Capítulo 8

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Andei às voltas na cama o tempo todo, não conseguindo pregar olho. As palavras dele andavam a vaguear na minha consciência como se não houvesse mais nada do que espaço vazio... o que não deixava de ser a verdade. Sentia-me sozinha e, de facto, estava mesmo sozinha. Fui dura com ele, e sei disso. Mas também sei que tudo o que disse é a verdade e que, se é meu namorado, poderia ter pelo menos a decêndia de me contar tudo e não me esconder as coisas. Se não queria conflitos, devia tê-lo feito. Mas não o posso culpar. Tento pôr-me no lugar dele e percebo que ele tem aguentado imenso por minha causa. Não é qualquer um que aguenta ficar com uma pessoa que "acabou de acordar da morte e não se lembra de nada". Não é qualquer um que fica com essa pessoa incansavelmente e aguenta com um sorriso na cara, como se tivesse acabado de ganhar a lotaria.

Já eram umas quatro da manhã quando consegui adormecer, acordando duas horas a seguir. Olhava para um lado, olhava para o outro. Já sentia a falta dele e isso consumia-me. Agarrei no telemóvel e olhei para o visor. Nada. Nem uma única mensagem. Eu sei que exagerei, e muito, mas bolas. Ele disse-me que eu não percebia nada de amor, ele quer que eu perceba o quê? Eu já nem percebo o que se passa à minha volta quanto mais o que é o amor. Decidi ligar ao meu pai, visto que lá era de noite. Atendeu logo ao primeiro toque.

"- Estou? Mafalda? Passa-se alguma coisa?"

Tentei engolir em seco e não demonstrar a minha parte fraca e toda a vontade de chorar.

- Eu queria saber como está tudo por aí. Por aqui está tudo bem.

"- Mas estás a ligar-nos tão cedo porquê? São... - demorou a pensar - seis da manhã aí."

- Estou bem pai! Simplesmente não consegui dormir. Isto de não me lembrar de nada dá-me cabo da cabeça. - omiti - Mas está tudo bem?

"- Sim, está tudo linda. A tua mãe e eu já estamos a trabalhar e tudo. Os teus primos estão super preocupados contigo, principalmente os de Inglaterra, aqueles com quem passavas férias, lembraste deles?"

- Assim não...

"- Brad. Diz-te alguma coisa?"

Fechei os olhos e concentrei-me naquele nome. Quase como por magia, aparece-me a imagem de um rapaz a sorrir-me e a dar-me a mão. Abano a cabeça com força.

- Acho que sim, acho que me lembrei de alguma coisa!

"- Isso é ótimo filha! O Brad pediu-me o teu número de telemóvel, achas que lhe posso dar?"

- C-claro. Dá... Mas ele sabe que...

"- Sabe filha. Ele queria o teu número porque acho que vai fazer uma digressão com a banda dele pela Austrália e quer ver como tu estás e se te pode ir ver."

- Hm... Está bem pai. - senti o telemóvel vibrar contra a minha orelha - Olha vou ter de desligar, alguém está a ligar-me.

"- Está bem filha, beijinhos!"

Desliguei e vi de quem era a chamada. Liz.

Atendi.

- Estou?

"- Como estás minha linda? O Luke ontem chegou a casa super chateado e não deixa ninguém dormir com a música aos berros. Só adormeceu agora. Que aconteceu?"

Suspirei e contei-lhe tudo o que tinha acontecido, tal e qual. Ela também suspirou e respirou fundo.

"- Sabes minha querida, nem eu às vezes compreendo as coisas que acontecem com o meu filho. Eu não te posso contar algo que não sei, mas sei que ele e tu já estiveram muito chateados. Mas ele não é muito de me contar o que se passa, guarda mais para si. Nisso vocês são iguais. Mas não lhe mandes mensagens sequer, quem fez asneira foi ele e ele é que tem de ir atrás. E não te preocupes porque tenho a certeza que irá!"

- Obrigada pelas palavras Liz, fico imensamente agradecida.

"- Não tens de quê querida, eu vou ver o que posso fazer. Agora vou é dormir porque finalmente ele nos deu paz. Beijinhos e até logo." - e desligou.

Decidi que não iria ficar ali parada a deprimir. Agarrei no meu computador e decidi investigar históricos, conversas antigas no telemóvel, fotografias, etc. Ia quase sempre parar ao Luke e à Kelly, mas via várias pessoas à nossa volta e não percebia como me poderiam deixar todos sozinha. Será que eles não eram meus amigos?

Depois parei. Vi uma fotografia super carinhosa do rapaz que vi há pouco no meu pensamento. Ele estava com o braço à volta dos meus ombros e sorria-mos um para o outro com cumplicidade. É mesmo horrível não nos lembrarmos das pessoas, principalmente das que supostamente são importantes e chegadas.

Decidi ir dar uma volta. Pesquisei no computador alguns sítios pertos de casa e decidi ir a um jardim que ficava a uns bons quilómetros. Chamei um táxi e saí da zona de conforto que era a minha casa.

Pela terceira vez o meu telemóvel tocou nesse dia. Já eram horas de almoço e ele estava a fazer perfeita sintonia com o meu estômago. Vi um número desconhecido.

- Estou?

"- Estou? Maffs?! És mesmo tu?!" - a voz era doce e tremia, como se estivesse a conter o choro.

- Ahm... Sim. És o Brad? - algo me fez fazer logo aquela pergunta com algo na voz que dizia já saber a resposta. Não sabia se era por causa da conversa com o meu pai se era mesmo porque me lembrava da cara e da voz.

"- Tu... Tu lembras-te de mim?"

- Por incrível que pareça sim, és a única pessoa a que consigo associar o nome à cara.

"- Isso é brutal prima! Provavelmente é por eu ter sido quem fui para ti..." - percebi uma certa hesitação na sua voz.

Oi? Não estou a perceber.

- Isso já não sei.

A voz querida e amorosa desvaneceu-se, dando lugar a um timbre desiludido.

"- Pois... Já estava à espera. Prima, eu vou aí. Achas que poderíamos estar juntos e conversar?"

- Claro que sim, porque não? Se calhar até eras capaz de me ajudar a avivar a memória.

Riu-se.

"- Claro linda, tudo o que tu quiseres! Agora tenho de ir. Beijinhos, adoro-te."

- Beijinhos Brad...

Desliguei. A conversa tinha sido muito esquisita. Já não estava a perceber nada do raio da minha vida. Tudo estava a ficar descontrolado... Bem, na verdade, não tinha "provas" de que alguma vez tivesse sido fácil. Mas o que era de facto preciso, era perceber o significado de quem realmente era eu para perceber o que ainda não tinha percebido. Precisava de conhecer a minha vida, de me conhecer a mim e a quem me rodeava.

Decidi ir do jardim parao hospital, para marcar uma consulta com o médico. Engraçado que parecia ironiado destino, tinha uma vaga para dali a uma hora, o que me deu tempo de comer eir para o consultório.

Amnesia {portuguese}Onde histórias criam vida. Descubra agora