Entre Deuses e Monstros

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   O pastor arrepiou-se só de pensar na possibilidade de encontrar-se novamente com Teseu; mas, no momento, a melhor coisa a fazer era continuar distraindo o príncipe de Atenas.

- Bem, acho que, com a ajuda de Dédalo, sair do emaranhado não será problema. Porém, não se iluda pensando que matar o Minotauro será tão fácil quanto matar Procuste.

- Nada é impossível para um herói! Sei exatamente o que me espera, pois o monstro tem a proteção do Senhor dos Mares. Ele é filho da mulher de Minos com o touro branco que Posídon deu de presente ao rei. O Minotauro tem, pois, uma origem muito especial, o que lhe dá uma força fantástica. Dizem que o deus das águas tem-lhe muito carinho.

Uma curiosidade macabra tomou conta de Hípias.

- O Minotauro engole as suas vítimas ainda vivas?

- Não! Primeiro, ele as trespassa várias vezes com os chifres, quebrando ossos e rasgando a carne. Ouvi contar que um cheiro pestilento de sangue e de vísceras paira sobre o Labirinto e que, dependendo do vento, se espalha por toda a ilha, entrando pelas janelas das casas e avivando o terror da população.

Teseu calou-se, alheado do mundo e mergulhado sabe-se lá em que profundos pensamentos. A introspecção do herói arrepiou o pastor, que ficou a imaginar o tipo de ideias que estariam brotando naquele cérebro. Lembrou-se de Héracles dos Olhos Vidrados e da matança da qual fora responsável. Não fosse o ateniense ter um ataque igual e aniquilá-lo ali naquele lugar tão lindo. Para afastá-lo de pensamentos sombrios até chegarem à colina onde se iam separar, o pastor fez-lhe a primeira pergunta que lhe ocorreu:

- Onde fica Lerna, impulsivo herói?

- Nos pântanos da Argólia. É um lugar desolado onde só cresce uma vegetação raquítica. A Hidra era o seu único monstro, mas valia por mil; uma serpente gigantesca com nove cabeças que cuspiam veneno, sendo que uma delas era imortal. Gostaria de saber como Héracles conseguiu acabar com essa imortalidade. Deve ter sido um grande combate, pois, assim que uma cabeça era cortada, nascia, em seu lugar, uma segunda e uma terceira, numa sucessão sem fim. Muitos guerreiros fizeram tudo para exterminar o pavor, mas seus esforços sempre foram em vão: a Hidra os devorou inteiros. Como será que ele fez? É uma pena ele ter chegado primeiro: eu já tinha um plano preparado. Será que nós dois tivemos a mesma ideia? Na Hélade, ninguém nos excede em bravura e não há limite para a nossa coragem. Quem sabe o colosso não se junta a mim para assistir ao extermínio do Minotauro?