Ao entrar na casa, o cheiro do esparguete à bolonhesa pairava no ar. Entrámos para um pequeno hall, onde fotos de um rapaz de cabelo castanho comprido e olhos verdes sorria – o mesmo sorriso que encontrei em algumas das minhas fotografias na parede. Wesley era, sem dúvida, um rapaz bonito, com um sorriso tão quente que, mesmo na situação em que em me encontrava, sentia o coração aquecer só de olhar para ele. Ao atravessar o hall parei na entrada para a sala, onde encontrei uma fotografia que me deixou com um sorriso: ali estava eu, abraçada àquele rapaz que, pelos vistos, me considerava a sua alma gémea, com um daqueles sorrisos que são impossíveis de se forçar, e o que me fez gostar ainda mais da fotografia, foi o facto de que nenhum de nós se estava a aperceber que estava a ser fotografado, pois estávamos a olhar um para um outro de forma tão cúmplice que fiquei arrepiada.
Só percebi o tempo que fiquei a admirar aquela fotografia quando a sua mãe chegou perto de mim, já sem o bolo na mão e, ao reparar por que razão eu demorava o olhar, sorriu-me.
- Sempre gostei muito desta fotografia, e ele também. Ficou a olhar para ela da mesma forma que tu olhas agora, da primeira vez que a viu aí pendurada. Sempre achei curioso o facto de vocês serem tão iguais por dentro, como se tivessem sido feitos para estar na vida um do outro. Era uma conexão inexplicável, só quem a via é que realmente entendia, bastava olhar para vocês.
Sorri para a senhora que abria tão facilmente o coração a alguém que não se lembrava do seu próprio filho, sem saber o que lhe responder.
- Peço desculpa querida, começo logo com estes discursos e estrago logo o ambiente. Anda, vamos jantar. – e dirigiu-me gentilmente à sala, onde a mesa já estava posta e os dois pratos servidos.
Sentei-me e começámos por comer em silêncio, até que ela o quebrou.
- Bem, eu sei que para ti deve ser um pouco estranho eu estar a convidar-te para vires aqui, parecendo que te estou a forçar para que te lembres dele. Mas quero que percebas que não é nada disso.
- Não se preocupe com isso. – intervi. – Eu percebo que você também deve precisar um pouco de alguém que conhecesse o seu filho como eu o conhecia, e eu não sinto em altura nenhuma que me esteja a forçar a alguma coisa. Eu também queria cá vir, queria sentir a conexão de que tanto falam que eu tinha com o seu filho, acho que lhe devo isso a ele, a si e a mim. – sorri-lhe. – Eu quero mesmo lembrar-me dele.
- Eu sei querida, e quero-te agradecer do fundo do coração por te mostrares tão prestável e esqueceres dos teus problemas para vires lidares com os meus, mas sim, é verdade, eu acho que fiz o convite de forma um pouco egoísta, na medida em que queria sentir a presença dele, e sei que ao te ter presente, eu sinto a presença dele. É como se ele estivesse aí contigo e não te abandonasse nunca. O Wes seria capaz disso, se é verdade o que dizem quanto às almas de quem partiu protegerem quem amam.
- Não se preocupe com isso, de todo. Eu preciso mesmo de me sentir perto dele. Acho que, de toda a gente que eu esqueci, é dele que sinto a maior vontade de me relembrar. – finalmente admiti em voz alta, sentindo a voz embargada. – Porque todos os outros se encontram aqui para formar novas memórias, que podem preencher a falta das antigas, mas ele não. E eu quero lembrar-me dele se ele era tão importante para mim assim.
A senhora, a qual eu nem sequer sabia o seu sobrenome, ficou estática por uns momentos, fixando o seu olhar no seu prato, que estava quase vazio. Estava imersa nos seus pensamentos e eu assim a deixei ficar, até que se recompôs, limpando as lágrimas com um guardanapo.
- Querida, eu não quero estragar a noite com lágrimas. Este jantar servia, para mim, para que te sintas perto do nosso querido Wesley como te sentias antes, assim como para saberes que estou aqui para ti se precisares. Assim como me deste o sinal de que também posso contar contigo.
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Amnesia {portuguese}
FanficUm acidente trágico muda a vida a Ana Mafalda e às pessoas que a rodeiam. Ela é obrigada a viver com a sensação de que está rodeada de pessoas estranhas que nunca viu na vida, que dizem ser família. Tudo parece desmoronar-se, as pessoas começam a ca...