"Em um piscar de olhos"

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Um mês depois, a nossa vida juntos não podia estar melhor, apesar das dificuldades que estávamos enfrentando. Teríamos que economizar dinheiro até a temporada para então as coisas começarem a melhorar. Aos poucos íamos consertando alguma coisinha na casa, o Ucker também havia cortado o mato e até que agora a pousada parecia mais ajeitadinha. Nesse meio tempo eu também fui até o postinho de saúde e fiz meu pré-natal. O bebê estava bem, sem nenhuma complicação e eu agradeci muito por isso, já que passei por fortes emoções. Com quase treze semanas, eu ainda sentia alguns enjoos de vez em quando, mas agora a nova fase era uma vontade de comer algumas coisas e também podia-se notar como a minha barriguinha de grávida cresceu.

Christopher e eu casamos em uma capela pequena que o bairro possuía, foi uma cerimônia pequena, mas totalmente cheia de emoção. Nada muito pomposo, nem com muita gente, nós dois queríamos apenas o que valia a pena: nossa felicidade. Infelizmente a Annie e o Poncho não conseguiram vir para cá na data do nosso casamento, porém o que importava era a vibração positiva dela e, além do mais, se não fosse por eles nós dois não estaríamos aqui. A loira prometeu que viria outro dia e eu esperava ansiosa pela visita dela pois queria convidá-la para ser madrinha do bebê. E também não quis comunicar os meus pais, não fazia sentido para mim que eles participassem desse momento, aliás eu não tinha mais contato com eles, nem com a minha mãe. Eu ainda estava muito magoada por tudo o que aconteceu.

Meu segundo trimestre da gravidez veio com um susto, comecei a ter alguns sangramentos e cólicas, entrei em desespero achando que o bebê já queria nascer. Porém houve um susto maior ainda quando na consulta descobri que estava com a placenta prévia. Pelo o que pude entender na hora de desespero, a placenta estava baixa cobrindo a abertura do colo do útero, a médica me tranquilizou dizendo que como estava no começo da gravidez até o parto a placenta poderia voltar para o seu lugar, mas eu precisaria ficar de repouso total. O Christopher se mostrou, nesse tempo, um ótimo marido e pai, ele cuidou de mim e da casa sem reclamar. Eu passei o resto dos meses na cama sem fazer esforço e ele me contava sobre os detalhes dos reparos que fazia a cada dia. O Manchinha havia virado meu protetor e guarda costas, não saía de perto de mim e quando tinha algum barulho lá fora ele latia e verificava o que era e em seguida voltava para o meu lado. Ele já não era mais um filhotinho, Billy havia crescido e em poucos meses ele se tornaria um cachorro de porte médio. Eu e a Annie nos falávamos quase todos os dias, ela tinha começado o curso e estava amando. O único problema dela era o marido, ela havia me contado que ultimamente eles andavam brigando, nada muito sério, apenas aquelas brigas típicas de casal. A loira falou que geralmente era por causa de coisas fora do lugar, como por exemplo, um queria colocar o azeite no armário e o outro na geladeira. Eu e ela discutimos sobre o assunto por um tempo, eu tentei explicar para aquela teimosa que cada um possuía um costume e que eles teriam que achar uma solução. Às vezes a saudade era muito grande, falar só pelo telefone não era suficiente, nós queríamos poder conversar pessoalmente. No dia em que a convidei para ser madrinha teve que ser pelo celular mesmo, já que eles não puderam vir para cá. Seria bem melhor se fosse pessoalmente, para poder abraçá-la bem forte. Por isso, ela me prometeu que nas próximas férias viria nos visitar.

Nesse meio tempo nós fizemos o exame para saber qual era o sexo do bebê e foi com grande surpresa que descobrimos que seria uma menina, já que eu e o Christopher apostamos que viria um menino. Nós ficamos muito felizes, e apesar da nossa apreensão com a gestação, eu tinha certeza que essa menininha teria muita sorte por ter o Ucker como pai.

Quando dezembro chegou o Christopher ficou ainda mais atarefado, nós recebemos nossos primeiros hóspedes após termos divulgado a pousada em uma rede social, e o pessoal começou a marcar reserva. Eu morri de pena dele, o Ucker estava sozinho dando conta de tudo. Eu queria poder ajudá-lo, nem que fosse para servir a mesa do café da manhã, mas eu ainda tinha que continuar de repouso e não fui capaz de cooperar com nada. A médica havia me tranquilizado de que tudo estava ocorrendo bem, mas eu só me acalmaria quando minha filha nascesse. Aliás poder sentir a cada dia o crescimento dela era maravilhoso, um amor que já fazia parte de mim. Eu só conseguia pensar no momento em que ela estaria aqui com a gente e, apesar do medo de não dar conta em criá-la direito, eu ansiava por sua chegada.

A pequena Laura nasceu linda, forte e cheia de saúde em janeiro. Foi o momento mais mágico que eu vivi, apesar de todas as preocupações e dores, eu nunca iria esquecer o instante em que ela veio para os meus braços. Eu não poderia estar mais feliz e realizada. O tempo parecia voar em um piscar de olhos, com sete meses a Laurinha já começava a engatinhar e aquela preocupação toda se transformou em precauções. A pequena fazia muito sucesso com os hóspedes, era cheia de simpatia para recebê-los, sempre com um sorriso no rosto. Christopher se tornou um pai muito babão e protetor, às vezes eu me pegava observando a interação dos dois e eu tinha plena convicção de que ele seria um pai maravilhoso. Poder acompanhar cada fase dela e presenciar a sua felicidade era o que me motivava todos os dias. Só aumentava a certeza de que eu fiz a decisão certa.

