Estou em uma floresta. Um vestido branco roça em meus pés descalços e a grama molhada se mistura com barro entre meus dedos. Está um breu e não enxergo nada a um palmo de meu rosto. O vento balança meus cabelos e um arrepio percorre minha espinha. Grito por Conrado, mas o eco se forma e me dá mais medo ainda. Corro procurando algum lugar para ir, mas não faço ideia de onde ir exatamente.
Giro no meu lugar e avisto uma silhueta ao longe.
-Conrado! –Corro até ele e o abraço, mas quando abro os olhos estou abraçando a mim mesma.
-Conrado? Por favor, cadê você?
Sento ao pé de uma árvore e lá começo a chorar.
-Sh... Por que está chorando, meu amor?
-Conrado? Que lugar é este? Estou com muito medo, me abrace!
-Não, não, querida. Sou Vicente.
-Quem? –O afasto de mim.
-Emmily, tão esperta, mas tão ingênua...
-Quem diabos é você?
-Tudo no tempo certo, gata.
-Conrado! Conrado!
-Pode gritar o quanto quiser que ele não pode te ouvir aqui. Finalmente somos apenas eu e você. Esperei tanto por esse momento, mas agora nem sei o que fazer. Idiota, não? –Ele passa a mão por meus cabelos.
-Você nem faz ideia do quanto! –Digo entredentes.
-O-ho! Está afiadinha, não é? Pelo menos te afastei do inútil do Conrado e posso tê-la para mim, então não me importo com essa sua rebeldia.
-Você é estúpido! Me tire desse lugar agora, seu perseguidor nojento e psicopata!
-Estúpido, nojento, psicopata... Nunca me chamaram assim, sabia? Você é a primeira e talvez eu possa me acostumar com isso e até gostar...
Levanto e tento correr, mas Vicente me pega pelo pulso e me joga contra a árvore. Bato tão forte que me falta ar e preciso de alguns segundos para voltar a respirar normalmente.
-Ah, Emmily! Você poderia facilitar as coisas... - Diz ele chegando tão perto do meu rosto que posso sentir sua respiração, seu hálito. Ele se aproxima ainda mais, roçando seus lábios nos meus. Viro o rosto.
-É... Você não vai facilitar. Bem previsível da sua parte. - Diz dando um suspiro e cheirando meu pescoço. Sinto-me arrepiada da cabeça aos pés.
-Hm... Arrepiada?- Diz dando uma gargalhada, nada parecida com a de Conrado.
-NUNCA!
-Ah, vamos lá! Não minta para mim. Você ficou. Eu vi. Será que o imbecil do Conradinho vai se importar se eu lhe der um beijo?
-Não o chame assim! - Digo cuspindo as palavras.
-Ah, que lindo! Emmily protetora bem na minha frente. Isso me enoja!- Diz e cospe no chão. Volta o olhar
para mim lentamente e dá um sorriso assustador que me faz estremecer.
-Está com medo?
Não respondo.
-É o seguinte, Emmily. Eu não posso te deixar ir, entende? Te observei por tanto tempo, planejei tanto e esperei o momento certo para agir. Consegue compreender o trabalho que deu? Não acha que é tolice minha se eu simplesmente abrir mão de você nessa altura do campeonato?
-Me deixe ir, por favor... –Digo suplicando, com os olhos fechados de tanto medo.
Sinto a mão gelada dele passar por meu rosto lentamente e então o gosto de sua boca na minha. Tento me debater, me esquivar, mas a força que me prende àquela árvore parece sobre-humana. Minha única defesa é morder o lábio dele com o resto de esforço que me corpo suporta.
-Sua vagabunda! –Ele levanta o punho em minha direção e eu imediatamente coloco as mãos no rosto para me proteger.
Após esse impulso, ele abaixa o braço e visivelmente tenta controlar a sua raiva. Abro os olhos e mesmo com o breu consigo ver um fio de sangue escorrer pelo seu queixo.
-Esse não será nosso último encontro e espero que nos próximos você seja mais educada comigo, querida.
-Quem você está chamando de querida? –Digo e logo me arrependo por pensar em voz alta. Ele abruptamente me pressiona mais na árvore e pega um braço meu o colando no troco acima da minha cabeça e sinto uma ardência, muito provavelmente eu me arranhei.
-Eu vou voltar, querida. Mas não me espere porque chegar de surpresa é mais gostoso.
Cuspo na cara dele.
Isso é um sonho, não preciso ter medo de um sonho; meu consciente me permite pensar isso.
Ele grunhe de ódio e some.
***
Desperto ofegante, como se um peso estivesse em cima de mim o tempo todo, e estou em minha cama. Olho para o lado e Conrado não está. Meu coração bate acelerado e todo aquele pesadelo é repassado em minha cabeça como um flash.
-Foi tudo tão real...
Estou confusa e um sentimento apertado no peito. Olho meu pulso e está arranhado. Vendo isso, um monte de coisa passa na minha cabeça e o desespero me consome. Procuro o celular e nele o contato de Conrado. Após dois toques ele atende.
-Oi, Emmy. Está tudo bem?
-Conrado, eu... Que horas você vem aqui hoje?
-Calma, Emmily. O que aconteceu?
-Eu não sei, eu não sei! –Me levanto da cama e vou para o corredor. –Eu achei que tivesse sido um pesadelo, mas foi tão real. Estou com medo! Ele foi tão convincente de que iria voltar, eu não sei o que fazer.
-Emmy, respira. Ele quem?
-Vicente!
O telefone fica mudo.
-Conrado? Alô?
-Estou indo ai. –E desliga.
Sento no chão do corredor atenta a cada barulho, temendo a possibilidade de esse tal de Vicente aparecer novamente. Passa a mão no arranhão que tenho no pulso e começo a chorar de muito, muito medo.
Uns vinte minutos depois, que me pareceu uma eternidade, ouço a porta de entrada ser aberta. Por um leve instante me encolho, mas logo vejo Conrado subir as escadas. Imediatamente me levanto e me jogo nos braços dele, o abraçando forte.
-Calma, calma. Está tudo bem...
-Eu estou com tanto medo!
-Me conte o que aconteceu, por favor.
-Eu não sei direito, estou confusa. Eu estava dormindo e do nada comecei a ter um pesadelo, mas agora nem sei se é pesadelo mais! Foi muito real. Olha isso! -Mostro meu pulso.
-Isso é realmente estranho...
-E ele ainda me beijou!
-O que? Quem? –Diz com raiva.
-Vicente, já disse! Nunca vi esse homem na minha vida! Você o conhece? Ele ficava falando de você com muito ódio!
Ele fica um tempo sem dizer nada, analisando a situação.
-Não, não conheço.
-Tem certeza?
-Vem aqui. –Me abraça novamente. –Vai tudo ficar bem, eu prometo. Está muito cedo, vamos descansar.
-Você não precisa voltar?
-Não, está tudo bem.
Voltamos para o quarto e deitamos na cama. Ele me abraça por baixo da coberta e sinto seu dedo me fazer carinho na mão.
E então me acalmo e consigo fechar os olhos de novo e dormir sem medo.
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Entre o passado e o agora
RomanceEmmily Figueiredo leva uma vida perfeita ao lado de seu noivo Conrado Vasconcelos, após sofrer um trauma que a derrubou por um longo tempo. Em uma madrugada, misteriosamente, Emmily perde sua memória. Mesmo sem reconhecer o próprio noivo, Conrado...