Capítulo 19

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John

Assim que adentrei a sala do trono, meu pai iniciou um longo discurso sobre a minha imensa irresponsabilidade por ter ido à Marina Azul e por ter trazido Scarlett comigo. Seus espiões fizeram um ótimo trabalho relatando meus passos. Escutei a tudo sem proferir uma única palavra. Aprendera a não me dirigir a ele enquanto estivesse em seu estado raivoso, já que o resultado nunca era favorável a mim.

Ele nem mesmo permitiu que minha mãe me abraçasse ou falasse comigo. Exigiu que eu falasse a verdade sobre Scarlett, insinuando que ela poderia estar carregando um filho meu. A cada frase que saía de sua boca, minha paciência diminuía mais.

Todavia, no momento em que Scarlett entra no salão, a expressão no rosto do rei vai do ódio à descrença. Ele parece estar vendo o impossível. Dessa vez, é a mim que uma raiva incontrolável invade assim que seus dedos tocam o rosto dela e preciso me conter para não afastá-los.

O interrogatório que segue não ajuda em nada a controlar meu humor. Assim que Scarlett é dispensada, começo a segui-la, mas, para meu azar, o rei possui outros planos em mente.

-Eu ainda não lhe dispensei, John. –Diz o rei.

-Preciso mostrar a Scarlett para onde deve ir. –Respondo simplesmente.

O impacto do encontro da mão do rei em meu rosto faz com que eu seja arremessado ao chão. Ouço o arquejo da minha mãe, mas para sua própria segurança, ela não pode interferir.

-Não ouse me dar as costas, garoto. Aparentemente, o tempo em que você permaneceu afastado da corte lhe fez esquecer as regras. Pois bem, irei refrescar sua memória. –Ele fala ao levantar meu corpo pela gola da camisa.

Meu pai me arrasta até uma pequena sala em seu escritório já bem conhecida por mim. Quando Malvino entra, prevejo o que acontecerá. O rei é covarde demais para bater em seu próprio filho, mas dispõe de capachos para fazer o serviço sujo. Após atar meus braços em uma corrente presa ao teto para que eu não revide, Malvino distribui socos pelo meu abdômen. Ele tem consciência das regras: nada de marcas que podem ficar aparentes.

O golpe dado pelo rei em meu rosto havia sido um descuido. Ele jamais deixava rastros de suas ações. Espancamentos se tornaram um hábito depois que completei doze anos. Todas as vezes em que ele julgava minhas ações não coerentes com suas ordens, encaminhava-me àquela sala. Isso sempre me levava a fazer todas as suas vontades sem questionar.

Passei a treinar e me exercitar o dobro de todos os outros soldados. Desejava ficar mais forte do que Malvino para poder retribuir seus favores. Foi aí que as correntes foram instaladas, já que havia quebrado o maxilar daquele capanga na primeira oportunidade.

Enquanto espero a dor chegar, sinto apenas o ódio e o ressentimento destinados ao meu pai aumentar. Meu corpo parece dormente depois de tantas surras recebidas. Ao se dar por satisfeito, o rei ordena que Malvino me solte.

-Será muito pior da próxima vez. É melhor você não me desafiar novamente. Acredite quando digo que os métodos utilizados pelo seu avô em mim eram muito piores e não esqueça que você deve zelar pelo bem-estar da sua mãe. –O rei fala próximo ao meu rosto. –Há serviço acumulado para você em seu escritório. Quero tudo pronto hoje mesmo. –Fala e se retira da sala.

Malvino o segue como um cachorro adestrado. Com dificuldade, caminho até meu escritório e desabo em um pequeno sofá. Uma criada entra com gelo e remédios para a dor antes de qualquer solicitação minha. Sei que é por ordens da rainha. Ela não podia interferir diretamente nas ações do rei, mas sempre encontrava uma forma de cuidar de mim.

Coroa De Fogo - Livro 1 - Trilogia MestiçosOnde histórias criam vida. Descubra agora