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― Hey Dul, o jantar vai ser servido que horas? ― o Ucker perguntou para mim quando entrou na cozinha.

― Em alguns minutos.

Como era baixa temporada e tinha poucos hóspedes, eu e o Ucker pensamos em oferecer jantar e café da manhã para atrair clientes. O jantar às vezes era sopa, macarrão de talharim ao molho bolonhesa e fondue de queijo com pão italiano, tudo comprado no restaurante da cidade. Eu preparava a mesa dos hóspedes que ficava no centro da cozinha ampla, com mesas e cadeiras rústicas e já com a decoração arrumada, o jantar era servido às oito da noite.

― Ótimo ―, ele beijou os meus lábios em uma carícia rápida. ― mais uma boa notícia. Já temos mais duas reservas para a alta temporada.

― Maravilha. ― Eu sorri contente e depois olhei para a pequena que estava no colo dele, com a sua cabeça encostada no ombro do pai. ― Alguém está morrendo de sono? ― Passei minhas mãos pelo rosto da Laurinha e ela fechou os olhos. ― Assim que eu terminar aqui eu levo ela para a cama, amor.

Ele balançou a cabeça concordando e eu encarei a pequena com alegria. Laurinha era uma cópia de nós dois, o nariz arrebitadinho era igual ao meu, já os cabelos castanhos claros cacheados ela puxou do pai. A cor dos olhos no tom âmbar era uma mistura entre nós dois, o castanho avermelhado de mim e a coloração do dourado acobreado do Christopher. Em seguida, suspirei extasiada e me aproximei dela beijando sua cabeça, logo após meu momento de carinho com a minha filha, o Ucker retornou para o seu posto, a recepção.

Quando terminei de colocar o jantar na mesa segui em direção à sala, onde havia um sofá, uma mesa de centro, o painel da televisão e uma bancada mais ao fundo que usávamos para a recepção. Avisei o Christopher que o jantar estava servido e enquanto ele foi comunicar os hóspedes, eu peguei a nossa pequena no colo e a balancei em um movimento lento.

Enquanto eu a embalava pela sala para fazê-la dormir, meus olhos analisaram o ambiente. As paredes foram pintadas no tom de amarelo claro, as janelas, portas e o outros móveis eram de madeira escura. Na parte de fora, nós ainda não tínhamos conseguido fazer o deck, mas as redes tinham sido colocadas em alguns pontos estratégicos do quintal. A Annie havia me dado algumas dicas para decoração e aquela casa que precisava de reparos agora já tinha se transformado em um belo lugar para descanso e relaxamento. Continuei reparando na sala, minha cabeça ficava pensando em algumas ideias de melhorar o ambiente até que meus olhos pousaram na prateleira de madeira que ficava acima da televisão. Admirei um pouco emocionada os porta-retratos, havia um com uma foto minha e do Ucker no nosso casamento, outro registro de quando a Laura nasceu, outro com a família inteira e o último que tinha mexido mais comigo que foi no dia do casamento da Annie, eu, o Christopher, ela e o Poncho. Recordei comovida daquele dia e imediatamente bateu uma saudade da Annie.

― Pronto, daqui a pouco o pessoal desce para o jantar ― Christopher disse ao descer as escadas me tirando das minhas recordações. ― Vai querer jantar agora? ― ele perguntou quando chegou perto de mim.

― Sim, só vou levar a Laura para o quarto. Ela acabou de adormecer.

― Ok, então eu vou te esperar para jantar.

Eu fiz um sinal de positivo com a cabeça e caminhei na direção do corredor. Os hóspedes ficavam na parte de cima e nós na de baixo, por isso segui até o final do corredor e entrei no quarto. Coloquei a pequena em sua cama montessoriana, uma cama infantil que não tinha pés para que a criança possa ter autonomia além de ser mais segura por ficar perto do chão, junto com uma proteção lateral. Às vezes ela dormia aqui, quando tirava algum cochilo, mas à noite ainda ficava no nosso quarto. Ao passar pela porta do quarto em silêncio, notei que o Manchinha tinha vindo atrás de mim e agora tinha se instalado do lado da cama dela. Observei a cena com carinho, ele sempre fazia isso e eu sempre me impressionava com o quanto ele protegia sua parceirinha de bagunça. No momento seguinte, eu levei um pequeno susto quando senti o meu celular tocar, peguei o aparelho no bolso da minha calça e saí do quarto apressada para não acordar a pequena.

― Oi Annie, eu estava pensando em você agorinha ― falei após olhar o nome dela no visor.

― Oi Dul... ― Ela suspirou e não prosseguiu com a conversa, notei que algo estava errado.

― O que houve?

― Você precisa voltar, a sua mãe não está nada bem.

E dessa vez quem ficou sem palavras para continuar com o papo fui eu.

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É gente, parece que a Dul terá que voltar para "casa". 

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