Confusão

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Acordo pela manhã sentindo a mão de Conrado passar pelo meu rosto.

-Bom dia. –Digo.

-Bom dia, Emmy.

Não tenho vontade alguma de levantar da cama, mas minha barriga ronca denunciando minha fome.

-Melhor levantar e alimentar essa fera. –Ele brinca, se levantando.

-Primeiro vou ver como Alice está.

Vou até o quarto de hospedes e Alice está arrumando a cama.

-Bom dia. Tudo bem?

-Bom dia, Emmily. Estou bem sim. Obrigada, de novo.

-Não precisa agradecer. Fome?

-Estou, mas não vou tomar mais o tempo de vocês. Meu amigo me emprestou este celular enquanto não compro um novo e acabou de me ligar.

-Tem certeza que não quer comer antes de ir embora?

-Tenho sim. Ele me convidou para passar o final de semana em uma casa do interior com ele. Vamos esta tarde.

-O contato dele continua sendo aquele que você usou no outro dia? Qualquer coisa pode ligar para mim, sem problemas.

-Você tem sido um anjo para mim, não vou deixar me afastar de você. –Ela ri. –Pode deixar que eu te ligo, continua sendo o mesmo. Pode salvar o contato com o nome dele: Vitor.

Meu coração gela.

-Vitor?

-Uhum!

-Seu amigo Vitor trabalha?

-Sim, sim. Não sei se já foi lá, mas ele trabalha em uma floricultura pertinho daqui.

Sinto meu espírito sair do corpo e voltar. Alice vai viajar com Vitor. Aquele Vitor, que também é Vicente!

-Vocês se conhecem há um tempinho, não é?

-Sim. Lembra da história da faculdade etc? Então...

Engulo seco.

Quero impedi-la de ir, mas como fazer isso sem parecer uma louca dizendo: “Ei, Alice! Viaja com ele não porque ele é um psicopata que apareceu na minha mente uma vez e depois deu umas aparições bizarras dizendo que odeia Conrado e mais coisas sem sentido!”.

-E você confia nele?

-Claro! Você está bem, Emmily?

-Estou, estou sim.

-Me avise quando você chegar lá e tudo o mais, por favor.

-Claro, aviso sim.

A levo até a porta com meu consciente gritando para ela não ir.

 Mas ela vai.

-Vamos comer? –Conrado me abraça por trás.

-Vamos.

***

Conrado avisa para seu secretário, Joaquim, que vai chegar mais tarde na editora. Antes de ir trabalhar ele vai separar algumas coisas que normalmente eu fazia para eu testar se consigo mesmo fazer minha parte novamente, como prometido.

-Te espero no seu escritório, ok?

-Tudo bem.

Saio do banheiro e vou para o quarto. Ouço meu celular tocar. Com rapidez, e um pouco de desespero, vou checar. É o número de Vitor/Vicente.

-Alice?

-Não, meu anjo. É o Vicente, mesmo.

-O que você quer?

-Eu já pedi para você ser mais educada comigo!

-Vai se fuder!

-Oh ruiva invocada! Enfim, como sou um cavalheiro, vou manter minha pose contigo. Você poderia manter a sua também...

-O que você quer? –Repito de forma mais firme.

-Outro beijo. Você me dá?

-Vai para o inferno!

Desligo.

Mas ele me liga em seguida.

-Saí de lá para infernizar sua vida.

-Se você machucar Alice, eu...

-Você o que? Ah, Emmily, para com isso. Quem vê até pensa, né?

Fico em silêncio, quase esmagando o celular com as mãos de tanto nervosismo.

-Você vai acabar com o seu celular apertando desse jeito.

Levo um susto ao ouvir a voz dele atrás de mim que derrubo o aparelho no chão. Ele está no meu quarto.

-Como?...

-Você é burra demais para entender como estou aqui, como estou lá... Vamos parar de perder tempo. Meu beijo?

Abro a boca para gritar por Conrado, mas como o vento ele se aproxima e tampa minha boca.

-Shh! Não queremos Conradinho nos atrapalhando.

Mordo o dedo dele.

-Ai! Emilly, para a sua segurança, é melhor colaborar.

-Com o que?

Ele me observa e o silêncio paira no quarto. Posso jurar que neste instante eu enxergo outro Vicente à minha frente. Ele balança a cabeça, como que tirando pensamentos dela, e se senta na cama.

-Hum... Cama boa. Quer aproveitar?

-Nossa... –Me viro para sair.

-Ei! –Ele toca meu braço de forma gentil, o que me assusta muito mais.

Dou um tapa em seu rosto com toda a força que tenho.

-Porra, Emilly!

Agora suas mãos estão no rosto. Fico esperando ele revidar de alguma forma, mas ele não faz.

-Me fala o que você quer, inferno!

-Fale baixo, por favor.

-“Por favor”? Você só pode estar brincando comigo!

-Emmily...

-Você está me deixando louca, Vicente! Quem diabos é você? O que você é? Ótima hora pra você aparecer na minha vida, já está tudo uma merda de bagunça mesmo! O que você quer de mim?

-Fale baixo, Conrado pode ouvir!

-Conrado? Agora você está preocupado com ele? Você é uma piada! Eu só vou te perguntar mais uma vez: O que você quer de mim?

-Eu não quero nada, Emmily.

-Ah, certo... –Rio não podendo acreditar em tudo isso.

-E eu sempre estive preocupado com Conrado...

-Você tem uma maneira diferente de se preocupar com as coisas...

-Você não entende.

-Eu sou burra demais, não é? Olha aqui, eu não tenho medo de fantasminha, não. Mas pare de infernizar minha vida.

-Alice não está segura. Nem você nem Conrado. E acredito que agora nem eu esteja. –Sussurra para si.

-O que?

-Eu não queria... Eu... Estou cansado. –Ele fita o chão e posso sentir seu sentimento de derrota.

-Vicente!

Ele me olha com lágrimas nos olhos.

-Me desculpe, Emmy.

-O que está...

Antes que eu possa concluir minha fala, ele some.

Entre o passado e o agoraOnde histórias criam vida. Descubra agora