu o imitei. A pipoca caiu como uma luva amenizando minha fome. Quando o filme começou, percebi que o Danilo, não me trouxera para o abate, ele realmente queria passar um tempo comigo. O filme que fomos ver contava a história de uma mãe em busca de justiça pela morte de seu filho. Um tema interessante, pensei. Em raros momentos nossas mãos se esbarravam no saco de pipoca ou no suco, mas ele sempre me dava a vez, nada demais. Uma hora e meia depois estávamos na saída do cinema.

- E ai gostou do filme? Perguntou. Enquanto colocava uma blusa de frio.

- Muito interessante, é bom ver esses filmes, não acha? A gente se sente mais corajoso a enfrentar a vida.

- Nossa, esperava uma resposta, do tipo, achei legal. Me surpreendeu Gabi. Disse enquanto caminhávamos até o carro.

Pensei em lhe dar um esporro, mas pensei melhor. No mínimo ele achava que eu era um garoto chato e mimado.

- Eu tenho meus encantos. Disse, deixando escapar um riso tímido. Ele me olhou, seu olhar indecifrável. E continuou a passos lentos.

Meia hora depois estávamos na porta da minha casa. Ele desligou o motor assim que chegamos e dessa forma indicando que ele queria conversar um pouco. Como estava um pouco frio ficar ali no carro seria ruim.

-Quer entrar? Está meio frio hoje. Falei

-Não vou incomodar? Seus pais?

-Não, vai e é apenas minha mãe. Meu pai, bom ele já faleceu. Danilo ficou alguns segundos em silencio e então falou.

- Sinto muito pela sua perda. Disse ele.

- Obrigado. Eu lhe sorri.

Quando entramos vi minha mãe que estava deitada no sofá vendo alguma coisa na televisão, algo de comedia, pois ela ria de uma forma bem engraçada. E quando nos viu, levantou-se rapidamente e veio ao nosso encontro.

- Oi meninos, tudo bem? Disse ela beijando o rosto do Danilo.

- Mãe, esse é o Danilo.

- Oi, seja bem-vindo. Disse ela sorrindo.

-Obrigado. Disse ele sem jeito.

- Vocês querem jantar?

- Comemos pipoca no cinema. Falei

- Isso não enche Gabriel, vou fazer uma macarronada para nós. Gosta de macarrão, não é Danilo?

Danilo que até então não se manifestara, acenou respondendo sim com a cabeça. Rapidamente minha mãe marchou para a cozinha e começamos a ouvir sons de panelas.

-Não precisa ficar, se não puder. Falei.

-Não, está tudo bem. Não vai me mostrar seu quarto? Danilo perguntou forçando uma falsa malicia no olhar.

- Não tem nada demais. Falei enquanto abria a porta do meu quarto e acendia a luz. Estavam ali minha cama, as estrelas florescentes no teto, o espelho, o guarda-roupa, a TV com o videogame e claro roupas espalhadas no chão que me agachei para junta-las. Tudo ali parecia o mesmo, exceto eu que havia mudado muito em poucos meses. Pedi para Danilo se sentar na minha cama e joguei as roupas no cesto de roupa suja.

- Adorei sua mãe, sua casa e seu quarto. Aqui tem muita paz. Disse Danilo como se eu houvesse perguntado.

- Minha mãe sabe ser bem louca as vezes. Falei soltando um riso.

-Eu queria ter a sorte de ter uma mãe, tão de boas. Meus pais não aceitam o fato de eu ser gay. Eu penso em me mudar logo para minha própria casa. Estou naquele trabalho com mudança, mas meu sonho é prestar o vestibular e ser médico.

Não pude deixar de me sentir idiota, perto dele eu parecia nem ter problemas, não havia pressão para sair logo de casa, eu nem mesmo sabia o que iria estudar no ano seguinte. E ali estava um rapaz lindo e simpático que apesar dos pesares, tinha objetivos claros sobre o futuro. E eu que semanas atrás só pensava em viver um grande amor.

- Sabe Danilo, isso é fantástico eu apoio cem por cento e tenho certeza que tudo vai dar certo. Confesso que perto de você eu nem tenho problemas.

- Não! Não mesmo. Danilo me olhou fixamente sou semblante totalmente sério, me observou e continuou falando – Problema é problema, se tem alguém que pode julgar se um problema é maior que outro, essa pessoa seria Deus. E você tão jovem já perdeu seu pai e seu namorado foi levado embora. É tudo questão de ponto de vista. Eu Gabi, entendo que temos problemas e que acharemos um jeito de solucioná-los.

Não sei dizer se foram as palavras ou o olhar confiante de Danilo, eu me sentia melhor e sentia que tudo aquilo ia mudar e não sei dizer se foi o calor do momento ou necessidade mutua, mas nos beijamos, sim, o nosso primeiro beijo.

O beijo durou mais ou menos um minuto, seus lábios saudando os meus de forma delicada e ao mesmo tempo picante. E o momento só não foi maior porque minha mãe nos chamou para jantar. 

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